Ana Paula Padrão: “Tive a vida que escolhi. Era o meu sonho"

Em entrevista ao Terra, apresentadora do Masterchef falou sobre a dor de perder um bebê, a decisão de não ser mãe e tabus da menopausa

15 dez 2021 - 19h12
(atualizado às 19h16)

Desde 2014, Ana Paula Padrão apresenta o Masterchef, o reality show de gastronomia da Band. A imagem da jornalista na bancada do Jornal da Globo ainda é tão presente na memória do público, que até o cabelo daquela época desperta saudade. “A quantidade de pessoas que me pedem para cortar o cabelinho chanel é um negócio que você não imagina…”, conta Ana Paula Padrão, em entrevista exclusiva ao Terra, por videochamada. 

Ana Paula tem 56 anos, é casada, não tem filhos e é muito envolvida com os temas inerentes ao universo feminino. Fundou a empresa Tempo de Mulher, que promove pesquisas e debates sobre o papel da mulher na sociedade. Ela é a idealizadora do evento 'Mulheres Pós 2020', realizado no dia 16 de dezembro, com transmissão ao vivo pelo Terra. 

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Ana Paula Padrão é uma das idealizadoras do 'Mulheres Pós 2020', ao lado de Lia Rizzo e Cristiano Diniz
Ana Paula Padrão é uma das idealizadoras do 'Mulheres Pós 2020', ao lado de Lia Rizzo e Cristiano Diniz
Foto: Samuca Kim

"Quando comecei a fazer eventos, por volta de 2010, os temas eram muito mais simples: falavam de ‘mulher no trabalho’, de maneira muito genérica. A gente não discutia gênero, raça, sexualidade, menopausa, direitos das pessoas homossexuais, trans, homofobia… Assuntos que hoje são muito quentes – e devem ser –, porque estamos falando do direito das pessoas."

Nesta entrevista, Ana Paula Padrão revela que não aceita pressões externas – “Não admito” –, mas que, por um momento, sentiu-se pressionada por si mesma para ser mãe. Depois de perder um bebê, porém, concluiu que a maternidade não era a sua vontade. "Tenho tido uma vida perfeitamente feliz sem filhos. As coisas que eu vi no mundo, os lugares que eu visitei, a carreira que eu construí, talvez não fossem possíveis se eu tivesse tido filhos."

Leia a entrevista que Ana Paula Padrão concedeu ao Terra.

Terra: Você se preocupa com o fortalecimento das mulheres. Você lembra como isso virou uma questão na sua vida?

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Ana Paula Padrão: Eu me lembro super. Foi um processo que começou quando eu fazia muitas reportagens que envolviam mulheres. Todo país que visitava, eu procurava entender como as mulheres se comportavam e quais eram os problemas delas. Quando fui para o Afeganistão, vi um país onde as mulheres não podiam trabalhar, não podiam estudar, tinham que andar de burca. Comecei a pensar como as mulheres, nos lugares mais diferentes do mundo, tinham alguma coisa parecida entre elas. Percebi que todas as angústias que eu carregava eram muito parecidas com as de todas as mulheres. A gente só não falava sobre isso. Desde então, adotei como princípio falar sobre aquilo que me incomoda, porque, em geral, também está incomodando outras mulheres. Não estamos sozinhas. Tem outra mulher sentindo a mesma coisa do seu lado.

Terra: Você se sentiu pressionada para ser mãe?

Ana Paula Padrão: No meu caso, a pressão veio de mim mesma. Não sou uma pessoa que admite pressão externa, porque eu não incomodo os outros com o meu comportamento. Então nunca admiti nenhum tipo de patrulha sobre qualquer decisão que eu tomasse sobre a minha vida. Assumo totalmente a responsabilidade sobre minhas escolhas. Não fui a menina que sonhava em ter uma casa cheia de filhos. Passei a maior parte da idade adulta trabalhando muito e pensando pouco sobre esse tipo de decisão, mas não era um desejo que eu estava adiando por causa do trabalho. Não, não havia desejo. 

Terra: No Dia das Crianças, você fez um post sobre maternidade e como a natureza pega no calcanhar da mulher. Foi aí que você pensou em ter filhos?

Ana Paula Padrão: Na idade considerada limite para a reprodução, perto dos 40 anos, comecei a pensar: "Será?". E você conversa com as mulheres e elas falam: "Não dá para não ter essa experiência", "Tem que viver isso na vida". E eu estava em um casamento estável, bacana, meu marido queria e eu tentei da maneira tradicional e não veio. Depois, fiz alguns tratamentos e ainda assim não veio. Cheguei a ficar grávida uma vez e perdi na décima semana. É uma dor profunda. E olha que não era o sonho da minha vida, mas é uma coisa terrível. É avassalador. E aí eu pensei: "Puxa vida, não tinha nenhum ponto de frustração ou infelicidade na minha vida e eu estou inventando um. Não faz o menor sentido". Não só parei de tentar, como comecei a evitar. Agora, eu não quero mesmo! E virou um não-assunto na minha cabeça. E eu tenho tido uma vida perfeitamente feliz sem filhos.

Desde 2014, Ana Paula Padrão é a apresentadora do 'MasterChef Brasil'
Foto: Leonardo Benassatto/Futura Press

As coisas que eu vi no mundo, os lugares que eu visitei, a carreira que eu construí, talvez não fossem possíveis se eu tivesse tido filhos. Tive a vida que eu escolhi ter, esse era o meu sonho de infância. Queria ver o mundo, queria estar onde as coisas estivessem acontecendo e o que eu fiz? Eu fiz isso. Então eu vivi o meu sonho. Eu vivi o que eu planejei para mim. Não escolhi ser mãe, porque não era o meu sonho ser mãe. Estou dizendo com isso que as mulheres não têm que ser mães? Pelo contrário: eu acho que as pessoas têm que viver aquilo que elas desejam viver. 

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Terra: Ainda hoje, a gente precisa colocar em discussão esse tipo de cobrança com as mulheres?

Ana Paula Padrão: Existem mulheres que têm vocação para a medicina, outras para o jornalismo e existem aquelas que têm vocação para a maternidade. Que coisa bacana seria se cada uma pudesse seguir sua vocação, né? O problema é que não é assim. Todo mundo espera que, além de ser médica, você também seja mãe. Além de ser jornalista, você também seja mãe. E nem sempre as pessoas são talhadas para isso. E aí você vai ter mais dificuldade em uma tarefa que já é dificílima, que é educar alguém. A mesma coisa acontece com a menopausa. Todas as mulheres do mundo passarão pela menopausa. Todas! Quantas discussões você, que tem quase 30 anos, ouviu sobre menopausa nos últimos anos da sua vida? Quantas vezes alguém falou para você: "Olha, agora que você tem 30, cuida disso e daquilo para você chegar bem na menopausa, porque é uma idade que vai complicar, o corpo muda muito"? Quantas vezes você ouviu assim: "Olha, isso que você está fazendo no seu cabelo agora, cuidado, porque, quando chegar na menopausa, acontece tal coisa com o cabelo"? Você ouve isso com frequência? 

Terra: Não. No máximo alguém falando sobre reposição hormonal…

Ana Paula Padrão: Então, pois é, ninguém fala nesse negócio. Tive sorte, porque não passei pelos efeitos da menopausa. Fui histerectomizada aos 50 anos. Eu tinha uns miomas que começaram a crescer e o meu ginecologista achou que era melhor tirar o útero, ovários, tudo. E eu comecei uma reposição hormonal, que funcionou muito. Tem mulheres que têm reações mais difíceis. Mas, para mim, foi ótimo. Não tive calores, não tive insônia, não tive perda de libido. Meu cabelo mudou um pouco, mas não foi tão drástica a mudança. Meu corpo mudou um pouco, mas também não foi algo que me atrapalhasse tanto na vida. Porém tudo isso acontece com uma mulher que entra na menopausa. 

Terra: Por que a menopausa não é um assunto frequente?

Ana Paula Padrão: Acho que o principal motivo para que uma mulher não fale de menopausa é que é meio "vergonhoso" passar por ela. Porque culturalmente você passa a ser vista como uma mulher que foi descartada. É a mesma coisa que falar: "Optei por não ser mãe". Culturalmente, você vai ser tachada de má, egoísta, porque não quis dar à luz, porque não quis gerar um filho. São tabus culturais e nós, mulheres, evitamos esses assuntos, porque a gente não quer o dedo apontado para nós. Então tem que ter muita coragem para começar a falar de determinados assuntos. Mas foi com coragem que eu cheguei até aqui, então não vou mudar nada nessa altura do campeonato, porque está indo muito bem.

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Terra: Você conta que tem coragem, se arrisca e muda. Quando isso acontece, você sente insegurança, medo? 

Ana Paula Padrão: Olha, se a gente dividisse o mundo em dois tipos de pessoas, as seguras e as inseguras, eu certamente seria do segundo grupo. Sou uma pessoa insegura. Não sou superdestemida. Porém, sempre tive mais coragem do que medo. É como se, para mim, o prazer de superar o medo fosse maior do que qualquer outra coisa. A minha ligação com a superação do medo é quase inconsequente. Se eu estou insegura, preciso vencer aquilo mais do que qualquer outra coisa. Não sou de empurrar com a barriga. Se tem um tema que está me atazanando, eu quero resolver. Não tomo decisões intempestivamente e de maneira irracional. Tenho um processo e não é curtinho. Penso bastante. Mas aí eu faço, resolvo e nunca mais olho para aquilo. Realmente me reinvento muito, porque a situação anterior não estava mais me deixando feliz. Então as pessoas podem vir: "Ah, mas você era tão boa naquilo", "eu gostava tanto do seu cabelo chanel"... Pois é, mas eu não gosto mais de cabelo chanel, olha só, eu gosto de cabelo comprido agora. E a quantidade de pessoas que me pedem para voltar a cortar o cabelinho chanel é um negócio que você não imagina...

Terra: Como foi a idealização do 'Mulheres Pós 2020'?

Ana Paula Padrão: Eu, o Cris Diniz e a Lia Rizzo [idealizadores do 'Mulheres Pós 2020'] decidimos levar para o palco assuntos que não parávamos de conversar sobre as consequências nefastas que as mulheres, especificamente, viveriam no pós-pandemia. Desemprego, não ter com quem deixar os filhos, meninas que pararam de ir para a escola – que era um território seguro para elas, em um país violento como o Brasil, onde o estupro é uma questão cultural que, em geral, é cometido por pessoas próximas... E educação! Imagina um ano sem escola para crianças que não têm computador em casa. Se foi enfadonho e chato para aquelas que têm um computador maravilhoso, que estudam em escolas pagas, imagina para as que não têm nem internet. O aumento de casos de violência doméstica. É muita volta atrás e o maior impacto é sempre sobre a mulher. Queríamos colaborar de alguma maneira para fazer reverberar essas consequências terríveis da pandemia sobre a mulher.

Terra: E quais são as expectativas para a segunda edição do evento?

Ana Paula Padrão: Alguns dos assuntos que a gente não abordou no primeiro e que se tornaram mais emergenciais, estamos tocando agora no segundo como, por exemplo, justiça climática. Depois da COP, a gente tem um painel para falar especificamente disso, que é um tema que também pesa muito mais para a mulher, por uma série de fatores. A violência contra mulheres em situação de poder. Quantos episódios de violência contra mulheres na política, mulheres que têm voz no jornalismo, mulheres que têm algum cargo importante em uma empresa a gente viu nesse período de pandemia? Inúmeros. Toda vez que uma mulher exerce o poder, vem alguém e dá um tapinha. Não pode! Precisamos falar sobre isso.

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'Mulheres Pós 2020'

No dia 16 de dezembro, a partir das 10h, será realizado a segunda edição do evento 'Mulheres Pós 2020', que tem o objetivo de aprofundar as discussões em torno dos impactos da pandemia na vida das mulheres e na jornada por igualdade de gênero. Idealizado por Ana Paula Padrão, Lia Rizzo e Cristiano Diniz, o Mulheres Pós 2020 será transmitido ao vivo pelo Terra.

Fonte: Redação Terra
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