Desde que foi anunciado como técnico do Corinthians há uma semana, Cuca enfrentou uma onda de protestos de parte da torcida por uma condenação por atentado ao pudor com uso de violência contra uma menina de 13 anos na Suíça, em 1987. O treinador afirma ser inocente. A pressão provocou a saída de Cuca nesta quarta-feira, 26, e abriu uma discussão sobre a contratação de pessoas condenadas por violência doméstica e abuso sexual. Um projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados proíbe que a pessoa condenada assuma cargos públicos; vários municípios brasileiros adotam medidas semelhantes.
O Projeto de Lei 539/23 proíbe condenados por praticar violência contra a mulher de participar de concursos públicos e de exercer funções de confiança ou cargos em comissão na administração pública. A proposta está sendo analisada pela Câmara dos Deputados.
A medida altera o Código Penal. Atualmente, o código prevê especificamente a perda de cargo, função e mandato nos casos de condenação a penas de prisão por mais de um ano nos crimes contra a administração pública. Nos demais crimes, a medida deverá ser adotada apenas quando a pena for de no mínimo quatro anos de prisão.
Alguns estados e municípios já adotam iniciativas para impedir o ingresso de pessoas condenadas no serviço público. Em janeiro deste ano, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), sancionou a lei 17.910/2023, que proíbe a nomeação de pessoas condenadas com base na Lei Maria da Penha para cargos públicos. De acordo com a proposta, a medida vale para casos com condenação em decisão transitada em julgado e se extingue com o cumprimento integral da pena.
Em 2019, o Estado do Rio de Janeiro já havia sancionado legislação que proíbe a contratação de homens condenados. No ano seguinte, a cidade de Natal (RN) sancionou a Lei 7.015/2020 com o mesmo objetivo. Já a Câmara Municipal de Curitiba (PR) discute o tema desde fevereiro.
Criada para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, a Lei Maria da Penha não impede automaticamente que o agressor ocupe cargo, emprego ou função pública. As medidas protetivas de urgência são consideradas uma das principais contribuições introduzidas na norma para "garantir a proteção contra o risco iminente à integridade pessoal da mulher e familiares".
Especialistas ouvidos pelo Estadão apresentam posições distintas sobre o tema. Para Acácio Miranda, doutor em Direito Constitucional pelo IDP/DF, observa dois cenários. "A proibição é razoável durante o período da condenação e quando as funções a serem realizadas sejam incompatíveis com o tipo de condenação imposta. Mas, se cumprida a pena, se forem cumpridas as medidas de ressocialização e a atribuição a ser exercida não seja incompatível com o tipo de condenação, a medida seria inconstitucional", afirma.
Já o advogado Davi Tangerino, professor da UERJ, tem posicionamento contrário à medida. Como pretender que alguém se ressocialize se ele levará consigo para sempre a pecha de criminoso? Esse tipo de medida eterniza a pena e, no final do dia, coopera para o único papel social que reste ao condenado seja o de criminoso. Ao contrário de evitar novos crimes, a medida propicia a reincidência", diz.
Veja as cidades e estados onde condenados não podem assumir cargos públicos:
São Paulo (SP)
Natal (RN)
Curitiba (PR) (em tramitação na Câmara Municipal)
Rio de de Janeiro