Luiz Gama: quem é o Patrono da abolição da escravidão do Brasil

Conheça a história do primeiro advogado negro do Brasil, líder da luta abolicionista e responsável por libertar mais de 500 escravizados

28 set 2023 - 05h00
Saiba mais sobre a história e a importância de Luiz Gama na luta abolicionista
Saiba mais sobre a história e a importância de Luiz Gama na luta abolicionista
Foto: Wikimedia Commons

A história da luta pela abolição da escravatura no Brasil é marcada por diversas figuras notáveis que dedicaram suas vidas na busca pela liberdade. Entre esses heróis, muitas vezes esquecidos pela história contada, está Luiz Gama, um homem que desafiou todas as adversidades da época e se tornou uma voz poderosa na luta pela emancipação dos escravizados.

Nascido em 1830, Luiz Gama enfrentou a dura realidade da escravidão. Mas apesar de todas as estatísticas e probabilidades, tornou-se um advogado renomado e um defensor incansável dos direitos humanos.

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Além de suas contribuições jurídicas, Gama também era um escritor talentoso, um dos maiores poetas da literatura brasileira. Usou a poesia para falar abertamente sobre a escravidão e promover o movimento abolicionista da época. 

Quem foi Luiz Gama?

Luiz Gonzaga Pinto da Gama foi um advogado, poeta e jornalista nascido em Salvador, na Bahia, em 1830. Ele era filho de Luíza Mahin, africana livre, e de um homem branco português de uma das famílias mais ricas da época.

Sua mãe, uma das maiores referências do movimento negro, foi figura importante nas maiores revoltas de escravizados no Brasil, como a Revolta dos Malês e a Sabinada, e por esse motivo, precisou fugir da Bahia de Todos os Santos. 

O pai, com o intuito de sanar algumas dívidas de jogo, decidiu vendê-lo como um escravo aos 10 anos de idade para o negociante Antônio Pereira Cardoso. Assim, foi levado para o Rio de Janeiro e, em seguida, passou por diversas cidades de São Paulo. Luiz Gama foi separado de sua família e sofreu as crueldades da escravidão. 

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No entanto, sua determinação e vontade de construir uma nova história eram maiores do que isso. Em 1847, aos 17 anos, conseguiu ser alfabetizado pelo estudante Antônio Rodrigues de Araujo, algo muito diferente da realidade dos jovens escravizados. Um ano depois, fugiu para São Paulo.

Luiz Gama começou a frequentar o Curso de Direito do Largo do São Francisco, atual Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Por ser um homem negro, enfrentou a repressão de professores e alunos que não o queriam naquele espaço.

Gama persistiu como ouvinte nas aulas e adquiriu o conhecimento necessário para atuar na defesa de negros e negras escravizadas. Habilidade essa que fez toda a diferença na luta pelo fim da escravidão.

Já na década de 1860, mostrou-se um grande jornalista, publicando vários de seus escritos em periódicos progressistas. Ao analisar a história do Brasil, o abolicionista foi um dos poucos intelectuais negros a ter seu nome e sua trajetória reconhecidos publicamente.

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Criou, junto do caricaturista Angelo Agostini, o primeiro jornal ilustrado humorístico de São Paulo, chamado “O Diabo Coxo”. Nas edições do jornal, era comum acompanhar as denúncias em tom de ironia.

A literatura foi outra área de grande destaque em sua vida. Hoje é conhecido como um dos maiores nomes da segunda geração do Romantismo, a partir dos seus poemas que questionavam a aristocracia e a marginalização de pessoas como ele. Mas, na época, não conseguiu o destaque merecido devido ao racismo e à desigualdade social.

Como Luiz Gama contribuiu para a abolição?

Luiz Gama é considerado o maior abolicionista do Brasil. Com o conhecimento que adquiriu no curso de Direito, esteve engajado nos movimentos contra a escravidão e a favor da liberdade da população negra, tornando-se líder da Mocidade Abolicionista e Republicana. 

Inclusive, sua liberdade também foi conquistada a partir das suas habilidades jurídicas. Conseguiu provar, no tribunal, que a sua condição de escravizado era ilegal. Mas ele não se contentou em apenas conquistar a sua própria liberdade. 

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Ao longo de sua carreira como jurista, utilizou uma oratória impecável e conseguiu libertar, legalmente, mais de 500 escravizados e escravizadas. Seja através da compra de cartas de alforrias ou pelo conhecimento na legislação escravista, Luiz Gama conseguiu alcançar um feito até então nunca visto.

Com isso, se tornou o “advogado das causas da liberdade” e se aproximou de nomes importantes da sociedade, como juristas e jornalistas, por exemplo. Ao longo dos anos, construiu uma extensa rede de apoio que participou ativamente, seja de forma jurídica ou financeira, das alforrias.

O primeiro advogado negro da história

Devido ao racismo e à desigualdade social, Luiz Gama não conseguiu receber o diploma do curso de Direito. Mas isso não o impediu de exercer a vida jurídica e dar início ao maior movimento abolicionista da história.

A condição de Luiz Gama era de rábula, ou seja, conquistou o direito para exercer a profissão de advogado sem necessariamente concluir os estudos superiores. O próprio abolicionista dizia: “Eu advogo de graça, por dedicação sincera à causa dos desgraçados; não pretendo lucros, não temo represálias”. 

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Sua dedicação o levou a se tornar um autodidata no campo legal. Estudou livros jurídicos e jurisprudência, foi ouvinte do curso de Direito e criou laços com figuras importantes da época. Tudo isso fez dele o primeiro advogado negro do Brasil. Como o primeiro negro a alcançar este feito, ele abriu portas para futuras gerações.

A literatura como ferramenta emancipatória

Luiz Gama não apenas se destacou como um advogado abolicionista, mas também usou sua habilidade literária para promover o movimento político. Ele escreveu inúmeros poemas, artigos e discursos que retratavam vividamente a crueldade da escravidão e a necessidade urgente da abolição em terras brasileiras.

Sua escrita incisiva denunciava a realidade da época e fez com que a adesão ao movimento abolicionista se tornasse ainda maior. Sua abordagem e suas habilidades ajudaram a desmascarar a elite escravocrata e fez dele uma figura temida pelos defensores da escravidão.

Essa literatura abolicionista teve um impacto duradouro na sociedade brasileira. Suas palavras ressoavam com pessoas de todas as classes sociais e raças, despertando a consciência necessária para se unir à luta abolicionista. Além disso, Luiz Gama influenciou muitos outros escritores, ajudando a criar um movimento mais amplo pela liberdade.

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Em suas obras é possível entender o contexto e as denúncias realizadas. Poemas como “Quem sou eu?” e “Minha mãe” narram a realidade do abolicionista em suas frases e as aflições que o cercavam.

O primeiro poema foi escrito por Gama para satirizar as críticas que recebia por ser um homem negro nessa posição:

“Hão de chamar-me Tarelo,

Bode, negro, Mongibelo;

Porém eu que não me abalo,

Vou tangendo o meu badalo

Com repique impertinente,

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Pondo a trote muita gente.

Se negro sou, ou sou bode

Pouco importa. O que isto pode?”

O primeiro livro com os escritos de Luiz Gama foi publicado em 1859, 12 anos após ele conseguir se alfabetizar. No meio da geração romântica, os poemas do abolicionista eram carregados de ironia e denúncias. Também escreveu sobre a aceitação de sua identidade étnica, mostrando o orgulho e a força de ser um homem negro.

Até os dias atuais, o poeta é sinônimo de inspiração para quem luta contra a injustiça e defende os direitos humanos. Sua obra lembra a importância de usar a escrita e a voz para combater a opressão, deixando-nos um exemplo duradouro de coragem e comprometimento com a causa da liberdade. 

Uma família de luta

Como já dito, a mãe de Luiz Gama foi uma importante voz das lutas abolicionistas na região nordeste do país. Luiza Mahin é lembrada até hoje como uma forte articuladora dos levantes realizados pelos escravizados e abolicionistas. Como quituteira na cidade de Salvador, vendia seus produtos e, ao mesmo tempo, trocava bilhetes com recados sobre a Revolta dos Malês, que ocorreu em 1835.

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Assim como a mãe, Luiz Gama foi um grande revolucionário e abolicionista. Mas também construiu sua família e teve o seu legado passado de geração. O poeta conseguiu um emprego na Secretaria de Segurança Pública e logo em seguida, no ano de 1858, casou-se com Claudina Fortunato Sampaio, com quem teve um filho, Benedito Graco Pinto da Gama.

O filho nasceu na cidade de São Paulo, ainda durante o período da escravidão. Desde jovem, Benedito foi imerso nas ideias progressistas de seu pai e acompanhou grandes movimentos na luta pela abolição da escravidão. Assim como o pai, ele também foi um grande líder, estando a frente da Revolta de São Paulo, movimento armado contra o Governo Federal que teve um forte impacto na política brasileira e influenciou a Constituição de 1934.

O legado que Luiz Gama deixou

Infelizmente, Luiz Gama não viveu para ver a abolição da escravidão, que ocorreu em 1888, cinco anos após sua morte. No entanto, sem o seu trabalho, a conhecida Lei Áurea não teria sido assinada e o Brasil não teria dado o primeiro passo rumo à liberdade.

Ele inspirou gerações de abolicionistas, cobrou mudanças, revisou leis e mostrou que a escravidão era um sistema cruel e ilegal. A história do pequeno menino negro, vendido pelo próprio pai como escravizado e que se tornou um dos maiores nomes da abolição se mantém viva até hoje.

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Gama também é um nome fundamental para o Movimento Negro no Brasil porque sua vida e trabalho foram entregues à luta incansável pela liberdade, igualdade e justiça. Seu papel como advogado dos escravizados e defensor dos direitos humanos faz parte da construção do Brasil.

Além disso, foram muitos os ensinamentos deixados pelo poeta. Luiz Gama acreditava que a educação era uma ferramenta poderosa para a libertação e foi por isso que usou de todo o seu conhecimento para libertar outras pessoas. Seu exemplo fez com que jovens negros da época buscassem sua liberdade através do estudo.

Instituto Luiz Gama

Reconhecer o legado e a importância de um homem negro, completamente à frente do seu tempo e que deixou marcas profundas na construção da história do Brasil é necessário. Hoje em dia, é comum ver coletivos universitários e organizações políticas que carregam o nome de Luiz Gama e acreditam nos propósitos deixados por ele.

O Instituto Luiz Gama (ILG) é um exemplo disso. Atua como uma associação civil sem fins lucrativos, formada por juristas, acadêmicos e militantes de movimentos sociais com foco na luta contra o racismo estrutural e a favor das minorias e dos direitos humanos.

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Esse órgão é responsável por realizar pesquisas, organizar eventos, palestras e encontros nacionais, realizar treinamentos e capacitações, seja de forma técnica ou política, além de assessorias jurídicas aos movimentos sociais e comunidades periféricas.

Seu presidente é o atual Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Sílvio Luiz de Almeida, renomado advogado e professor jurista brasileiro. O instituto leva o nome dele como forma de honrar o seu legado e continuar o seu trabalho utilizando o conhecimento jurídico como ferramenta. Além de preservar a memória do abolicionista, possibilita que a luta pela igualdade racial e no combate ao racismo se perpetue. 

Esse trabalho impacta diretamente na conscientização sobre as questões raciais, além de oferecer uma justiça gratuita a quem enfrenta a discriminação racial na pele.

Acesse o site do Instituto Luiz Gama para saber mais sobre a atuação e participar das ações promovidas.

Para quem deseja conhecer mais a fundo sobre a história e a trajetória do abolicionista, assistir ao filme Doutor Gama pode ser uma boa opção. Dirigido por Jeferson De e roteiro de Luiz Antônio, o filme narra a biografia de Luiz Gama e mostra quais foram os passos dados por um dos maiores nomes da história do Brasil.

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Fonte: Redação Nós
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