No último sábado, 6, a terceira edição do Women On Top 2023, maior encontro de lideranças femininas da América Latina, discutiu temas que impactam o mercado de trabalho feminino. Uma das discussões mais relevantes do evento foi sobre assédio, tanto moral quanto sexual. Essa violência tem como principal vítima as mulheres.
O painel “Assédio: é preciso de levantar para combater a violência que mais atinge mulheres” foi mediado por Lia Rizzo, curadora do WOT, e contou com a presença de Daniela Sagaz, head de diversidade e inclusão da Mondelez. Isabella Borges, advogada especializada em gênero e presidente do Instituto Survivor, e Laura Parkinson, diretora da L’Oréal Paris Brasil, também estiveram presentes.
No bate-papo, a mediadora compartilhou informações importantes: assédio é a violência de gênero que mais atinge as mulheres no mundo. Em 2022, quase metade das brasileiras sofreram algum tipo de assédio. Lia ainda pontuou que as mulheres negras são as mais sexualizadas, além de muitas delas não terem acesso à segurança e proteção.
Esse cenário preocupante reflete a cultura permissiva que existe no Brasil, que trata como piada situações de desrespeito e agressividade, dando espaço para o assédio mesmo que de forma implícita.
“Quando a gente olha por essa perspectiva de assédio, historicamente tem um ponto fundamental: toda a nossa história é contada por homens. Grande parte das decisões políticas ainda são tomadas por homens”, ressalta Daniela observando que são eles os donos das narrativas no ambiente corporativo.
Vítima
No painel, Daniela Sagaz ainda contou que, depois de 10 anos, consegue falar abertamente que ela mesma já foi vítima da violência. “Eu fui vítima, no meu espaço de trabalho, de assédio sexual e moral”, disse ela. A executiva contou que dividia a sala sozinha com essa pessoa.
“Uma das principais lembranças que tenho é que um dos primeiros sentimentos que tive foi de culpa. A culpa da minha vestimenta. Então, eu pensava: ‘se eu estou indo trabalhar de saia ou de vestido, eu não vou mais. Eu vou tentar mudar porque realmente estou provocando essa situação’”.
Se sentindo responsável pelo que aconteceu, a executiva contou que usava roupas do marido para ir trabalhar nesse lugar. “Demorou um tempo, que para mim foi eterno, mas foi praticamente um ano, até que foi tomada a decisão de desligamento dessa pessoa”, disse.
Daniela contou que não teve nenhum tipo de acolhimento quando sofreu o assédio. “Não se falava sobre este assunto, não tínhamos educação para, de fato, falar sobre assédio”, contou.
A convidada do WOT 2023 disse que as políticas de educação, treinamentos e letramento sobre assédio são levados muito a sério na empresa em que trabalha atualmente, com rodas de conversas sobre o assunto.
“Quando trabalhamos em ambientes que são majoritariamente ocupados por homens, a gente não tem que achar engraçada a piada que ele faz. Nós temos que saber nos posicionar, mas para isso é necessário falar. É necessário educar”, afirmou.
Segundo Laura Parkinson, diretora da L’Oréal Paris Brasil, marca que lançou a campanha global StandUp de combate ao assédio sexual nas ruas, o medo das empresas é abrir uma caixa de pandora. “Se eu abro esse assunto, eu tenho que saber lidar com ele porque as denúncias virão. A gente sabe que muitas empresas já recebem denúncias de coisas que acontecem nas empresas e até fora delas e elas não sabem o que fazer”, explicou Laura.
De acordo com Isabella Borges, advogada especializada em gênero, existe uma idealização do momento da denúncia: ou as pessoas acham que existe a “vítima perfeita”, que está preparada para fazer a denúncia, ou ela quer se “vingar” do ex-companheiro e destruir a vida dele.
“A verdade é que o momento da denúncia é traumático por si só porque a mulher vai chegar em uma delegacia de polícia não preparada para recebê-la, vai ouvir que certos fatos que está noticiando não são crimes e vai ser incentivada a ir embora para casa porque aquele escrivão de polícia não está a fim de abrir um boletim de ocorrência”, disse Isabella.
Todo esse descaso faz algumas vítimas voltarem para o ambiente violento do qual não conseguem sair. Por isso, é preciso que o assédio seja debatido em todas as esferas no ambiente corporativo. “Eu acho que quando a gente fala sobre essa perspectiva de educação, é de fato uma educação que crie ambientes de segurança psicológica, que crie ambientes de acolhimento”, ressaltou Daniela Sagaz.
“Durante a pandemia, quando vimos os índices de violência doméstica dispararem, principalmente, nossa empresa [Mondelez] sentiu a necessidade de criar um programa específico de acolhimento para mulheres que sofriam violência doméstica, e isso fez uma total diferença para elas", afirmou Daniela.