Arnóbio Henrique Cavalcante Melo, de 48 anos, foi condenado na madrugada desta terça-feira, 2, a 37 anos, dois meses e sete dias de prisão. A condenação ocorreu pelo assassinato da ex-companheira dele, Joana Mendes, de 34 anos, morta com 32 facadas, a maioria delas no rosto. As informações foram divulgadas pelo Ministério Público de Alagoas (MP-AL).
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De acordo com o MP-AL, o crime ocorreu em 2016, após a vítima deixar o filho mais novo na escola e ter ido ao encontro de Arnóbio, que conseguiu convencer a ex-companheira a conversar pessoalmente com ele, fingindo que estava disposto a assinar o divórcio e regulamentar a pensão do filho do casal.
Ainda de acordo com a denúncia, no dia que esfaqueou Joana, Arnóbio a abandonou no local. Ela morreu após ter sido golpeada com 32 facadas, sendo 30 delas no rosto, o que a deixou desfigurada. A mulher veio a óbito depois de sangrar por mais de 15 minutos. O laudo pericial apontou morte por choque hipovolêmico, que é quando alguém morre após perder uma grande quantidade de sangue.
Durante o julgamento, foram ouvidos cinco declarantes da acusação: Hudson Cavalcante – tio do réu, Danielle Paiva –melhor amiga de Joana, Wolfran Cerqueira – primo da vítima, Damiana Gouveia –empregada doméstica da família de Arnóbio, e Júlia Mendes, irmã de Joana. Já os declarantes da defesa foram todos dispensados.
Hudson, tio do réu, relatou que no dia do crime havia recebido uma ligação de Pedro, irmão de Arnóbio. Ele teria entrado em contato com Hudson para informar que o denunciante teria feito algo contra Joana, mas não sabia o que havia acontecido.
Segundo o tio, Pedro saiu para procurar Joana e encontrou seu carro parado em uma rua. Ele teria retornado à casa dos avós, onde se encontrou com Hudson. Os dois se dirigiram ao local onde estava o automóvel, acionando o Samu. “Eu sabia que era o carro dela, mas não sabia quem estava lá dentro”, detalhou.
Amiga relatou relacionamento abusivo
Em seguida, o promotor de Justiça ouviu Daniele Elizabete Franco, amiga de infância da vítima. Ela contou que logo após iniciar o relacionamento com o réu, Joana mudou os seus hábitos e comportamentos, agindo de forma mais contida. Daniele destacou que a vítima chegou a falar sobre sua insatisfação com a relação. “Ela disse que não aguentava mais e iria esperar o filho deles nascer para deixar o marido”, relatou.
Daniele disse que chegou a presenciar a forma agressiva como Arnóbio tratava a vítima. Ao subir ao apartamento do casal, antes de um passeio entre amigas, a testemunha ouviu o réu xingar a esposa e as suas amigas. “Ele disse que nós éramos vadias e que estávamos atrás de macho na rua”, relembrou Daniele.
Nesse momento, ela disse que sentiu vontade de entrar no apartamento para defender a amiga, mas se conteve. “Eu esperei a Joana sair. Ela desceu aos prantos, não parava de chorar e disse que não merecia isso”, afirmou. Além desse episódio, ela relatou que a vítima sempre aparecia com manchas roxas pelo corpo e dizia que tinha sido algum acidente doméstico.
Primo confirmou relação tóxica
Wolfran, prima da vítima, também acompanhou o relacionamento conturbado entre o casal. À Justiça, ele afirmou que, no segundo semestre de 2015, Antonio Jorge, pai de Joana, tinha-o convidado para ir até a residência de Joana e do marido para buscá-la, porque ela estaria decidida a sair de casa. Na época, a família cogitou fazer uma denúncia na Delegacia da Mulher, mas a ideia foi descartada por conta do filho do casal.
“Olhando para a criança, pensei: ‘Vamos esperar para ver se o assunto encerra’. Depois desse dia, no fim do ano, ele abordou Joana na orla de forma incisiva. Ela ligou para o meu tio e, aí, fomos à Delegacia da Mulher pedir medidas protetivas. E assim foi feito”, relatou Wolfran.
Tempo depois, ele conta que Joana havia entrado em contato com Arnóbio para oficializar a situação referente à guarda da criança, porque estava pensando em se mudar para o estado de Minas Gerais. De acordo com Wolfran, tudo indicava que a questão iria se resolver pacificamente. Joana, inclusive, havia informado a ele que iria se encontrar com a advogada do réu para assinar o acordo. Dois dias depois, ocorreu o assassinato.
“Percebi depois que minha prima tinha caído em uma cilada. Eu estava em casa quando, no começo da noite, recebi uma ligação do celular do meu tio. Fiquei preocupado. Era o enteado dele, que me disse: ‘Joana foi a óbito’. Na hora, só me veio na cabeça que ela tinha sido assassinada. Quando cheguei lá, deparei-me com a tragédia. Você tem ideia do que é ver uma criança que coloquei no braço esfaqueada?”, disse o primo emocionado.
Na sequência, foi ouvida Damiana Gouveia que, à época, trabalhava como empregada doméstica na casa da avô de Arnóbio. Foi ela quem achou a faca suja de sangue na garagem da residência da família do réu. “Eu passei pela garagem e vi uma caixa que me chamou atenção. Quando abri, a faca estava lá, completamente ensaguentada. De imediato, chamei um tio dele, que me mandou deixar o objeto lá e não mexer nele. Pouco tempo depois, chegou o Arnóbio com a mão sangrando”, disse ela.
Os interrogatórios foram encerrados com o depoimento de Júlia Mendes. Ela afirmou que o réu manipulava a irmã e praticava todos os tipos de violência contra Joana. “Ele é tão do mal que, para surpresa nossa, expulsou a Joana do apartamento que o meu pai pagava para eles morarem. Inclusive, botou a Joana pra fora de casa com o bebê no colo”, afirmou a irmã da vítima.
“Os pais, os filhos, as irmãs e todos os familiares e amigos, a partir de agora, vão poder fechar esse ciclo iniciado lá atrás, no dia 5 de outubro de 2016, quando Joana oi assassinada de forma brutal, sem qualquer oportunidade de se defender. O réu também foi sentenciado na qualificadora de feminicídio, que é o ódio contra a mulher. Ele era machista e misógino. Sabemos que a condenação não trará a alegria da Joana de volta, mas, ela, pelo menos, deixa a todos nós com o sentimento de que a lei foi cumprida e que o assassino recebeu a reprimenda merecida. Ele é um homem covarde, frio e um mentiroso contumaz”, afirmou o promotor de Justiça Antônio Vilas Boas, titular da 47ª Promotoria de Justiça da Capital.
Promotor apontou fraude processual
O promotor de Justiça também falou em fraude processual, alegando que o acusado teria apresentado aos autos dois relatórios psiquiátricos falsos, que sugeriam problemas mentais em Arnóbio.
O primeiro relatório, de 2022, foi questionado pela acusação, que pediu à Secretaria da Ressocialização e Inclusão Social de Alagoas (Seris) as imagens do dia em que, supostamente, o réu recebeu o psiquiatra e o livro de registros onde constam as assinaturas de quem entrou no presídio. Segundo a acusação, a Seris respondeu que o médico jamais esteve na Penitenciária Baldomero Cavalcanti.
“O segundo relatório, de 2023, foi apresentado numa data que jamais poderia ser verdadeira. O motivo é que, em julho do ano passado, o réu já estava solto, após um habeas corpus concedido pelo Superior Tribunal de Justiça. Ou seja, não haveria qualquer possibilidade do Arnóbio ter recebido o psiquiatra na cadeia, uma vez que ele estava em liberdade. Isso é fraude processual e vamos apurar ainda se houve corrupção ativa e passiva, já que um dos laudos têm a assinatura de duas policiais penais”, afirmou Vilas Boas.
Condenação
Depois de mais de 15 horas de júri, a sentença foi prolatada pelo juiz Yulli Rotter, titular da 7ª Vara Criminal da Capital. Arnóbio foi condenado a 37 anos, dois meses e sete dias de prisão, além de mais R$ 150 mil de indenização por danos morais.
“Não comemoro a prisão e nem a condenação de ninguém, mas, congratulo com a justiça e com a honra e memória de Joana Mendes”, afirmou o advogado e assistente de acusação Roberto Moura, que também é presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB Alagoas.
O Terra tenta contato com a defesa de Arnóbio. O espaço segue aberto para manifestações.