No Dia do Orgulho Nerd, os fãs da cultura pop celebram seu amor por suas obras favoritas, exibem coleções e confraternizam com outros apaixonados por livros, filmes, animes e games. Mas alguns vão além e trabalham ativamente para tornar esse meio mais diversificado e inclusivo.
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É o caso dos personagens entrevistados pelo Game On na websérie 'Gamers com Causa', jogadores que buscam levar os jogos digitais e esports para pessoas que costumam ser deixadas de fora pelo fandom, mostrando que a comunidade gamer pode ser mais inclusiva.
Jogos mais acessíveis para todos
A pesquisadora em acessibilidade Belle Utsch e o produtor Wesley 'Wzy' Rios, por exemplo, trabalham em diferentes projetos para a inclusão de pessoas cegas ou com baixa visibilidade no mundo dos jogos.
Cofundador do Blind Kombat, Wesley tem uveíte e usa seu canal para incentivar pessoas com deficiências e conscientizar o público sobre acessibilidade e a importância de uma indústria de games mais inclusiva.
"Eu acho que as empresas estão começando a se preocupar [com a acessibilidade] mas está longe do ideal", disse Wyz ao Game On. "Eu falo muito com os devs indies, apresento a questão para eles. As empresas precisam saber que isso vai vender mais seus jogos e melhorar a qualidade de vida de quem joga".
Belle sempre adorou jogar games e RPG, e desde pequena, tinha dificuldade por causa da baixa visisibildade. Isso a incentivou a pesquisar acessibilidade em tecnologia e levar o conhecimento e a vivência para a indústria.
Para jogar, ela usa tanto uma lupa de cabeça quanto uma luta digital, recurso disponível no computador e nos consoles atuais. "Não é mimimi, a gente só quer ter acesso a tudo", disse Belle.
Para a pesquisadora, o prêmio The Game Awards, evento que é considerado o Oscar dos jogos digitais, ajudou muito a destacar a questão na indústria. "O TGA tem um prêmio para acessibilidade, que premia os jogos acessíveis. Se existe um prêmio, alguém vai querer ganhar".
Esports para a periferia
Independente das competições de jogos eletrônicos serem considerados esportes ou não, é inegável o impacto transformador que os esports podem ter na vida dos jogadores.
Não são poucas as histórias de mudança de vida entre jogadores profissionais no Brasil, principalmente com a ascensão do Free Fire, jogo de celular muito popular e acessível para gamers de baixa renda, por não exigir um PC de milhares de Reais para ser jogado, nem um console de última geração.
Porém, mesmo um celular, internet e a chance de participar de uma grande competição podem ser luxos quase impossíveis em algumas comunidades. Mudar essa realidade motivou a paulistana Maria de Fátima a criar o Complexo Peri, time de Free Fire da periferia de São Paulo, e o criador de conteúdo Lázaro 'Sonic' da Silva, do Parque Vila Maria, também em SP, a criar o campeonato X1 na Comunidade.
O X1 na Comunidade é uma série de torneios independentes e itinerantes que leva o esporte eletrônico para a quebrada, explicou Lázaro ao Game On: "Existem muitas iniciativas para levar as pessoas para o Free Fire, mas não tantas para levar o Free Fire até as pessoas".
"A origem do Complexo do Peri foi na Taça das Favelas", contou Maria de Fátima, que se denomina a maior incentivadora dos meninos do projeto social. "Esse jogo pode mudar a vida deles".
Para Lázaro, o X1 na Comunidade leva a oportunidade do esporte eletrônico para as crianças da periferia, algo que de outra forma seria impossível para muitas delas. "É fácil fazer um evento com premiação de R$ 80 mil, mas com inscrição de R$ 50. Esses R$ 50 fazem diferença aqui. Dentro da casa de uma pessoa dessa comunidade, é uma conta de água que a mãe está preocupada em pagar no final do mês".
Representatividade trans
Heróis de jogos eletrônicos costumavam se encaixar em algumas categorias bem específicas no passado: brutamontes fortemente armados, aventureiros galantes ou heroínas sensualizadas. Isso deixa muita gente de fora, sem conseguir se enxergar nos games que curtem.
E quando a pessoa já tem que lutar para ter seu lugar no mundo real, não se sentir parte nem do hobbie que adora é ainda mais doloroso. É algo que acontece muito na comunidade trans, por exemplo.
Mas alguns jogos, como The Sims, começaram a mudar isso e servem como plataforma para criadores de conteúdo que buscam conscientizar os gamers sobre a sua própria existência, saúde mental das pessoas trans, preconceito e aceitação.
"O The Sims foi o primeiro espaço onde pude explorar aquilo que antes ficava só fechado na minha cabeça. Pude começar a experimentar como era uma relação homossexual, beijar uma pessoa que eu gostava", contou a empreendedora digital Bryanna Nasck, "Eu ficava vermelha, com medo da minha mãe ver aqueles personagens no jogo!".
Para Bryanna, que é uma pessoa trans não-binária, The Sims lhe ajudou a normalizar aquela experiência que parecia tão assustadora na infância. Ela usa suas plataformas para abordar temas de diversidade, games e política, unindo questões de direitos humanos e gameplay.
Ser aceita pela própria comundiade gamer é a causa de Sher Machado, influencer, streamer e empresária. "Todos os lugares que envolvem o mundo dos games, só vejo as mesmas pessoas em posição de destaque. Homens cis, brancos e héteros, ou pessoas brancas". A streamer, que é uma mulher trans e preta, usa seu canal para mostrar que há gente diversa, que também joga bem e que podem fazer parte dessa comunidade.
Cultura nerd para pessoas negras
Como apontou Sher, muito da cultura e da indústria dos games e da cultura pop em geral, é pensada por e para pessoas brancas. Mas há empreendedoras negras e nerds que trabalham ativamente para mudar essa realidade e tornar o mundo geek mais inclusivo.
Andreza Delgado, cocriadora da PerifaCon, evento de cultura pop que se define como a primeira 'convenção nerd das favelas', quer democratizar o acesso à cutlura nerd, geek e pop, fazedo da exclusão uma motivação para seguir em frente e criar oportunidades para a quebrada.
"Tem um poder muito grande nas comunidades, desse fortaleciento das redes, em trazer mais pessoas para esses universos", explicou Andreza. "Você apresenta novas oportunidades de carreira para a galera da favela. O sonho não precisa ficar resumido em ser um influenciador ou jogador de futebol ou modelo para mudar a sua história".
A PerifaCon 2023 acontece em 30 de junho, em São Paulo. Confira mais detalhes sobre o evento no site oficial.
A criadora de conteúdo Anna Quiangala, do blog Preta, Nerd e Burning Hell, teve acesso aos videogames desde pequena, mas se sentia desconfortável com as personagens dos jogos, pois nenhuma delas era negra. Em 2014, ela criou um blog para falar de sua experiência e das coisas que gosta.
"Pareceu que fazia sentido para um conjunto de pessoas", explicou Anna. "Parte da comunidade gamer representa a visão mais conservadora da sociedade", explicou a criadora de conteúdo, que prova que há muito mais diversidade entre os fãs de games do que essa parcela da comunidade imagina ou aceita.
Layze 'Lahgolas' Brandão descobriu os esports em 2016 e foi um momento de virada em sua vida. Em 2021, ela começou a comentar campeonatos oficialmente pela Riot Games. "A partir disso, criei um projeto chamado ReveLAH Casters", conta a narradora.
"O projeto oferece mentoria para ajudar a desenvolver mulheres nessa área, que querem narrar, comentar, serem analistas". A iniciativa causou um choque no público dos esports. "Parte da comunidade não estava acostumada a ver mulheres, ou achar que mulheres entendiam o suficiente ou eram boas o suficiente para estarem lá".
Para Lahgolas, é bom ver que agora as mulheres aparecem nas transmissões, como protagonistas. "Aceitar a diversidade é bom. De alguma forma, você está mudando aquele mundo que está a sua volta".