Em meio a suspeitas de que teria recebido dinheiro ou bens por apoiar a candidatura do Catar à sede da Copa do Mundo de 2022, o ex-presidente da CBF Ricardo Teixeira deixou a clausura e resolveu se defender. Ele entrou em contato com o Terra, na noite desta terça, a fim de dar a sua versão sobre o voto a favor dos catarianos, em congresso realizado na Fifa, em 2010.
Teixeira acentuou, mais de uma vez, que só falaria sobre o "caso Catar". Pediu que essa condição fosse respeitada. Em uma conversa por mais de 20 minutos, por telefone, disse que gostaria de "explicar pontualmente" a relação da confederação com o Catar. “Esse negócio do Catar é completamente estapafúrdio”, tentou resumir.
O ex-dirigente comandou a CBF de 1989 a 2012, quando renunciou ao cargo. Recentemente, como revelou a Revista Época, ele foi indiciado pela Polícia Federal sob suspeita de ter cometido quatro crimes: lavagem de dinheiro, evasão de divisas, falsidade ideológica e falsificação de documento.
Veja os principais pontos da conversa:
Acusações de suborno - na segunda-feira, 15/6, a revista americana World Soccer trouxe reportagem em que acusa Teixeira de ter recebido 30 milhões de euros (cerca de R$ 105 milhões) para selar o acordo com os catarianos. Na edição de terça, a Folha de S. Paulo publicou que Teixeira e outros dirigentes sul-americanos receberam um relógio de ouro do emir Hamad bin Khalifa Al Thani durante o processo de candidatura do país árabe à sede da Copa de 2022
Ricardo Teixeira - Não recebi nada, rigorosamente nada disso. Esse negócio do Catar é completamente estapafúrdio. Como presidente da CBF, e membro do comitê executivo da Confederação Sul-Americana e da Fifa, recebi a visita de todas as candidaturas, tanto para o Mundial de 2018 quanto para o de 2022. Recebi Bélgica e Holanda, uma candidatura conjunta. Recebi a Rússia. Recebi a Espanha. Recebi os EUA. E também recebi o (então) emir do Catar. Ele veio ao Brasil porque tinha um encontro oficial com o presidente Lula. Fui anfitrião de todos.
Reunião com o emir
Ricardo Teixeira - Fomos ao restaurante do Itanhangá (Itanhangá Golf Club, na zona oeste do Rio). No restaurante cheio de gente, de sócios do clube, cheio de policiais federais, que estavam lá tomando conta dele, cheio de funcionários, os garçons do restaurante, tinha imprensa também. Como é que deu relógio? O Emir não me deu relógio, não me deu picolé, não me deu nada. Nem ali nem fora do clube. Isso é absolutamente ridículo.
O porquê do voto no Catar
Ricardo Teixeira - As pessoas dizem que eu votei no Catar, que a CBF votou no Catar. Por que eu? Não é bem assim. É mais claro dizer que a América do Sul votou no Catar (para 2022). É preciso contextualizar isso. Voltemos para a escolha da sede de 2018. Você tem alguma dúvida de quem os países da América do Sul apoiariam (para o Mundial de 2018)? Claro que seria o Villar (Angel Maria, presidente da Real Federação Espanhola de Futebol). Argentina e Paraguai (que integravam o comitê executivo da Fifa) estavam fechados com a Espanha. Quem estava coligado na candidatura da Espanha? Não era Portugal? Sim, eles pleiteavam uma Copa compartilhada. Então, com Portugal na disputa, lógico que o voto do Brasil (também do comitê executivo da Fifa) seria para eles. Aí que entra a questão. A Espanha precisava de votos. Tinha os três da América do Sul, o dela e possivelmente mais um da Europa. Mas era muito pouco. Então fizemos uma reunião. Eu, Villar e o Grondona (Julio, então presidente da federação de futebol da Argentina, morreu em 2014), reunião em que conseguimos mais alguns votos da Ásia, graças ao Catar. E qual foi o acordo? O Catar votaria conosco (com a candidatura Espanha/Portugal) para 2018 e em troca receberia nosso apoio em 2022. Foi esse o acordo. Foi somente esse o acordo. E o que se viu? A Espanha conseguiu chegar à última rodada de votação, mas perdeu para a Rússia. A história não difere um milímetro disso aí.
Jogo Brasil x Argentina, no Catar, em 17/11/2010 - O jornal O Estado de S. Paulo publicou, no dia 6 de junho, que as autoridades europeias averiguam se o duelo entre Brasil e Argentina, em 2010, foi utilizado como pretexto para o pagamento de propina referente ao processo eleitoral para 2022. Na época, Teixeira era o presidente da CBF.
RICARDO - Inventaram um monte de histórias sobre esse jogo do Brasil com a Argentina, no Catar. Mas rezava o contrato em vigor – ‘acho que ainda é assim’ - que a empresa (Kentaro, da Suíça) me pagava uma cota fixa com a seleção jogando no Brasil, na Alemanha, no Catar, onde fosse. Qual o problema? Foi o que ela me pagou para aquele jogo no Catar e entrou também o direito de televisionamento para o Brasil; isso regido em contrato. Eles pagavam tudo, alimentação, hospedagem, transporte. Se o jogo fosse em Buenos Aires, por exemplo, todo deslocamento dos atletas convocados que atuam na Europa seria por conta da empresa. Trazia os jogadores de fora sempre. E a CBF ainda teria os direitos de transmissão para o Brasil. Um jogo amistoso do Brasil rende 3 milhões de dólares líquidos para a CBF (cerca de 9 milhões de reais). É a cota e mais o direito de transmissão.