Kelvin Oliveira é citado junto a "edits" (vídeos curtos com melhores momentos de um jogador) de Ronaldo Fenômeno e até Pelé. Assim como Cristiano Ronaldo, o CR7, Kelvin também sua sigla: K9. Em comum, todos são fazedores de gols. Mas o mineiro de Ipatinga sequer joga a mesma modalidade em que os demais fizeram história. Apesar de ter tentado desde garoto e até ter conseguido algumas oportunidades no futebol profissional, Kelvin Oliveira virou rei no futebol 7 e chegou a ser eleito melhor da categoria após o Mundial de 2021.
O pivô foi o principal jogador do time que representou o Brasil na conquista do título da Copa do Mundo Kings League há uma semana. A edição de seleções segue o mesmo modelo do torneio criado pelo ex-Barcelona Gerard Piqué, em 2023. O formato virou sensação entre fãs do esporte da Geração Z, com times que pertencem a streamers que presidem e transmitem os jogos. Há regras alternativas, como jogos sem empate, drafts, playoffs, próximo dos esportes norte-americanos.
KELVIN OLIVEIRA NA KINGS LEAGUE
— DataFut (@DataFutebol) January 12, 2025
A quem não conhece, a Kings League pode causar estranheza. Entretanto, 40.153 pessoas assistiram à final no Allianz Stadium, da Juventus, em Turim, na Itália. O pico de 3,5 milhões de dispositivos conectados simultaneamente na transmissão foi um recorde para o campeonato.
Kelvin Oliveira foi eleito MVP em duas edições, incluindo a de seleções, aumentou seu sucesso e furou a bolha do futebol 7. No mais recente torneio, o pivô fez 19 gols em 5 jogos. Na final, vencida por 6 a 2 contra a Colômbia, somente ele marcou para o Brasil. O detalhe é que o quinto valeu dois, por uma regra do torneio que dobra o o valor de um gol marcado a partir do minuto 38, se o duelo não estiver empatado.
Você lembra de quando decidiu que levaria a sério a vontade de ser jogador de futebol?
A minha primeira escolinha mesmo de verdade foi com 9 anos. Eu morava em Florianópolis na época. Era na escolinha do Figueirense. Ali que eu comecei a realmente a pegar gosto e querer. Claro que a gente tem um sonho mesmo, mas foi no comecinho que o meu pai realmente falou: 'Olha, a gente tem que pegar firme aqui, que tem ele tem potencial'.
Só que a gente sempre mudou muito de cidade. A gente morava em Ipatinga, foi para Belo Horizonte, foi para Florianópolis, Tubarão, aí voltou para Minas Gerais. Então, eu não ficava muito tempo numa cidade só então. Quando eu voltei para Minas Gerais, eu entrei numa escolinha lá. Teve um dia que um olheiro do São Paulo foi. Era o Careca, ex-jogador.
Acho que, com 12 anos, eu passei um período indo direto para São Paulo. Uma vez eu fiquei no Morumbi, fazia a semana de treinos. Aí eles acompanhavam, e eu voltava para a Ipatinga. Depois de um de um tempo, estava ficando meio complicado de fazer isso, e eu não acabei dando um stop lá.
Sua família mudava tanto por algum motivo específico?
Meu pai e minha mãe tinham algumas oportunidades, mais por conta do emprego do meu pai (representante comercial). Depois desse período de São Paulo, eu fui em alguns outros clubes, mas não estabilizei em nenhum. Tem muita criança, muitos jogadores, então é difícil, se você é muito novo, sair de um lugar e jogar em outro.
Era muito complicado, ia batendo aquela frustração. Você vai ficando chateado com tudo que acontece. Vai desanimando, porque uma coisa é você saber que é limitado tecnicamente, for ruim de bola. Outra coisa é saber que você é bom, e algumas outras coisas não darem certo. Ia ficando frustrado, mas, mesmo assim, eu continuava sempre jogando.
Em um campeonato de Minas Gerais, um grupo de empresários do Rio de Janeiro me chamou para ir ao Milan (em 2011). Eu fiquei um período muito bom de treinos, fui bem. Só que a questão da cidadania não ajudou. Eu não tinha direito nenhum, a gente fez uma procura extensa para ver se conseguia fazer essa cidadania, não deu certo. Fui para o Lecce também, mas o clube foi envolvido em manipulação de resultados, caiu de divisão. E aí foi mais frustrante.
Eu voltei para pro Brasil. Em sequência, o pessoal do Cruzeiro me chamou para poder ir para o Cruzeiro. E foi o clube que eu me estabeleci, fiquei mais tempo.
Não sei exatamente o que aconteceu, mas ligaram para o Léo Moura, que fazia essa intermediação, falaram que a comissão técnica tinha dito que precisava de um centroavante para ontem, não ia poder esperar esse tempo todo para eu voltar com a parte física e estar pronto para jogo.
Depois teve a oportunidade de ir para o São José. Fui muito bem recebido, mas aí já com isso tudo passando na cabeça, desanimado, já final da temporada, um jogo diferente na Série C, mais mais brigado, mais físico. Fiquei três meses no São José e eu voltei para o futebol 7, e as coisas aconteceram.
Você já ganhou dinheiro como vendedor, como contou. Financeiramente, encontrou um emprego no futebol 7?
É claro que a gente fala sobre prestígio, mas o prestígio não faz as compras de casa, não dá o conforto que você tem. Com o futebol 7, hoje eu consigo me sustentar muito bem, ter uma vida muito bacana, eu e minha esposa, a gente tem uma condição legal. 'Por que você não volta para o profissional?' Não vejo muito sentido. Jogando no profissional, para ter uma condição igual eu tenho hoje eu teria de estar num time muito bacana no futebol brasileiro. Graças a Deus, eu tenho um clube que me valoriza e estou muito feliz.
Você sente que precisa provar que pode jogar no futebol profissional?
Até comentei, depois da final (da Kings League World Cup), não querendo ser arrogante ou alguma coisa do tipo, eu não preciso provar a ninguém que eu sou bom no futebol de campo. Eu não jogo futebol de campo mais. Eu tenho de provar que eu sou bom na minha modalidade. E isso eu venho conseguindo. O futebol de campo é uma outra parada. Se eu jogasse futebol de campo, eu teria de provar que eu sou bom.
Você deve continuar na equipe do Gaules, o g3x, e na seleção?
É um projeto que tem uma ambição muito grande, o Gaules (streamer dono do clube) é muito competitivo, a gente fez uma conexão muito boa. A gente está conversando para manter esse projeto e conseguir conquistar muito mais. Com certeza, vai ser um orgulho continuar representando o Brasil na seleção.
Depois de toda trajetória até aqui, diria algo para o Kelvin que tentava ser jogador profissional ainda jovem?
Eu acho diria para ele aproveitar um pouco mais os momentos que ele viveu. Se dedicar um pouquinho mais. Hoje, com a cabeça mais experiente, eu vejo que, se eu quisesse um pouquinho mais, poderia ter resultado diferente. Se eu treinasse como eu treino hoje, se me cuidasse igual me cuido hoje, poderia ser um pouco diferente. Mas principalmente aproveitar os momentos. Passa muito rápido. Tive um momento muito bom no campo, na Europa, pelo Cruzeiro também. A gente fica ainda com aquele ressentimento por não ter dado certo.
Eu tento falar para a nova geração, para os meninos que que gostam de mim, mandam mensagem. Eu sempre falei isso, aproveita o momento, se dedica, dá o 100% agora, porque passa muito rápido e, depois, se você não fizer isso, você vai se arrepender.