“Eu sou lésbica e essa é uma descoberta recente”, revelou Bel Moreira ao falar um pouco sobre si mesma. A atriz, que trilha seu caminho no mundo artístico desde criança, ainda está se descobrindo e guarda sonhos para concretizar em um futuro bem desenhado, como fazer uma faculdade de música e escrever e dirigir roteiros de cinema.
“Muitos sonhos que eu tinha se perderam, mas os reencontrei recentemente. Um lugar onde artistas e esportistas possam aprimorar suas técnicas e aprenderem a se proteger de um mercado que é capaz de te devorar - esse sim é meu maior sonho. Uma casa, com filhos, cachorros e minha esposa ao meu lado”, contou em entrevista ao Terra NÓS.
O Rei do Rock
Até o dia 19 de maio, Bel dá vida à personagem Priscilla Presley no musical “O Rei do Rock”, em cartaz em São Paulo. Para viver Priscilla, ex-mulher de Elvis Presley, Bel usou o livro de memórias “Elvis e Eu”, escrito pela própria Priscilla, como seu ponto de referência. Na obra, descobriu registros de momentos felizes que serviram para sua caracterização, mas ela ressalta que uma parte importante do processo foi não se comparar.
“Busquei não assistir nenhuma atriz interpretando Priscilla pra não me perder do que queria fazer. Durante a peça, ela vai de adolescente a adulta, de menina a mulher. Entender isso através das fotos e vídeos, para além da própria biografia dela, foi essencial. Acho que a característica que eu mais busquei foi o olhar dela e a forma de se movimentar”, destacou.
O jeito que Priscilla se move é a maior dificuldade de Bel, mas, para a atriz, a graciosidade e os movimentos contidos da ex-mulher do Rei do Rock podem ser difíceis de enxergar tão sutilmente no teatro. “Por isso, de um tempo pra cá, tenho me permitido sair um pouco do que ela originalmente é e criando algo que simule isso. É isso que eu mais amo no teatro! Nada é para sempre, não fica gravado de uma única forma. Todos os dias a peça muda, cresce e se desenvolve”.
“Eu tenho o costume de imitar as pessoas por pura diversão. E tive uma fase da minha adolescência em que eu era obcecada por personalidades femininas dos anos 1950/1960 - um beijo para neurodivergência e seus hiperfocos. Então, ter o prazer de fazer isso em cena foi maravilhoso”, expressou Bel, que tem TDAH.
Bel fez o seu primeiro musical há 15 anos, mas a jovem que antes estava afastada dos palcos voltou, e o sentimento era como se fosse a primeira vez. Em “O Rei do Rock”, primeiramente interpretou Dixie, a primeira namorada de Elvis, e, no segundo ato, ficou responsável por Priscilla.
“Voltar para os musicais foi como recomeçar. Eu cresci sonhando com o dia que teria uma personagem com solos e tudo. Confesso que foi muito difícil em alguns momentos porque Priscilla é minha primeira personagem que realmente é uma mulher adulta. Eu ainda me sinto tão menina, por isso descobrir esse meu lado mulher foi o mais especial. Essas personagens foram um presente imenso”, contou.
Trajetória
A trajetória de Bel Moreira começou ainda em Curitiba, no Paraná, lugar onde nasceu e entrou para o Coral Curumim, que aponta ser um dos momentos mais importantes de seu caminho na arte. Diagnosticada com TDAH aos sete anos, a atriz encontrou na música, no teatro e na dança o seu refúgio.
Para a atriz, sua vida começou quando se apaixonou por musicais. “Meu primeiro e-mail era Bella-Christine por conta da personagem de 'O Fantasma Da Ópera'. No meu primeiro teste, cantei aquela música de nome gigantesco de Mary Poppins. Quando passei em 'A Noviça Rebelde', já conhecia todas as músicas graças ao filme da Julie Andrews. E, por incrível que pareça, tudo isso começou porque eu fiquei fissurada em High School Musical”, revela Bel.
No entanto, foi o esforço da atriz para não repetir de ano na escola e o fato de ter sido excluída por achar o abecedário difícil que convenceu Rejane, mãe de Bel, a levá-la para as audições de “A Noviça Rebelde”, em São Paulo.
“Há males - e traumas - que vêm para o bem. Foi ali, na estreia de 'A Noviça Rebelde', que entendi que minha vida nunca mais seria a mesma, não se dependesse de mim”.
Todo o tempo livre de Bel era voltado para apreciar a Broadway e musicais brasileiros dos anos 1960 e 1970. Em 2015, ela foi escalada para o longa-metragem “É Fada”, produzido por Daniel Filho, superando as críticas sobre sua forma de cantar e mostrando que uma artista está sempre estudando e se reinventando.
“O que eu precisava era estudar outras formas de cantar. Isso mudou tudo! Eu já conhecia meu corpo o suficiente pra saber quando estava me machucando, quando estava gritando ao invés de beltar e por aí vai. Foi quando começou um laboratório que eu sei que nunca vai chegar ao fim na minha vida: as mil e uma formas de usar a voz”, ressalta.
O aprendizado de enxergar maneiras de cantar mudou tanto a vida de Bel que as escalas indianas são suas atuais obsessões, um assunto que ela poderia falar por horas - e agradece Daniel Filho por isso. “Ele me tornou uma cantora muito mais atenta, que se desafia e é incapaz de se sentir satisfeita, da melhor forma possível”, disse.
Com uma longa carreira artística, Bel Moreira ainda coleciona trabalhos como “Eu Fico Loko”, “As Aventuras de Poliana” e “Meu Namorado é uma Namorada” em seu currículo.
Sexualidade
No começo do ano de 2022, Bel Moreira se assumiu bissexual e foi abraçada pela comunidade LGBTQIA+. “Recebi um apoio imenso. Tanto da comunidade, quanto de grupos e pessoas que eu não esperava”, revelou ao Terra NÓS.
Mas, atualmente, a jovem atriz se vê de uma forma diferente. “Me permitir me descobrir lésbica foi a melhor e mais libertadora experiência da minha vida. A cada dia que passa, sou mais feliz e completa”.
Com a recente descoberta, Bel não sabe como as pessoas vão reagir e interpretar essa informação, mas espera que isso não repercuta negativamente para a comunidade bissexual. “Se as pessoas, por exemplo, começarem a me usar para dizer que a bissexualidade é uma fase. Não é uma fase e jamais foi. Eu não decidi ser algo ou não, eu simplesmente percebi que o que eu vivi foi heterossexualidade compulsória”, afirma.
O termo usado por ela, heterossexualidade compulsória, refere-se à pressão social e cultural que induz as pessoas a adotarem a orientação heterossexual, mesmo que não se identifique. Isso ocorre devido às expectativas sociais predominantes que valorizam e privilegiam a heterossexualidade.
“Vivemos em uma sociedade onde tudo gira em torno de relações héteros e, principalmente, de homens cisgênero. Por isso, muitas mulheres lésbicas demoram para se descobrir, assim como eu”, destacou Bel.
Há mais de dois anos em um relacionamento com a criadora de conteúdo Halana Lacerda, Bel a conheceu pelo Instagram, se apaixonando à primeira vista.
“Um vídeo dela viralizou e apareceu no meu explorar. Me apaixonei na hora! Ela era tão linda, engraçada e estilosa. Eu a segui primeiro, começamos a conversar e, após várias gafes cometidas por mim, que não nasci com talento para o flerte, logo estávamos dizendo 'eu te amo'”, conta.
Bel e Halana iniciaram um relacionamento três dias após se encontrarem pessoalmente pela primeira vez. Namoraram à distância por um ano e meio, logo aumentando gradualmente a frequência dos encontros. O grande passo da relação aconteceu em julho de 2023, quando a atriz ficou noiva.
“Ela me pediu em casamento e chorei tanto que quase não consegui dizer 'sim'. No início de 2024, juntamos as escovas de vez. Enfim, um conto de fadas sapatão. Ela é tudo para mim. A vida é muito mais colorida e divertida quando estamos juntas. Tive muita sorte de encontrá-la”, ressalta.
Para Bel, encontrar-se e se entender demanda tempo, mas poder contar com uma rede de apoio faz toda a diferença na jornada da descoberta da sexualidade.
“É muito bom ter pessoas que te aceitam independente de qualquer coisa ao seu lado. Se cuide, se preserve, mas não deixe que se aproveitem de você. Acima de tudo, cuide de você. Você merece viver, ser feliz e receber todo afeto do mundo”, concluiu.