Os "contos de fadas" podem se apresentar de diferentes formas e muitas vezes usam maneiras inusitadas de se comunicarem com o público. Lost in Random é um desses contos "aleatórios" (com o perdão do trocadilho da palavra "Random" em inglês), dono de uma narrativa que mexe com o imaginário do jogador, e traz à tona temas como o "medo de crescer" e fraternidade através de metáforas. Para quem gosta da premissa "senta que lá vem história", LiR é uma obra para zerar.
Conto de fadas sombrio e misterioso
O título publicado pela EA Originals e desenvolvido pela Zoink traz diversas referências dos jogos de tabuleiro, e transporta o jogador para um mundo bizarro onde vai viver várias aventuras na pele de uma menina de 11 anos chamada Even, enquanto o narrador, amigo onipresente da criança, comenta os pensamentos dela ao longo da jornada.
O mundo fantástico do jogo se passa em Random, reino sombrio, dividido em seis regiões: Onecroft, Two Town, Threedom, Fourburg, Fivetropolis e Sixtopia (que representam as seis faces de um dado). Tudo é controlado pela Rainha, personagem que decide o destino de cada habitante no dado, quando cada um deles completa seu 12º aniversário.
A jovem Even mora em Onecroft, reino mais precário de Random, com sua família e a irmã Odd, de 12 anos (as irmãs chamam par e ímpar, em inglês rs). Odd tira seis no dado e assim passa a morar com a Rainha no palácio de Sixtopia, região mais luxuosa e exuberante. Um ano depois, Even começa a ter pesadelos intrigantes e sente que Odd está em perigo. Portanto, decide ir atrás de sua irmã.
Ao longo da trajetória para resgatá-la, Even conhece Dicey, um dado mágico que ganha vida. Com os poderes especiais dele, ela pode parar o tempo e convocar um arsenal para combater as forças malignas da Rainha. Juntos, atravessam o reino, conhecem pessoas excêntricas e descobrem os segredos sombrios de Random, enquanto lutam para chegar ao palácio e revelar os vários mistérios que ele guarda (e que são bem 'dark' mesmo).
Qualquer semelhança com os ambientes fantásticos criados por estúdios como a Disney ou do diretorTim Burtom, por exemplo, não é mera coincidência. Afinal, a Zoink bebe da mesma fonte da imaginação desses criadores.
"Nos inspiramos em histórias como Alice no País das Maravilhas e outros contos de fadas sombrios. Temos um monstro sombrio do folclore que prende crianças em sua caixa torácica, um prefeito cuja segunda personalidade está literalmente crescendo para fora do seu chapéu, e um dado com braços e pernas como exemplo. Tudo isso porque é algo visualmente impressionante ou algo que cria uma sensação de maravilha em quem joga, a sensação de entrar em uma fábula", disse Olov Redmalm, diretor criativo e roteirista-chefe de Lost in Random no lançamento do jogo.
Diferente e aleatório na medida certa
Sendo dono de um enredo bizarro, Lost in Random não poderia deixar de apresentar o diferente em sua forma de gameplay. Mesmo dentro do conceito de "tudo é aleatório" que rege o reino, as fases são bem definidas e é fácil de acompanhar a ordem das missões.
No entanto, como a heroína mirim do jogo só tem um estilingue para se defender dos monstros terríveis que assolam a noite, portanto ela precisa montar um conjunto de cartas - bem no estilo RPG.
Ao coletar as cartas, Even se fortalece e vai ficando mais poderosa para enfrentar os desafios. Os tipos de carta são Dano, Defesa , Arma , Ameaça e Trapaça. A combinação de vários elementos leva a um baralho ideal para os típicos combates da gameplay ou a batalhas especiais nas "arenas vivas", que parecem jogos de tabuleiro.
É exatamente neste mix de estilos que mora o ponto alto do jogo, pois há diversidade de desafios, o que leva o sistema de fases longe daquela sensação de tédio ao completar cada missão.
Durante a aventura, Even pode explorar um pouco dos cenários - o jogo não é de mundo aberto - e tem conversas com os habitantes de cada região do reino. É interessante para entender a vida dos personagens e NPCs de Lost in Random (mesmo que alguns personagens se pareçam e seja normal ver NPCs exatamente iguais em diferentes regiões).
Neste aspecto, faz falta as falas da protagonista, que só aparecem durante as cutscenes, e há um problema grave para os jogadores brasileiros: não há legendas ou dublagem em português do Brasil.
Considerações
Por fim, se os jogos indie tem ganhado espaço na indústria e no coração de pessoas ao redor de todo o mundo, muito se deve a obras como Lost in Random. Os jogadores anseiam pelo novo, pelo diferente, por referências que sejam de fora dos videogames. Nem sempre só os gráfico ou a engine de última geração são capazes de despertar memórias e sentimentos realmente genuínos. E é isso que Lost in Random faz com sua história, de forma muito bela.
Lost in Random está disponível PC, PS4, PS5, Switch, Xbox One e Xbox Series S/X.
*A análise foi feita no PC, com uma cópia gentilmente cedida pela Electronic Arts.