Depoimento: “Sofri um ataque por causa do meu gênero, mas eu sobrevivi”

No Mês da Visibilidade Trans, Analuh faz questão de compartilhar a violência que vivenciou e conta como reagiu

31 jan 2023 - 11h11
(atualizado às 12h38)
Analuh investiu em formação e, hoje, é Head de Pessoas e Cultura
Analuh investiu em formação e, hoje, é Head de Pessoas e Cultura
Foto: Reprodução/Linkedin

Quem conversa com Analuh Luiz não imagina as cicatrizes que carrega. Aos 30 anos, ela é uma mulher trans reconhecida na sua área de atuação e com o objetivo profissional e pessoal de disseminar conhecimento sobre a comunidade LGBTQIA+. Head de Pessoas e Cultura e palestrante LGBTQIA+, Analuh encontrou nos estudos e na vontade de ingressar no mercado de trabalho o caminho para deixar o ataque violento que sofreu no passado. Ela ressalta ainda que está vivendo seu maior sonho: envelhecer. 

Leia seu depoimento:

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“Antes de falar deste dia, eu faço questão de compartilhar o meu primeiro sonho depois da minha transição: poder envelhecer, com cabelos brancos, e estar cercada de pessoas que amo, tomando um chá e comendo bolo. As pessoas mais próximas a mim já me ouviram falar sobre isso, sobre essas possibilidades que eu tanto quero que se concretizem. Eu acredito nas possibilidades.

Era janeiro de 2018 e eu estava esperando um ônibus na cidade onde morava na época, em Gravataí, no Rio Grande do Sul,  quando tive o infeliz encontro com um monstro. Eu já tinha transicionado e sabia que poderia sofrer alguns ataques por ser quem eu era, mas não imaginei o que viria a acontecer. Esse homem se aproximou e fez alguns xingamentos sobre meu gênero. Acabamos entrando em uma luta corporal. Quando eu finalmente consegui derrubá-lo no chão, me recordo do quanto fiquei preocupada com a possibilidade de tê-lo machucado e fui ajudá-lo a se erguer do chão. Cheguei a falar ‘acabou a briga’ para ele. Em momento algum passou pela minha cabeça que ele pudesse estar armado. 

Eu o puxei pegando em uma das suas mãos e, com a outra, ele me atingiu duas vezes na coxa. Ao tentar me esquivar, recebi outros dois ataques na panturrilha. No total, foram quatro facadas. Eu senti que ele queria me matar. 

Gravataí tem muitos quiosques, então é normal ter bastante gente nas ruas. Lembro de, ainda tonta e jogada no chão, ver algumas pessoas filmando o que estava acontecendo enquanto ele me ameaçava. Após alguns minutos, a polícia chegou no local. Até a chegada da polícia, foram os minutos mais angustiantes da minha vida. Aquela velha história de ver a vida passando diante dos nossos olhos é real. Eu senti frio e lembrei da primeira vez que me vi no espelho como a mulher Analuh e imaginei como seria realizar o meu sonho, que é ter o direito de envelhecer, como qualquer outra pessoa! Foi nisso que pensei.

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"Quando você está dentro de um recorte específico vulnerável da sociedade, sabe que pode sofrer violência", admite Analuh
Foto: Reprodução/Linkedin

Nessa vida, não podemos decidir tudo o que vai nos acontecer, mas podemos escolher como reagir a estas situações. Eu decidi continuar, afinal eu não sou o que me acontece! Depois do meu ataque, resolvi investir em educação e me inserir no mercado de trabalho. Foi a forma que encontrei de continuar e de melhorar a minha realidade. Eu queria fazer diferente. 

Quando você está dentro de um recorte específico vulnerável da sociedade, sabe que pode sofrer violência. Você até espera por esse dia. E eu fico muito aliviada de saber que ainda estou aqui. Mesmo sabendo que meu agressor não foi punido - ele prestou depoimento e foi liberado em seguida -, sei que tenho muito o que agradecer.

Essa data sempre será, para mim, meu renascimento, o dia em que sobrevivi. Apesar de algumas vezes ainda me pegar olhando as cicatrizes que ficaram, internas e externas, eu consigo sorrir e, cinco anos após este momento horrível, estou compartilhando com vocês a minha história. Eu vivo o sonho mais ousado de todos: viver!”

Fonte: Redação Nós
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