Lucas Pereira Leite, 16 anos, se locomove apenas em cadeira de rodas e não articula nenhuma palavra. É dependente de sua mãe, Isabel, e recebe atendimento exclusivo numa escola pública de Teresópolis (RJ). O rapaz sofre de paralisia cerebral desde que nasceu e cumpre uma rotina desgastante, com exames, sessões de fisioterapia e consultas médicas. Sua única distração é o futebol. Acompanha os campeonatos da França, Portugal e Espanha, entre outros, e também assiste pela TV ao Campeonato Brasileiro. A vida de Lucas, no entanto, se transforma quando a Seleção Brasileira vem para a cidade serrana do Rio.
"Ele vê pela TV as imagens da Granja Comary (local do centro de treinamento da CBF) e faz associações. Fica agitado, não dorme direito e me pede toda hora para que o leve ao encontro dos jogadores", conta Isabel.
A mãe atende ao pedido com boa vontade e tem vários motivos para isso. O primeiro, e mais importante, está relacionado ao progresso apresentado por Lucas nos últimos dois anos. Desde que passou a acompanhar os treinos da Seleção em Teresópolis, em 2014, e a ficar mais íntimo de alguns jogadores, o adolescente desenvolveu um método de aprendizado surpreendente.
Agora, por exemplo, ele sabe discar os números do telefone de sua avó, Maria Helena. Precisa apenas de um estímulo da mãe, o que não lhe falta em nenhum momento. "Eu falo assim: 'Daniel Alves', e ele tecla o número 2; 'David Luiz', e ele busca o número 4; 'Hulk', e o Lucas digita o número 7. Assim, ele completa a ligação", conta Isabel, emocionada.
Não é só pela identificação do número da camisa dos jogadores que Lucas consegue se comunicar com a mãe. Muitas vezes, faz gestos especificos, que remetem a seus ídolos, para passar alguma mensagem. Quando quer falar de Neymar, por exemplo, ergue os dedos atrofiados e mexe nos cabelos. É uma alusão ao corte moicano, marca registrada do atacante do Barcelona. Se pretende ver alguma foto ou vídeo com gols de Hulk, mostra o muque dos braços.
"A seleção brasileira é a vida dele. Melhora o humor, a disposição, tudo. Por isso, a minha agonia de sempre levá-lo à Granja Comary, em dias de treino, para tentarmos entrar."
Várias vezes o esforço da mãe é em vão - nem sempre o acesso ao público é liberado nas atividades da Seleção. Como há poucos táxis adaptados em Teresópolis, Isabel recorre com frequência aos ônibus e depois percorre a pé quase um quilômetro até chegar aos portões da Granja Comary. Da cadeira, Lucas aponta para as ruas e curvas que encurtam o caminho. Há dias em que os dois esperam horas para saber se vão poder se aproximar dos atletas. Essa demora é mais angustiante quando chove e faz frio na serra.
Para dar suporte ao filho, Isabel não recebe ajuda do pai do adolescente, que os abandonou quando Lucas tinha 1 ano. Ela trabalha de casa, com a venda por encomenda de bolos decorados, e fica atenta ao noticiário para saber a agenda da Seleção em Teresópolis. Neste mês de julho, conseguiu duas vezes acesso à parte final dos treinos. Valeu a pena. Lucas enriqueceu sua coleção de fotos com seus ídolos. Fez até selfie com Neymar.
Todas essas imagens estão devidamente estampadas em dois murais no quarto de Lucas, torcedor do Fluminense por causa da afinidade com o atacante Fred, hoje no Atlético-MG. Ali, ele guarda relíquias, como uma camisa que lhe foi dada por David Luiz, autografada por vários jogadores.
"Diariamente, ao acordar, o Lucas olha para as fotos e dá um 'bom dia' para os jogadores. Na hora de dormir, faz o mesmo e balbucia algo como quem diz 'boa noite'. Eu acompanho tudo com o coração partido."