Não é de hoje que as mulheres vêm equilibrando a balança do público considerado gamer no Brasil. Segundo a edição 2024 da Pesquisa Game Brasil, elas já representam 50,9% da população que joga e consome jogos digitais como uma de suas principais formas de entretenimento.
Assim, a participação crescente das mulheres nos esportes eletrônicos, outra paixão dos gamers brasileiro, deveria ser algo natural. Mas a presença delas ainda chama a atenção, tanto pelo histórico masculino no segmento, quanto pelos desafios enfrentados por jogadoras, executivas e outras profissionais que lutam diariamente para tornar o cenário mais inclusivo.
É o que conta Natália "daiki" Vilela, Jogadora de Valorant que, aos 19 anos, é uma das melhores atletas do mundo do jogo de tiro da Riot Games ao lado das colegas da Team Liquid. Daiki começou a jogar por influência dos irmãos, em jogos como WolfTeam e PointBlank, e se orgulha dos feitos na Cavalaria. "Conseguimos fazer história como o primeiro time inclusivo a se classificar para o 'closed' do maior evento misto nacional", explicou a jogadora ao Game On. "Além disso, somos o atual Top 2 do mundo, pois fomos as vice-campeãs da última edição do Mundial da modalidade".
Daiki, que treina diariamente com as companheiras de equipe para dominar as estratégias de cada mapa de Valorant, costuma escutar que é uma inspiração para muitas meninas que estão começando a jogar. "Quando escuto isso de alguém, como mulher, tenho um sentimento de dever cumprido, pois já estive nessa posição de fã e sei o quanto essa pessoa que inspira faz a diferença para quem está começando", disse a jogadora. Para ela, o que falta para muitas meninas que competem em esports é experiência: "Isso vem com o tempo e, principalmente, com investimento para que não desistam".
A psicóloga Patrícia Lima, de 30 anos, sempre trabalhou com Psicologia Organizacional e Neuropsicologia em setores como tecnologia, varejo e inovação. Atualmente, ela aplica seus conhecimentos na FURIA Esports, organização onde é Head de Diversidade, Equidade e Inclusão. Patrícia, que sempre gostou de games como PUBG, Call of Duty e League of Legends, diz que se surpreendeu com o tamanho do cenário de esportes eletrônicos e com o quanto as pessoas não sabem da estrutura imensa por trás dele.
"Pra quem vem de onde eu vim, é um mundo novo, totalmente inexplorado por nós, e eu acredito que isso aconteça devido aos estereótipos sociais que estão intrínsecos, inclusive em quem tem acesso ou não a esse cenário", contou a psicóloga. "Eu precisava incluir gente, era uma demanda urgente". Para ela, a FURIA tem um papel importante nesse desafio. "Somos porta-vozes de pessoas que não têm acesso e nem oportunidade de falar em determinados espaços".
Além da participação feminina nos esports, Patrícia lista outras ações da FURIA para tornar o meio mais inclusivo também para pessoas pretas, LGBTQIAP+ e neurodiversas. "É uma de nossas maiores conquistas", reconheceu a psicóloga, "conseguimos mudar o quadro da FURIA em 9 meses de atuação. Só em 2023, conseguimos impactar mais de 1200 pessoas em condição de alta vulnerabilidade e contratamos 40% mais pessoas pretas e pardas para nosso time".
A busca por inclusão também é uma pauta para a indústria, e um exemplo disso é a atuação de Anelise Soares Velame, 32 anos, Gerente Sênior de Brand Partnerships LATAM da Ubisoft. Veterana do mercado de games, com 11 anos na área, sendo oito deles na publisher francesa, Anelise trabalha com parcerias de marcas e desenvolvimento de negócios dentro dos games e esports. Um dos seus maiores orgulhos é a Liga Feminina de Rainbow Six Siege, o popular 'R6', jogo de tiro em que os brasileiros se destacam mundialmente. Anelise também destaca sua atuação no recente torneio mundial do game, realizado em São Paulo, e em parcerias com marcas famosas, como MAC Cosmetics e Itaú.
Com tantos anos na área, a executiva enxerga que o mercado já evoluiu bastante quando se trata de inclusão, mas que ainda tem um longo caminho a percorrer. "Os desafios são grandes, já que o mercado sempre foi majoritariamente masculino", explica Anelise, que cita o comprometimento da Ubisoft para um presente e futuro mais inclusivo para as mulheres nos esports.
"A Ubisoft há muitos anos apoia cenários femininos nos esports com o objetivo de que as mulheres tenham cada vez mais espaço e visibilidade", disse a executiva. "Também buscamos dar espaço para mulheres em outras funções nos esports: hoje temos em nosso casting de talentos comentaristas, narradoras, jornalistas, além de mulheres nas funções de produção e até mesmo no desenvolvimento de negócios, como eu".