A série documental 'O Caso Robinho', do Globoplay, estreou, mostrando relatos da vítima e evidências do crime de estupro.
A série documental "O Caso Robinho", do Globoplay, que aborda a investigação criminal que levou à condenação de Robinho a nove anos de prisão em regime fechado por estupro, estreou nesta quarta-feira, 30. No primeiro episódio, intitulado "Meu nome é Mercedes", a vítima, que autorizou o uso de seu nome, falou pela primeira vez sobre o estupro coletivo que sofreu.
Na época do crime, Mercedes tinha 23 anos, cursava Direito e sonhava em se tornar promotora pública. "Se eu tivesse que me descrever, diria que me sentia como uma música brasileira: cheia de ritmo, de alegria, de luz. Sempre digo que eu costumava ser cheia de cores, que foram se desbotando. Elas ficaram desbotadas durante muitos anos. Até que eu me recuperei. Não é como antes, mas, pois é. Eles obviamente roubaram uma parte importante de mim", afirmou ela.
"O tempo ajuda. O tempo é o melhor remédio", disse, chorando. "Mas ele não apaga. É uma coisa que está sempre com a gente."
Encontro com Robinho e amigos no Sio Café
Em 21 de janeiro de 2013, Mercedes decidiu comemorar seu aniversário com amigas na boate Sio Café, em Milão. Ela, que estava animada em comemorar o aniversário em um lugar que tocava música brasileira, combinou de encontrar Robinho e seus amigos no local.
"Nós conhecíamos alguns amigos do Robinho. Como eles vinham à Itália todo ano, nós combinamos de nos encontrar. Como eles iam para lá, nós também fomos", contou Mercedes. Rudney da Silva, um dos amigos de Robinho, também estava fazendo aniversário.
O documentário apresenta outros amigos de Robinho, como Clayton Santos, Alexandro da Silva, Fabio Galan, Ricardo Falco e Jairo Chagas, que também se reuniram no Sio Café para celebrar o aniversário de Rudney.
"Quando cheguei, fui tomar um drinque. Eu estava feliz. Então os rapazes chegaram, falamos com eles, e foi só isso. Nós não fomos ficar com eles, porque estavam acompanhados da mulher do Robinho. Eles mesmos disseram para não irmos por causa disso", relatou a vítima.
Por meio de um aplicativo de mensagens, Clayton sugeriu que Mercedes e suas amigas os procurassem quando a esposa de Robinho, Vivian, fosse embora. Depois disso, Mercedes e suas amigas se acomodaram em uma mesa próxima e ela chegou a dançar com Clayton.
O crime
Em certo momento, uma das amigas de Mercedes, Carla, avisou que iria embora com Francesca, deixando Mercedes sozinha. Após sair para tomar um ar, um dos homens, Alex, tentou beijá-la, mas ela recusou.
"Depois voltei para dentro, porque eu queria sentar, e fui parar naquela salinha. O que aconteceu depois é muito confuso. Ele tentou me beijar de novo ali. Acho que eu o empurrei. Eu estava sentada num banquinho, acho até que caí. Então, chegou o segurança para entender o que estava acontecendo, e o Alex disse que estava tudo bem, que era amigo do Robinho. Depois, só me lembro de estar no meio do ato sexual."
Mercedes contou que, no início, estavam apenas Alex e Robinho no local. "De resto, eu lembro muito vagamente que havia outras pessoas. Mas não lembro exatamente o que aconteceu. Eu nem tive força para reagir, para me mexer. Tanto que depois, quando me levaram para fora, tiveram que me ajudar e me segurar, porque eu não conseguia nem andar. Se eu estivesse consciente, é claro que os teria feito parar."
Ela foi colocada no carro de Ricardo Falco e não parava de chorar. Enquanto isso, enviava mensagens para Carla, sua amiga, tentando explicar onde estava. "Eu tentei explicar para a Carla onde eu estava, porque ela não estava entendendo bem. Até que ela me encontrou nesse estacionamento. Ela foi me buscar lá pelas 4h ou 5h, não lembro bem. Então eu disse: 'Carla, se aproveitaram de mim'. Ela perguntou quem, e eu respondi: 'Todos'."
A busca por justiça
No dia seguinte, Clayton entrou em contato com Mercedes, mas ela se recusou a falar com ele. "Eles não se sentiam responsáveis, se sentiram livres por vários meses", disse ela, que chegou a dizer a um deles que estava grávida para ver suas reações. "Eu entrei em contato com o Ricardo, porque era quem eu conhecia melhor. Eu pensei que ele não tinha participado, só testemunhado. Eu tentei falar com ele. Eu queria tentar entender o que tinha acontecido. Mas, na verdade, também queria tirar das costas o peso da culpa. Culpa porque eu tinha bebido, também porque não tive como reagir", relatou.
Depois de desabafar com um amigo, que a incentivou a procurar um advogado e denunciar o crime, Mercedes conheceu Jacopo Gnocchi, seu atual advogado. "Foi a primeira pessoa a ouvir a história depois do meu amigo. Eu precisava de alguém que pudesse me dar forças e o Jacopo fez isso", disse ela, que não se lembrava bem do ocorrido e chegou a se perguntar se tinha denunciado alguém que não fez nada.
"Talvez ela estivesse com medo, como acontece com muitas vítimas desse tipo de violência. Medo de que o que ela lembrava não fosse verdade, quase culpando a si mesmo ou pensando que talvez o que os outros diziam fosse verdade, e que foi uma relação consensual. O que acontece é que a vítima frequentemente muda a sua visão dos fatos, e é por isso que, pela lei italiana, você tem um prazo mais longo para denunciar esse tipo de crime", disse Jacopo no documentário.
Interceptações da polícia
Quase um ano após o crime, a polícia conseguiu autorização judicial para monitorar as conversas dos envolvidos e, como estratégia, começou a convocá-los para depoimentos. Ao saberem da investigação, poderiam falar por telefone sobre o que ocorreu naquele dia, fornecendo novas evidências.
Em janeiro de 2014, Jairo telefonou para Robinho após prestar depoimento e o alertou sobre a investigação. "Vou lá e vou falar: primeiro, o bagulho faz um ano; segundo, eu nem toquei nessa menina. Quem tocou nela está lá no Brasil. Vai atrás do pessoal que está lá no Brasil", disse Robinho sobre o que diria caso fosse chamado para depor.
Segundo o documentário, embora Jairo tentasse se proteger, ele sabia o que havia ocorrido na boate. "Aquilo é estupro o que aconteceu", disse ele em uma conversa telefônica com uma amiga.
"Acho que pessoas assim são minúsculas. Não são homens. Eles são tão ruins quanto quem estupra. Porque, se alguém viu, se é testemunha e sabe o que aconteceu, é igual aos outros", afirmou a vítima.
Ricardo Falco também foi chamado para depor. Após o interrogatório, interceptações registraram Falco dizendo que a polícia "caiu no papo" dele. Em uma conversa gravada, Jairo confirma que viu Robinho colocar seu órgão genital na boca da vítima. “Isso não é transar,” rebateu Robinho. Em uma das interceptações, os acusados sugeriram que sabiam da possibilidade de estarem sendo monitorados.
"Quando eu li o que eles disseram, as gravações, a minha vitória estava ali, naqueles momentos", afirmou Mercedes.
Crime de estupro
No Brasil, o artigo 213 do Código Penal classifica estupro como "constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso". A pena é de 6 a 10 anos de prisão, podendo chegar a 12 anos se a vítima tiver entre 14 e 18 anos de idade.
Em caso de violência contra a mulher, denuncie
Violência contra a mulher é crime, com pena de prisão prevista em lei. Ao presenciar qualquer episódio de agressão contra mulheres, denuncie. Você pode fazer isso por telefone (ligando 190 ou 180).Também pode procurar uma delegacia, normal ou especializada.
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