Nascida em Rio Grande, no Rio Grande do Sul, mas desde os 7 anos de idade vivendo no Canadá, Nicole Silveira às vezes esquece algumas palavras em português, e solta outras com bastante sotaque.
A atleta, que fez história nos Jogos de Inverno de Pequim em fevereiro deste ano, participou da live do Papo de Mina e contou sobre o skeleton - esporte individual de descida de trenó em pista de gelo -, a preparação para disputar a Olimpíada e como consegue conciliar os treinos e competições com o trabalho como enfermeira.
Mas de onde surgiu o interesse pelo skeleton, modalidade pouco conhecida, e que nenhuma brasileira tinha disputado nos Jogos?
“Em 2017 eu trabalhava em uma loja de suplementos, e um amigo foi lá, descobriu que eu era brasileira e me chamou pra fazer parte do time de bobsled. [...] Fiz um ano, acabou não qualificando o time feminino [para os Jogos da Coreia], e a Confederação do Brasil perguntou se eu queria tentar o skeleton”, conta.
A paixão, porém, não foi à primeira vista. “Se eu falar que peguei gosto na primeira descida eu estaria mentindo”, revela a atleta. “Deu bastante medo nas primeiras descidas, e foi por isso que não amei de primeira. Descobri que sou alguém que gosta de ter controle, e nas primeiras descidas não tive controle nenhum”, explica.
Depois da primeira experiência, Nicole esperou mais nove meses para tentar novamente, quando retornou a temporada de inverno, e foi para uma escola de iniciantes aprender a pilotar o trenó e a ganhar o tão esperado controle. O gosto veio, e hoje ela é a 13ª melhor do mundo no esporte.
Enfermagem x Skeleton
O caminho para ser a melhor da América Latina na história do skeleton, porém, passou não apenas pelo desafio de aprender a modalidade em apenas quatro anos. Formada em Enfermagem, Nicole trabalhou na linha de frente durante a pandemia da Covid-19, e chegou a realizar mais de um teste por dia às vésperas de embarcar para China, em janeiro deste ano.
“O maior período de estresse relacionado à pandemia foi em janeiro e fevereiro antes dos Jogos. Não era medo de pegar, mas as consequências… não ia poder ir pros Jogos, ou ir em quarentena”, diz.
Ela relembra ainda que nem chegou a comemorar quando garantiu a classificação para a Olimpíada, e só comemorou quando terminou a última volta. “Foi mais estressante do que qualquer experiência que eu tive”,afirma.
Conciliar a vida de atleta de alto rendimento com a rotina de ser uma profissional da área da saúde é algo que ela ainda está aprendendo, mas que não abre mão por dois motivos: além de amar as suas duas funções, Nicole precisa do dinheiro que recebe como enfermeira para compensar a falta de patrocínio no skeleton.
"É a minha maior dificuldade dos últimos anos. Morar fora do Brasil fica muito mais difícil, e no Canadá fica difícil encontrar quem ajude quem não compete pelo país”, aponta.
A meta agora é colocar os treinos como prioridade, para se preparar para a Olimpíada de 2026, e evitar situações como essa: “ontem trabalhei das 7h às 15h, sai, fui treinar, direto pra pista das 16h às 18h, voltei para o hospital e trabalhei das 19h às 23h”.
Referência dos esportes de inverno no Brasil, Nicole quer ajudar a modalidade a crescer e angariar mais atletas para a seleção brasileira de esportes de gelo. Além de viajar pelo Canadá para divulgar o esporte, ela convida os interessados a entrarem em contato pelas suas redes sociais. “Eu encaminho para os responsáveis”, garante.