Depois de terminar o Campeonato Carioca com o título incontestável e uma defesa praticamente imbatível, o Flamengo agora se vê pressionado diante de um choque de realidade. Enquanto o sistema defensivo já foi vazado sete vezes depois do Estadual, o ataque passou em branco pelo segundo jogo consecutivo no Brasileirão, sem conseguir acertar uma finalização sequer no gol do Botafogo.
A derrota por 2 a 0 no clássico deste domingo expõe a dificuldade da equipe de Tite de se impor sobre adversários de maior nível técnico. O Flamengo até consegue ter bons momentos, como os primeiros 25 minutos contra o Botafogo, mas tem sofrido com a irregularidade durante os jogos e a falta de capricho nas finalizações.
No Maracanã, o time rubro-negro finalizou 15 vezes, e a única em que exigiu algum esforço do goleiro John foi um chute desajeitado e travado de Pedro. Depois de sair em desvantagem ao marcar mal uma jogada ensaiada de escanteio dos botafoguenses, bem concluída por Luiz Henrique, a defesa permitiu inúmeros espaços para os contra-ataques do rival, que selou a vitória com Savarino.
Individualmente, a má fase do craque do time também atrapalha. Arrascaeta chegou a oitavo jogo sem participações em gols. Mesmo poupado da viagem para La Paz, no meio da semana, o uruguaio apresentou um desempenho de baixíssima intensidade, pouco presente nas ações ofensivas.
Esperava-se que, com a contratação do amigo e companheiro de seleção, Nico De La Cruz, o camisa 14 subisse de produção não apenas pelo entrosamento, mas também por ter com quem dividir o protagonismo da criação de jogadas. Porém, até aqui, os uruguaios raramente conseguem se conectar próximo da área dos adversários.
Contra o Botafogo, De La Cruz muitas vezes recuava para ajudar na saída de bola, e Arrascaeta acabava sendo presa fácil entre os dois volantes alvinegros. Em que pese a sequência ruim do craque uruguaio, Tite precisa resolver problemas maiores no Flamengo, inclusive na tentativa de retomar o melhor nível de Arrasca.
Um deles é a articulação entre os meias, o grande trunfo rubro-negro em sua base vencedora dos últimos anos. Quando tinha não só Arrascaeta, mas também Everton Ribeiro e Gerson no meio-campo, o Flamengo sempre viu seu jogo fluir melhor pelo centro, abdicando de dois pontas clássicos pelos lados.
Tite passou a priorizar a formação do 4-3-3, com Luiz Araújo e Bruno Henrique (ou Everton Cebolinha) abertos e Pedro como centroavante. Embora potencialize a velocidade e a recomposição dos pontas, que ajudam a defender pelas laterais sem a bola, o esquema fez minguar as infiltrações e triangulações por dentro – não raro, tornando o ataque refém de cruzamentos.
O treinador também precisa corrigir o preciosismo dos atacantes, que seguem desperdiçando muitas oportunidades, e a inconsistência defensiva de um time, que, apesar da pretensão de ser equilibrado, sofre com frequência mais de 10 finalizações por partida.
Arrascaeta, que assim como Pulgar deixou o campo por problema físico, não é uma peça desconectada do tabuleiro. O desempenho aquém de sua capacidade reflete uma equipe que ainda carece de variações para melhorar o jogo associativo, principalmente pelo meio. E que, mesmo poupando jogadores, continua acumulando baixas no departamento médico e reavivando fantasmas de verões passados.