Carros elétricos: o Brasil precisa decidir se quer ou não quer

Cresce o lobby da Anfavea para atrasar o máximo possível o mercado de carros elétricos no Brasil; decisão caberá ao presidente Lula

26 fev 2023 - 09h48
Renault Kwid E-Tech: por enquanto, vem importado da China
Renault Kwid E-Tech: por enquanto, vem importado da China
Foto: Renault / Divulgação

Os carros elétricos passaram a ser um assunto quente dentro da Anfavea. A associação que reúne as montadoras mais poderosas do Brasil (Stellantis, General Motors, Volkswagen e Mercedes-Benz, entre outras) aumentou o lobby para retardar o máximo possível a criação de um mercado de veículos 100% elétricos no Brasil.

Sob o argumento de que o setor precisa de "previsibilidade", a Anfavea já tem uma linha de frente para combater o crescimento das vendas de carros elétricos no Brasil. Por isso, a entidade pede a revisão imediata do imposto zero para carros elétricos importados.

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O lobby da Anfavea reúne desde altos executivos das montadoras até jornalistas especializados, passando por empresas que prestam serviço ao setor. O discurso é unificado: o etanol seria numa solução melhor para o Brasil do que o carro elétrico. A ideia é investir na tecnologia de carros híbridos a etanol.

Mas já não é segredo que a Anfavea está rachada nessa questão. De um lado, Volkswagen e Stellantis defendem o etanol; do outro, GM e Mercedes são a favor dos elétricos, assim como a Renault. Assistindo de camarote estão as chinesas GWM e Byd, que não fazem parte da Anfavea (ainda), mas aproveitam o imposto zero ou reduzido dos carros elétricos para entrar no mercado.

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Foto: Sergio Quintanilha / Guia do Carro

Na semana passada, o CEO global da Stellantis, Carlos Tavares, deu uma ruidosa entrevista ao jornal Valor Econômico dizendo que, para o Brasil, “o elétrico não faz sentido se comparado com o carro que pode rodar com 100% de etanol”. E completou: “Sem contar que é muito mais caro para a classe média”. Tavares fala em nome de cinco marcas: Fiat (líder do mercado), Jeep, Citroën, Peugeot, Ram e Abarth.

Do outro lado, a GM vê na fala do concorrente um desejo de perpetuar tecnologias que já estão ultrapassadas. Na visão da GM – que, por enquanto, só vende carros da marca Chevrolet no Brasil, mas pode ampliar para Cadillac e GMC –, o carro híbrido já foi mais do que testado e não há sentido em retardar a formação de um mercado de carros 100% elétrico, caso contrário os veículos produzidos no Brasil deixarão de ser competitivos no resto do mundo.

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Para a Stellantis, a classe média brasileira não tem condições de pagar os altos custos de um carro elétrico. Para a GM, a única forma de baratear esses custos no futuro é criando agora um mercado de carros 100% elétricos. Outros críticos afirmam que a classe média não consegue pagar os carros flex atuais, por isso a discussão nem deveria ser essa.

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Foto: Stellantis / Divulgação

Críticos da solução do etanol afirmam que algumas montadoras querem transferir da Europa para o Brasil o ferramental que se tornará obsoleto no Primeiro Mundo. Críticos dos carros a bateria afirmam que a mineração de lítio causará mais danos ambientais do que o uso do etanol como combustível.

A decisão, no final das contas, caberá ao presidente Luís Inácio Lula da Silva. Ao contrário do governo Bolsonaro, o governo Lula pretende ser um líder mundial nas questões ambientais. As recentes chuvas que destruíram estradas e comunidades do litoral norte de São Paulo tiveram grande impacto no governo federal e também no governo paulista.

A ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, certamente terá peso na decisão de Lula, mas o presidente também analisará a questão do ponto de vista político e econômico. O que significará para o Brasil aderir ao movimento global dos carros elétricos ou adotar uma solução tupiniquim, considerando a realidade econômica nacional? Esta é a questão. Por isso, os lobbies se intensificam.

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Foto: Pedro Dhantas / VW / Divulgação

Em 2022, apenas 8.440 carros elétricos foram vendidos no Brasil, além de 749 ônibus e caminhões elétricos. Trata-se de um volume baixíssimo, de apenas 0,4% do total de carros e de 0,5% do total de caminhões e ônibus. É possível que isso mude se o governo Lula mudar o incentivo do carro elétrico de importado para nacional? Aqui também há debate.

O timing para que isso aconteça, na opinião de alguns especialistas, pode matar o sonho de um carro elétrico nacional antes que as montadoras capacitadas a fazê-lo tenham demanda que justifique o investimento. Por isso, o que está em jogo não é “só” o Brasil, mas principalmente o tamanho que Stellantis, Volkswagen, GM, Mercedes, Renault, GWM, Byd, BMW, Caoa Chery e outras poderão ter no futuro. 

Rodamos em São Paulo com o Renault Kwid E-Tech elétrico
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