A poucos meses das eleições, que ocorrem em outubro, a defesa da região amazônica contra práticas ilegais desponta como o assunto que deve estar incluso nos planos de governo dos candidatos à presidência, de acordo com a segunda pesquisa encomendada pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS) ao PoderData. Segundo o levantamento, 81% dos eleitores, oito entre dez, apontam que os candidatos a presidente devem pensar em medidas para combater os crimes na Amazônia.
"A violência física produzida pela marginalidade penetra na Amazônia com bandos armados para assaltar barcos e eventos turísticos, corriqueiramente. A invasão de terras protegidas por lei ambiental também é corriqueira, assim como as agressões aos territórios indígenas para práticas econômicas criminosas; o crime organizado também amplia suas redes", comenta a doutora em Ciências Sociais pela Unicamp Marilene Corrêa.
Também coordenadora do Laboratório de Estudos Interdisciplinares da Amazônia na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Marilene conta que as preocupações com a proteção da região têm aumentado em todos os níveis: em relação à violência individual e coletiva urbana, à problemática ambiental e ao crescimento de uma economia ilegal de extrativismo da floresta, em relação aos descasos visíveis com a proteção de pessoas, comunidades interioranas e ribeirinhas.
Além disso, a situação de crise, desemprego, custo de vida, e aumento da pobreza amplia a falta de assistência e precarização de instituições que executam políticas públicas, especialmente de educação, saúde e segurança.
A pesquisa do PoderData também identificou que a preservação da floresta amazônica aparece como o assunto que deve ser uma das prioridades dos candidatos, já que 81% dos entrevistados consideram que essa preservação deve estar entre os focos de atuação dos candidatos. No levantamento anterior, realizado em junho, o índice era de 76%. Entre os jovens de 16 a 24 anos, os números atuais chegam a 90%.
Além das mortes do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, as respostas da pesquisa também surgem em um contexto em que a Amazônia Legal, que é composta por nove estados brasileiros, tem uma taxa de violência letal 38% maior do que a média do restante do país. Os dados são do mais recente relatório do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que revela como a Região Amazônica tem 13 das 30 cidades mais violentas do Brasil.
Para 65% dos respondentes, o governo federal não está trabalhando para combater crimes como grilagem, tráfico de drogas e exploração ilegal de madeira na região sendo que 17% não concordam com a afirmação e 18% não souberam responder. Entre os entrevistados da região Norte, a percepção de falta de atuação do governo no combate aos crimes chega a 69%.
O tráfico de drogas foi apontado por 39% dos eleitores como o crime que mais prejudica a floresta e suas populações. Em seguida aparecem a grilagem de terras, com 17%, e o garimpo ilegal, com 13%. A corrupção (9%), a exploração ilegal de madeira (8%) e o tráfico de animais (4%) também foram destacados.
Marilene Corrêa conta que o impacto da ação do narcotráfico na capital e no interior é responsável pelos dados exorbitantes de criminalidade.
"Como mortes violentas de jovens, execuções públicas entre bandos de traficantes, roubos e mortes para manter o vício e a ausência de uma efetiva política de assistência aos dependentes de drogas e aos adolescentes recrutados para o crime organizado em todos os municípios do Amazonas, por exemplo", explica.
De acordo com o sociólogo Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os estudos sobre crimes ambientais e facções criminais na Amazônia têm demonstrado que a região foi dominada por grupos armados que hoje administram toda uma rede de criminalidade e violência.
"Qualquer plano de governo para a Amazônia precisa dizer o que pretende fazer para combater o crime organizado e enfraquecer a cadeia que hoje sobrepõe crimes ambientais, homicídios e violências. É preciso reforçar os mecanismos formais de integração das forças de segurança e fazer isso de forma transparente e orientada para a garantia da cidadania das pessoas que residem na região", comenta o sociólogo.
A pesquisa realizada pelo PoderData entrevistou três mil eleitores de todo o país com idades acima de 16 anos entre os dias 28 e 30 de julho deste ano. Participaram pessoas de 312 municípios das 27 unidades da Federação. Mulheres correspondem a 53% das respondentes e 56% das pessoas recebem até dois salários mínimos. A margem de erro é de 2 pontos percentuais e o intervalo de confiança é de 95%.
Avaliação negativa de atuação do governo federal
Entre outros dados destacados na pesquisa, a maior parcela dos eleitores (49%) considerou ruim ou péssima a atuação do governo federal na proteção da Floresta, contra os 48% da pesquisa anterior, sendo que entre as populações preta, parda e indígena essa porcentagem chega a 49%, 51% e 47%, respectivamente.
O índice dos que consideram essa atuação ótima ou boa caiu de 19% para 15%. Na Região Norte, o governo tem o menor índice de ótimo e bom na proteção da floresta, apenas 7%, e o maior índice de ruim e péssimo: 45%.
"Na medida em que o governo não atua para desmontar e enfraquecer a economia do crime que lucra com a destruição da floresta e com a exploração da população, é esperado que muitos sintam-se reféns do medo e critiquem as políticas públicas e a ação governamental", pontua o diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Sobre a consulta que relaciona a preservação da floresta e a questão da fome no Brasil, 62% acham que a proteção da Amazônia pode ter um impacto positivo no combate à fome, sendo que entre as populações preta, parda e indígena essa porcentagem chega a 60%, 62% e 56%, respectivamente. Somente 15% considera que a proteção impacta negativamente a questão da fome.
A maioria dos entrevistados (65%) considerou que a proteção da Amazônia é importante para o desenvolvimento econômico do Brasil, contra 19% que não a consideram importante. Entre pensamentos sobre a floresta apresentados aos eleitores, o mais votado, por 64%, diz que "o desenvolvimento do Brasil depende da proteção da Amazônia".
"Todos sabem que pecuária, garimpo, soja, contaminação dos rios, tudo isso agride e não se torna fonte de desenvolvimento. Após tantas frustrações, a proteção da Floresta precisa se impor à agenda do desenvolvimento, com aproveitamento inteligente dos recursos naturais", comenta a doutora em Ciências Sociais pela Unicamp Marilene Corrêa, segundo informação do iCS.
Três em cada quatro eleitores acreditam que preservação da Amazônia deve ser prioridade