A 33ª Vara Federal do Rio de Janeiro suspendeu a aposentadoria de Alice Costa, terceiro-sargento da Marinha, aposentada por incapacidade por causa de transtornos mentais em 2023.
A 33ª Vara Federal do Rio de Janeiro determinou a suspensão de uma portaria da Marinha que reformava uma mulher trans. A terceiro-sargento Alice Costa foi aposentada da Marinha do Brasil por incapacidade com a justificativa de transtornos mentais no final do ano passado.
Alice sempre afirmou ter laudos que comprovam sua estabilidade mental e, por isso, declarou que a aposentadoria por incapacidade foi uma surpresa para ela. Em uma entrevista, a militar contou que tinha cinco laudos de médicos distintos que afirmam que ela está apta para trabalhar, mas o laudo emitido pela médica da Marinha, durante uma inspeção de saúde, a considerou inapta para o serviço.
A médica, inclusive, teria confirmado a estabilidade mental de Alice, mas argumentado que seu diagnóstico de Borderline não permitiria sua permanência na corporação.
"Sei que você está bem, curada da depressão, sem ansiedade. Só que Borderline não tem cura. Sou humana, não é nada pessoal com seu caso, mas esse ano fiz isso com outras pessoas com diagnóstico de crise de personalidade. Não seria justo você ter um tratamento diferente. Por isso, estou decidindo na incapacidade definitiva", teria dito a médica, segundo o Midia Max.
Na decisão que suspendeu a aposentadoria, a juíza Márcia Skardanas contrariou vários posicionamentos adotados pela Marinha nos últimos anos. A magistrada destacou que é preocupante a postura da Força Armada ao tratar a transexualidade como um transtorno, o que, segundo ela, acaba ampliando os preconceitos e o sofrimento das pessoas que buscam viver de acordo com sua verdadeira identidade.
"Recebo com surpresa que os afastamentos por transtorno mental só começaram a ocorrer após a concessão de tutela de urgência deferida, justamente no período em que a militar deveria estar vivenciando um maior sentimento de pertencimento e comemorando a vitória obtida", escreveu na decisão, segundo o jornal O Globo.
A Marinha ainda pode tentar revogar a liminar e, após a decisão final, recorrer à segunda instância da Justiça Federal para manter a aposentadoria de Alice. Atualmente, ela foi reintegrada ao quadro de pessoal e está em processo de reabilitação para o trabalho, conforme determinação da juíza.
Além da reincorporação, a defesa de Alice busca uma indenização de R$ 150 mil por danos morais, alegando que a terceiro-sargento sofreu discriminação. Também foi solicitado que o Ministério Público Federal acompanhe o caso e investigue uma possível prática de transfobia por parte de agentes da Marinha. Essas solicitações ainda serão avaliadas.
Identidade trans
Alice enfrentou diversas batalhas contra a corporação. Em 2022, ela venceu um processo contra a Marinha e conseguiu o direito de usar uniforme e corte de cabelo femininos, e também ter o seu nome social em uma plaqueta de identificação.
Na época, Valdeci do Santos, relator desembargador federal, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, afirmou que os direitos fundamentais de Alice foram violados quando ela foi forçada a adotar padrões masculinos pela Marinha, em Corumbá (MS).
"Ao analisar o presente caso, verifica-se que a autora busca tão somente o reconhecimento de sua identidade como mulher transgênero dentro do Estado brasileiro, o que lhe foi negado pela instituição estatal a qual exerce cargo/função", disse o desembargador na ocasião.