Em 2017, a essa altura da temporada, o Fortaleza celebrava o retorno à Série B, após passar oito anos na terceira divisão nacional. Desde então, a ascensão do time tricolor não parou mais, empilhando feitos históricos como o deste sábado. Apesar da derrota nos pênaltis para a LDU, que contou com a estrela do goleiro Domínguez para conquistar a Copa Sul-Americana, o clube cearense disputou a primeira final continental.
Todo o processo de reestruturação do Leão do Pici, passando da Série C ao inédito vice-campeonato de um torneio internacional, serve de exemplo para os endividados e mal vendidos clubes do futebol brasileiro. Recentemente, com o advento das SAFs, equipes tradicionais como Botafogo, Cruzeiro e Vasco aderiram ao modelo de clube-empresa em ato de desespero diante do acúmulo de dívidas e fracassos em campo.
Independentemente dos rumos traçados pelos novos donos, a venda de cada um desses clubes associativos saiu praticamente em troca da dívida e promessas de investimentos. Três equipes gigantes negociadas “na baixa”, a preço muito aquém do realmente valem.
Já o Fortaleza remou na direção contrária. Sob a gestão do presidente Marcelo Paz, o Leão seguiu à risca um projeto esportivo de longo prazo. Ao longo de seis anos, a dívida foi drasticamente reduzida – no patamar atual (cerca de 30 milhões de reais), dois meses de faturamento são suficientes para abatê-la. A receita foi multiplicada em mais de 10 vezes, com previsão na casa de 300 milhões de reais para este ano.
Fora o trabalho de austeridade na área financeira, o Fortaleza também se reestruturou no departamento de futebol, incluindo a modernização do centro de treinamentos, assertividade no mapeamento e contratação de jogadores e, o principal, manutenção do comando técnico.
A gestão de Marcelo Paz teve apenas cinco treinadores, entre eles os longevos Rogério Ceni e o argentino Juan Pablo Vojvoda, que, após provar que o clube pode ser protagonista na América do Sul, se consolida como o maior da história tricolor sem margem para dúvida. Além do vice da Sul-Americana, foi ele quem conduziu a equipe às conquistas da Copa do Nordeste e do tricampeonato cearense, a uma inédita semifinal de Copa do Brasil e às oitavas da Libertadores na primeira participação.
Vivendo seu momento mais próspero dentro e fora dos gramados, o clube aprovou a transformação em SAF no fim de setembro. Porém, em caminho oposto ao de Botafogo, Cruzeiro e Vasco, a intenção do Fortaleza não é se vender para um acionista majoritário, pelo contrário. A proposta aprovada pelo Conselho prevê que a associação continue totalmente soberana.
O que muda é o modelo de gestão, que agora abre inúmeras possibilidades para alavancar o crescimento das receitas. Uma delas, admitida por Marcelo Paz, é o IPO. Assim, o Fortaleza pode se tornar o primeiro clube brasileiro a abrir capital na Bolsa de Valores e oferecer a seus torcedores a oportunidade de virarem sócios minoritários comprando uma fatia das ações. Como clube-empresa, a equipe ainda tem acesso a empréstimos e linhas de crédito mais atraentes que times associativos convencionais.
No fim das contas, o movimento do Fortaleza segue um princípio básico de mercado: vender “na baixa” geralmente significa prejuízo. Em evidência depois de alcançar uma final de Sul-Americana, o clube começará 2024 como o primeiro do Nordeste a disputar seis edições consecutivas da Série A do Campeonato Brasileiro e com perspectivas ainda mais animadoras para o futuro.
Por tudo isso, o Fortaleza não é só um case de sucesso. Equiparado no cenário sul-americano ao do Independiente Del Valle, último campeão da Sula, trata-se do melhor e mais eficiente projeto esportivo do futebol brasileiro. Ou, no mínimo, o que fez mais com menos nos últimos anos.
Um clube tradicional que, embora não tenha saído campeão do Uruguai, entrou para o rol dos grandes times da atualidade no continente. E, impulsionado por boa gestão e dinheiro novo, a tendência é que tenha vida longa nesta prateleira.