De um lado, uma equipe absolutamente dominante, campeã de quatro competições na temporada, que colocou mais um título na galeria ao varrer um rival nas semifinais e despachar outro, de virada, na grande decisão, com direito a casa cheia em seu estádio.
Do outro, um clube comandado por homens que transformaram uma eleição em escolha do “menos pior”, decidida por cerca de 4.000 conselheiros que estão longe de representar uma torcida com mais de 30 milhões de adeptos, frustrada pelo time sob risco de rebaixamento que foi humilhado em seus domínios.
Nenhuma fotografia poderia ser tão precisa como este fim de semana ao registrar o contraste entre o orgulho e a vergonha do Corinthians. Na sexta-feira, a equipe masculina sofreu a maior goleada da história da Neo Química Arena ao perder de 5 a 1 para o Bahia. No sábado, o pleito que elegeu Augusto Melo como novo presidente do clube, marcado por uma votação que não contempla sócios-torcedores, restrita à minoria de conselheiros que não representam nem 5% dos corintianos contribuintes do futebol.
Ainda assim, boa parte da Fiel torcida celebra a queda da chapa Renovação e Transparência, que comandou o clube nos últimos 16 anos. Presidente em exercício até o fim do ano, Duilio Monteiro Alves foi o único mandatário do grupo que não conquistou títulos com o futebol masculino. Também será lembrado como o dirigente que bancou a chegada de Cuca, treinador condenado por violência sexual contra uma garota de 13 anos, na Suíça.
Graças à mobilização de torcedores e, sobretudo, do time feminino, que se opôs à contratação em protesto coletivo, o técnico durou apenas dois jogos no Corinthians. Graças às Brabas, a gestão Duilio não amargou o fracasso esportivo total. Somente nesta temporada, elas ganharam a Supercopa do Brasil, Campeonato Brasileiro, Libertadores e, neste domingo, o Paulista, consolidando-se como o projeto mais vitorioso do país na modalidade.
Enquanto o lado masculino, seja representado pela equipe de Mano Menezes ou pelos dirigentes que se engalfinham pelo poder, não se cansa de passar vergonha, o time feminino continua sendo o maior motivo de orgulho do clube. No Paulistão, as Brabas superaram o Palmeiras na semifinal com impressionantes 9 a 0 no placar agregado, mesmo rival que haviam derrotado na final da Libertadores.
Na decisão estadual, novamente um rival pelo caminho, dessa vez o São Paulo. Apesar da derrota no primeiro jogo, no Morumbi, e a perda de uma invencibilidade de 25 partidas, o Corinthians goleou por 4 a 1 na volta, diante de sua torcida, e fechou mais uma campanha de título com 100% de aproveitamento em casa.
O trabalho de excelência no departamento feminino não pode ser interrompido. Se quiser passar uma mensagem de otimismo ao torcedor corintiano, ainda desconfiado sobre a capacidade de gestão do novo presidente, Augusto Melo deveria deixar diferenças políticas de lado e anunciar a permanência de Cris Gambaré, diretora de futebol feminino que, às vésperas da eleição, repudiou publicamente um áudio misógino do então candidato de oposição direcionado a uma funcionária do clube.
Por causa da luta de Cris por recursos e valorização do futebol feminino, o Corinthians alcançou a hegemonia da modalidade no país, se tornando referência em toda a América do Sul. Mantê-la seria fundamental para a estabilidade do projeto, ainda mais após a saída do técnico Arthur Elias, que hoje comanda a seleção brasileira. É o que se espera de um presidente que, ao contrário do que o fatídico áudio sugere, diz respeitar as minas.
Se as Brabas salvaram o ano do clube, nada mais justo que preservar os pilares do único time que tem feito o torcedor corintiano se sentir orgulhoso nas últimas temporadas.