Uma olhada rápida em seu feed do Instagram já é suficiente para concluir que sua trajetória cheia de luta e sucessos foi singular na linha do tempo do esporte brasileiro. Dona de um sorriso doce e largo, Aída dos Santos Menezes, 87 anos, tem muita história para contar e uma vida de conquistas a celebrar. As fotos de momentos felizes ao lado dos filhos se alternam com as imagens célebres em preto e branco de saltos monumentais em Jogos Olímpicos e o orgulho posto de primeira finalista olímpica do Brasil.
- Esse artigo faz parte da série Mulheres Olímpicas, que conta histórias de mulheres que brilharam e se tornaram referências mundiais nos seus esportes, impactando as gerações futuras.
Machismo, preconceito e racismo foram os obstáculos mais difíceis de sua jornada. Nasceu prematura, na capital carioca, e passou a infância no Morro do Arroz, em Niterói (RJ). Filha de um pedreiro e de uma lavadeira, Aída era a caçula entre seis irmãos e teve uma infância humilde.
Embora tenha começado a trabalhar muito cedo para ajudar em casa, sempre que tinha um tempinho ia treinar vôlei no Complexo Esportivo Caio Martins. Chegou a disputar competições escolares, mas foi desestimulada após ouvir xingamentos racistas durante uma partida.
Incentivada por uma amiga que praticava atletismo, trocou de modalidade e demonstrou tanto talento que chamou a atenção do Fluminense. Na primeira competição que ganhou levou uma surra do pai, que disse que medalha não enchia barriga.
Já no Vasco, faltava aos treinos porque usava o dinheiro da passagem para comprar comida. As muitas dificuldades jamais a desanimaram e a visibilidade de suas habilidades lhe davam forças para seguir em frente.
Em sua primeira participação nas Olimpíadas, em Tóquio (1964), Aída ficou em quarto lugar no salto em altura, atingindo a marca de 1,74m. No evento, foi a única mulher da delegação brasileira entre 68 atletas.
O desempenho marcante camuflou a realidade dos bastidores sem estrutura: Aída dos Santos viajou sem técnico, sem material para competir e sem roupa para a Cerimônia de Abertura.
Aída conseguiu sua classificação para a final, tornando-se a primeira mulher brasileira a chegar à uma final olímpica, mas na fase classificatória torceu o tornozelo durante o salto. Desprezada pelos dirigentes brasileiros, foi atendida pelo médico da delegação cubana.
Pioneira e diplomada
O quarto lugar de Aída dos Santos no salto em altura em Tóquio foi o melhor resultado das mulheres brasileiras em Jogos Olímpicos até as Olimpíadas de Atlanta, em 1996. De volta ao Brasil, foi aclamada pelos fãs. Quatro anos depois, nos Jogos da Cidade do México, ficou em vigésimo lugar no pentatlo.
Ciente de que os estudos seriam uma garantia de um futuro melhor além do esporte, acumulou diplomas universitários: Geografia, Pedagogia e Educação Física. Foi professora voluntária de natação, basquete e futsal na Universidade Federal Fluminense (UFF).
Em 2006, recebeu o Troféu Adhemar Ferreira da Silva no Prêmio Brasil Olímpico e, em 2009, foi agraciada com o Diploma Mundial Mulher e Esporte, uma premiação especial do Comitê Olímpico Internacional (COI).
Em 2021, a Centauro, maior rede de artigos esportivos da América Latina, homenageou a ex-alteta com uma edição limitada do "uniforme que nunca existiu". O traje continha diversos símbolos de sua história, como os bolsos bordados com uma imagem do Morro do Arroz e até um detalhe representando o machucado na perna antes da final.
Mãe de três filhos atletas - uma delas é a jogadora de vôlei Valeska Menezes, medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de 2008, em Pequim -, Aída mantém um instituto para promover a inclusão social por meio do atletismo e do voleibol.
Em maio deste ano, numa parceria entre a Prefeitura de Niterói e a UFF, o complexo esportivo localizado no campus do Gragoatá da universidade foi reformado e passou a se chamar Complexo Aída dos Santos. Trata-se de mais uma homenagem para aquela que, com quase 90 anos de idade, ainda faz questão de prestigiar e incentivar o esporte nacional.