O mandado de prisão contra Gusttavo Lima, expedido pela Justiça de Pernambuco nesta segunda-feira, não pegou de surpresa apenas fãs e admiradores do cantor sertanejo. Em outra ponta, a notícia tem sacudido bastidores do futebol, aflitos nas últimas horas com os possíveis desdobramentos do caso.
Lima é apontado pela Operação Integration, que investiga supostos crimes financeiros e lavagem de dinheiro por meio de empresas de jogos de azar, como um dos sócios da Vai de Bet. De acordo com a ordem judicial, o pedido de prisão preventiva foi motivado pela suspeita de que o cantor teria acobertado a fuga de José André da Rocha Neto, dono da casa de apostas e até então foragido da Justiça, durante uma viagem para a Grécia.
No início do ano, a Vai de Bet ficou conhecida ao anunciar contrato de patrocínio máster com o Corinthians, que acabou rompido unilateralmente pela empresa após suspeita de desvios de comissão por intermediários do clube. Embora não esteja mais vinculada à marca, a equipe paulista se coloca em estado de alerta.
Ao fechar a contratação do holandês Memphis Depay, a diretoria corintiana consultou pessoas ligadas a sua nova patrocinadora, a Esportes da Sorte, também investigada na operação, para ter garantias se poderia seguir com o negócio, já que boa parte do montante que será desembolsado pelo reforço está atrelada à verba de patrocínio.
Representantes da empresa asseguraram ao Corinthians que o acordo será cumprido e que não há motivos para preocupação, pois, segundo eles, a Esportes da Sorte já havia prestado os devidos esclarecimentos às autoridades. Internamente, a cúpula do clube entendia que a investigação teria poucas chances de prosperar.
No entanto, esse entendimento mudou nos últimos dias, principalmente após a prisão de Gusttavo Lima ser decretada. Embora Darwin Henrique da Silva Filho, proprietário da Esportes da Sorte, tenha sido um dos investigados beneficiados com habeas corpus nesta segunda, a operação das autoridades pernambucanas avança contra a empresa. Uma apreensão em banca de jogo do bicho comandada pelo pai de Darwin, inclusive, foi o gatilho para a abertura do inquérito.
Em 2022, a Polícia Civil de Pernambuco apreendeu um saco com 180.000 reais em espécie na banca juntamente com uma caderneta de anotações, que indicaria as ramificações do esquema de lavagem de dinheiro. Com o avanço das investigações, agentes policiais encontraram os primeiros indícios do suposto envolvimento de Gusttavo Lima, que teria utilizado uma de suas empresas para receber mais de 8 milhões de reais da Esportes da Sorte.
Ainda em 2022, de acordo com o inquérito, o cantor firmou contrato como embaixador da Vai de Bet. Apesar de não ser investigado na operação, o Cruzeiro tenta se blindar de respingos do caso, já que, no começo deste ano, Gusttavo Lima intermediou conversas de dirigentes do clube com a casa de apostas para um possível patrocínio.
Na época, o time mineiro ainda era dirigido por Ronaldo Fenômeno, que acabou vendendo as ações da SAF para o empresário Pedro Lourenço, o Pedrinho BH, que é padrinho de casamento e de um dos filhos de Gusttavo Lima. Sob seu comando, o Cruzeiro optou por renovar o acordo de patrocínio máster com a Betfair, também uma casa de apostas, mas a presença do cantor, que antes se resumia à figura de torcedor ilustre, passou a englobar o papel de investidor.
Em agosto, o artista sertanejo anunciou que outra empresa de sua propriedade, a BP Consórcio, seria patrocinadora do Cruzeiro e estamparia o uniforme da equipe principal na altura dos ombros. No mês anterior, na véspera do anúncio da renovação de patrocínio da Betfair com o clube, Gusttavo Lima teria adquirido 25% da Vai de Bet, aponta a ordem de prisão decretada pela Justiça Pernambucana.
Pedrinho não chegou a negociar com a Vai de Bet, mas conheceu pessoalmente o dono da empresa, José André Neto, na festa de aniversário do cantor realizada no início deste mês em um iate na Grécia – viagem que, segundo a Operação Integration, teria servido para “dar guarida a foragidos” da Justiça na investigação.
A relação dos compadres mineiros transcende a amizade. Além do recente acordo de patrocínio via BP Consórcio, Gusttavo Lima se inspirou em Pedrinho ao comprar, por 3 milhões de reais, 60% da SAF do Paranavaí, clube da segunda divisão paranaense que é patrocinado pela Vai de Bet.
Em maio, o cantor vendeu Akiles, revelação de 16 anos da base do Paranavaí, ao Cruzeiro, e recebeu de Pedrinho a sinalização positiva para uma futura parceria para novos negócios envolvendo atletas dos clubes. O escândalo com a Vai de Bet deve esfriar as conversas e ainda pode arrastar o dono do clube mineiro para o radar de investigações paralelas.
Diante da repercussão do suposto esquema de lavagem de dinheiro protagonizado por empresas que patrocinam o futebol, parlamentares ligados ao Governo já articulam uma CPI para apurar investimentos de empresários em SAFs e contratos publicitários com bets, visando investigar eventuais dribles à regulamentação das apostas esportivas sancionada pelo presidente Lula no começo do ano.