Briga sobre BPC alerta para mudanças na avaliação da deficiência e ameaças a direitos

Lula sanciona novas regras do Benefício de Prestação Continuada, com veto à barreira da "deficiência grave ou moderada"; publicada no Diário Oficial da União desta sexta-feira, 27, a Lei n° 15.077/2024 mantém a possibilidade, prevista na LOAS, de BPC para duas pessoas com deficiência da mesma casa.

28 dez 2024 - 12h23
(atualizado às 12h41)

Está publicada em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) desta sexta-feira, 27, a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) às 'novas' regras do Benefício de Prestação Continuada (BPC) propostas pelo governo federal no pacote de corte de gastos.

Lula, conforme acordo anunciado na semana passada após aprovação do Projeto de Lei n° 4.614/2024 no Senado, vetou o trecho que limitava a concessão do BPC a pessoas com "deficiência moderada ou grave", uma condição que poderia gerar o cancelamento de milhares de benefícios e que foi o principal alvo de protestos de instituições que representam a população com deficiência.

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Documento

LEI Nº 15.077, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2024

"Não houve avanço nem retrocesso. A gente só conseguiu manter um direito que já estava assegurado na Constituição e na LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social), mas para isso tivemos que desprender uma baita de uma energia, recursos que muitas vezes a gente não possui, no mês de dezembro, que é complicado para as organizações e os movimentos sociais", diz Beto Pereira, presidente da Organização Nacional de Cegos do Brasil (ONCB).

"Cada vez mais o Estado brasileiro vai tentar bater nessa tecla de deficiência leve, moderada ou grave, porque tem guarda-chuva curto, cobertor curto, cada vez mais pessoas estão no rol das pessoas com deficiência e cada vez mais o Estado vai vir com essa ameaça, com essa proposta. Então sempre que a gente ganha e avança em um aspecto social, como é da avaliação biopsicossocial, a gente corre riscos também, do outro lado, de pessoas ficarem fora desse processo de políticas públicas", alerta Pereira, que também atua como assessor de acessibilidade e inclusão da Associação Brasileira de Assistência à Pessoa com Deficiência Visual (Laramara).

A avaliação biopsicossocial da deficiência está prevista no artigo 2 da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (n° 13.146/2015) e ainda não foi regulamentada, mesmo com quase uma década de vigor da LBI no País.

Manter atenção - Para o presidente da Associação Nacional de Apoio às Pessoas com (ANAPcD), Abrão Dib, ao menos três pontos da lei sancionada precisam de atenção.

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"No capítulo 2 (alterações legislativas), o artigo 66-B determina que o 'planejamento anual das contratações do Programa ficará sujeito à disponibilidade orçamentária para o custeio', mas em outros programas, pagamentos foram suspensos por falta de orçamento. O 6º parágrafo estabelece que o 'Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) coletará informações que caracterizem a condição socioeconômica e territorial das famílias, as quais serão objeto de checagem em outras bases de dados', o que abre espaço para avaliações feitas de forma a não dar direitos às pessoas com deficiência, por profissionais sem qualificação. E o parágrafo 12-B diz que, 'na impossibilidade de registro biométrico do requerente, ele será obrigatório ao responsável legal', o que exige da uma mãe cuidadora deixar filho ou filha em casa para percorrer quilômetros e fazer o cadastro biométrico", afirma Dib.

BPC duplicado - Foi mantida, também no capítulo dois, a atualização de 2020 da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) que permite a concessão duplicada do BPC na mesma casa. "§ 3º-A. O cálculo da renda familiar considerará a soma dos rendimentos auferidos mensalmente pelos membros da família que vivam sob o mesmo teto, ressalvadas as hipóteses previstas no § 14 deste artigo, nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo federal, vedadas deduções não previstas em lei".

Para a advogada Flávia Marçal, integrante da Coalizão Nacional Inclusiva pelo Autismo (CONIA), há avanços em relação ao apresentado inicialmente pelo governo, mas fruto da reação das pessoas com deficiência.

"Essa luta foi uma grande mobilizadora de todas as pessoas com deficiência por essas modificações, um desafio muito grande, até porque compreender e ter conhecimento técnico em relação a todo esse procedimento legislativo não é fácil, é algo realmente muito complexo. Chamou muita atenção a rapidez com que se buscou votar isso e o quanto foi necessário uma relação de confiança ao invés de transparência, porque, por exemplo, nós tivemos dificuldade de ter acesso aos textos finais, principalmente no Senado, pela necessidade de uma rápida tramitação, o que prejudicou o debate amplo e a transparência. Esse debate se deu muito mais por uma pressão social e por uma mobilização intensa da comunidade do que pelo segmento correto dos ritos que seriam necessários, como audiências públicas, a publicação do texto e o debate desse texto público", diz a advogada.

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"Em que pese você ter uma série de legislações que garantam a acessibilidade e a comunicação facilitada, esses critérios não estão sendo atendidos. Há compromisso do próprio governo federal de ter uma comunicação facilitada, foi lançado um programa, mas isso não está sendo atendido por parte do próprio governo. A gente sabe que é uma mudança de cultura, mas aqui tem, de novo, a prova viva nessa legislação do quanto isso é complexo para as pessoas com deficiência conseguirem acessar", comenta Flávia Marçal.

Reforma Tributária - A advogada ressalta ainda que o acesso ao conteúdo completo da reforma tributária, no que diz respeito aos direitos das pessoas com deficiência, precisa ser garantido. "A principal falha é na busca de uma celeridade pela aprovação, deixando de lado da transparência, a publicidade, um princípio da administração pública. Isso tem prejudicado muito a atuação dos movimentos e gerado muito mais atrito".

Episódio 172 da coluna Vencer Limites no Jornal Eldorado da Rádio Eldorado: O pior presente de Natal do governo e do Congresso para o povo com deficiência

LEI Nº 15.077, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2024

Altera as Leis nºs 8.171, de 17 de janeiro de 1991 (Lei da Política Agrícola), 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), 14.601, de 19 de junho de 2023 (Lei do Programa Bolsa Família), e 14.995, de 10 de outubro de 2024, para dispor sobre políticas públicas; e dá outras providências.

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O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

Art. 1º É requisito obrigatório para concessão, manutenção e renovação de benefícios da seguridade social documento com cadastro biométrico realizado pelo poder público, nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo federal.

Parágrafo único. Nas localidades de difícil acesso, ou em razão de dificuldades de deslocamento do requerente, por motivo de idade avançada, estado de saúde ou outras situações excepcionais previstas em ato do Poder Executivo federal, não será exigido o documento de que trata o caput enquanto o poder público não fornecer condições para realização do cadastro biométrico, inclusive por meios tecnológicos ou atendimento itinerante.

Art. 2º Para os programas ou os benefícios federais de transferência de renda que utilizem o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), deverá ser observado o prazo máximo de 24 (vinte e quatro) meses de atualização cadastral, para fins de concessão ou manutenção do pagamento às famílias, nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo federal.

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§ 1º Ressalvado o disposto nos §§ 3º e 4º deste artigo e no art. 21-B da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), os órgãos responsáveis pela gestão dos programas ou dos benefícios de que trata o caput deverão notificar as famílias atendidas, com antecedência mínima de 90 (noventa) dias, prorrogáveis 1 (uma) vez, por igual período, antes da aplicação do disposto no § 5º deste artigo.

§2ºO estoque de cadastros desatualizados há 18 (dezoito) meses ou mais de famílias integrantes dos programas ou dos benefícios de que trata o caputdeste artigo será objeto de cronograma de atualização específico implementado a partir de 2025, nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo federal.

§ 3º Para fins de concessão ou manutenção dos benefícios de que trata o caput deste artigo a famílias compostas de 1 (uma) só pessoa ou a indivíduos que residem sem parentes, a inscrição ou a atualização do CadÚnico deverá ser feita no domicílio de residência da pessoa, conforme prazos e exceções estabelecidos em ato do Poder Executivo federal.

§ 4º Nas localidades de difícil acesso, ou em razão de dificuldades de deslocamento do requerente, por motivo de idade avançada, estado de saúde ou outras situações excepcionais previstas em ato do Poder Executivo federal, não será exigida a atualização de que trata o § 3º enquanto o poder público não fornecer condições para sua realização, inclusive por meios tecnológicos ou atendimento itinerante.

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§ 5º O não cumprimento do disposto neste artigo implicará a suspensão do benefício, desde que comprovada a ciência da notificação.

§ 6º O disposto neste artigo não afastará processos em curso de revisão cadastral em função do disposto na legislação vigente.

Art. 3º São as concessionárias de serviços públicos obrigadas a fornecer informações de bases de dados de que sejam detentoras, nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo federal, com a finalidade de aperfeiçoar o processo de verificação de requisitos para a concessão, a manutenção e a ampliação de benefícios da seguridade social, observada a legislação de proteção de dados.

Art. 4º Entre 2025 e 2030, o aumento real de que trata o § 4º do art. 3º da Lei nº 14.663, de 28 de agosto de 2023, não será inferior ao índice mínimo nem superior ao índice efetivamente apurado nos termos do art. 5º da Lei Complementar nº 200, de 30 de agosto de 2023 (Novo Arcabouço Fiscal).

CAPÍTULO II DAS ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS

Art. 5º A Lei nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991 (Lei da Política Agrícola), passa a vigorar acrescida do seguinte art. 66-B:

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"Art. 66-B. O planejamento anual das contratações do Programa ficará sujeito à disponibilidade orçamentária para o custeio de que trata o art. 60 desta Lei."

Art. 6º A Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 6º-F. ...

§ 6º O Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) coletará informações que caracterizem a condição socioeconômica e territorial das famílias, as quais serão objeto de checagem em outras bases de dados, nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo federal." (NR)

"Art. 20. ...

§ 2º-A. A concessão administrativa ou judicial do benefício de que trata este artigo a pessoa com deficiência fica sujeita a avaliação, nos termos de regulamento.

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§ 2º-B. (VETADO)...

§ 3º-A. O cálculo da renda familiar considerará a soma dos rendimentos auferidos mensalmente pelos membros da família que vivam sob o mesmo teto, ressalvadas as hipóteses previstas no § 14 deste artigo, nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo federal, vedadas deduções não previstas em lei.

...

§ 12-B. Na impossibilidade de registro biométrico do requerente, ele será obrigatório ao responsável legal. ..." (NR)

"Art. 21-B. Os beneficiários do benefício de prestação continuada, quando não estiverem inscritos no CadÚnico ou quando estiverem com o cadastro desatualizado há mais de 24 (vinte e quatro) meses, deverão regularizar a situação nos seguintes prazos, contados a partir da efetiva notificação bancária ou por outros canais de atendimento: ..." (NR)

"Art. 35. ...

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§ 1º ...

§ 2º Os órgãos federais disponibilizarão as informações constantes das bases de dados de que sejam detentores necessárias à verificação dos requisitos para concessão, manutenção e revisão do benefício de prestação continuada previsto no art. 20 desta Lei, nos termos de ato do Poder Executivo federal." (NR)

"Art. 40-B. Enquanto não estiver regulamentado o instrumento de avaliação de que tratam os §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a concessão do benefício de prestação continuada a pessoa com deficiência ficará sujeita à avaliação do grau da deficiência e do impedimento de que trata o § 2º do art. 20 desta Lei, composta de avaliação médica e avaliação social realizadas, respectivamente, pela perícia médica federal e pelo serviço social do INSS, com a utilização de instrumentos desenvolvidos especificamente para esse fim, e será obrigatório o registro, nos sistemas informacionais utilizados para a concessão do benefício, do código da Classificação Internacional de Doenças (CID), garantida a preservação do sigilo. ..." (NR)

Art. 7º A Lei nº 14.601, de 19 de junho de 2023 (Lei do Programa Bolsa Família), passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 6º ...

§ 4º (Revogado).

§ 5º Ato do Poder Executivo federal poderá alterar:

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I- o valor-limite de desligamento do Programa, observado o valor constante do § 1º deste artigo como máximo;

II- o prazo a que se refere o § 2º deste artigo, não podendo ser superior ao prazoprevisto no referido parágrafo." (NR)

"Art. 12-A. Os Municípios e o Distrito Federal, na atuação descentralizada da execução e da gestão do Programa Bolsa Família, deverão observar índice máximo de famílias compostas de 1 (uma) só pessoa inscritas no Programa, nos termos de ato do Poder Executivo federal."

Art. 8º O § 2º do art. 42 da Lei nº 14.995, de 10 de outubro de 2024, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 42. ...

§ 2º A linha de crédito poderá requerer garantia do FGO, de que trata a Lei nº 12.087, de 11 de novembro de 2009, bem como alienação fiduciária do veículo financiado..." (NR)

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CAPÍTULO III DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 9º

Revogam-se:

I - o parágrafo único do art. 20 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei Orgânica da Assistência Social);

II - (VETADO).

Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 27 de dezembro de 2024; 203° da Independência e 136° da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Presidência da República José Wellington Barroso de Araujo Dias

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DESPACHO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

MENSAGEM Nº 1.699, de 27 de dezembro de 2024.

Senhor Presidente do Senado Federal, Comunico a Vossa Excelência que, nos termos previstos no § 1º do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei nº 4.614, de 2024, que "Altera as Leis nºs 8.171, de 17 de janeiro de 1991 (Lei da Política Agrícola), 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), 14.601, de 19 de junho de 2023 (Lei do Programa Bolsa Família), e 14.995, de 10 de outubro de 2024, para dispor sobre políticas públicas; e dá outras providências.".

Ouvido, o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome manifestou-se pelo veto aos seguintes dispositivos do Projeto de Lei:

Art. 6º do Projeto de Lei, na parte em que altera o § 2º-B do art. 20 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993

"§ 2º-B. Para a concessão administrativa ou judicial do benefício de que trata este artigo, a avaliação a que se refere o § 2º-A deste artigo deve atestar deficiência de grau moderado ou grave, nos termos de regulamento."

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Razão do veto

"A proposição legislativa contraria o interesse público, uma vez que poderia trazer insegurança jurídica em relação à concessão de benefícios."

Inciso II do caput do art. 9º do Projeto de Lei

"II - o § 4º do art. 6º da Lei nº 14.601, de 19 de junho de 2023 (Lei do Programa Bolsa Família)."

Razão do veto

"A proposição legislativa contraria o interesse público, uma vez que poderia suscitar insegurança jurídica em relação às regras de elegibilidade para reingressar no Programa Bolsa Família."

Essas, Senhor Presidente, são as razões que me conduziram a vetar parcialmente o Projeto de Lei em causa, as quais submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.

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