Câmeras de segurança do prédio onde morava a advogada Carolina Magalhães ajudaram a solucionar sua morte, ocorrida em julho de 2022. Inicialmente, o caso foi tratado como suicídio. No entanto, a Polícia Civil concluiu que, na verdade, ela foi jogada do 8º andar pelo namorado, o também advogado Raul Rodrigues Costa Lages, indiciado por homicídio triplamente qualificado. A defesa dele nega.
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De acordo com o Fantástico, a queda de Carolina ocorreu às 23h10, em 8 de julho daquele ano, em Belo Horizonte, Minas Gerais. O namorado foi a última pessoa a vê-la com vida. A versão contada por ele e aceita pela Polícia Militar no dia do crime é a de que ele estava no elevador quando ouviu um barulho alto, que seria da queda.
No entanto, essa versão não convenceu a família e amigos da vítima. "A gente não teve dúvida alguma de que não se tratava de um suicídio", diz o filho dela, Lucas Magalhães. No dia seguinte, o irmão dela, o advogado Demian Magalhães passou a recolher provas que levassem à solução do caso. Ele conseguiu a filmagem que desbanca a narração de Raul.
"Na noite do crime, a polícia não foi até a portaria onde fica a tela com o gravador das câmeras para pedir acesso. No dia seguinte do falecimento dela, eu pedi o acesso e essa foi a primeira vez que a gente viu a sequência dos fatos e viu que a versão que ele tinha apresentado, inclusive registrado no boletim de ocorrência de que ele teria ouvido um barulho muito alto de dentro do elevador, que teria sido o barulho do corpo dela ao solo, não batia com a realidade", afirma.
Cronologia
No dia de sua morte, às 19h31, Carol e Raul entram no elevador do prédio. Uma hora depois, o namorado da vítima desce de bermuda e camiseta para pegar a comida e volta para o apartamento 5 minutos depois. Às 21h11, os dois filhos dela deixam o imóvel para ir assistir a um jogo de futebol em um bar próximo.
Duas horas depois, às 23h10, é possível ver o sensor da câmera da área de lazer do prédio acender. Em apenas um minuto, o porteiro vai até o local e se aflige ao ver o corpo no chão. Às 23h14, quando Carolina já estava morta, o elevador estava parado na portaria e é acionado para 8º andar.
Raul entra no equipamento usando um terno, enquanto carrega uma mochila nas costas e duas sacolas, aparentemente pesadas, nas mãos. Ele segue em direção à portaria, mas encontra o porteiro desorientado, que o leva até o local onde o corpo está caído.
Depois disso, ele sai do prédio falando ao celular e coloca a sacola no porta-malas do carro, e arranca com o veículo. Uma ambulância chega e, nesse momento, conforme aponta o Fantástico, ele estaciona seu carro e volta ao prédio.
A Polícia aponta que ele teve tempo suficiente para esconder o cenário de violência no imóvel, pois trocou a roupa de cama e passou um pano para limpar as manchas de sangue no local. Em seguida, ele colocou tudo para lavar. Foi então que recolheu todas as suas roupas que estavam lá e ainda pegou o pedaço da tela de proteção que cortou, jogou no lixo da cozinha e guardou a tesoura em uma gaveta.
Conforme a investigação, a tela foi “caprichosamente cortada”, numa posição redonda ovalada o suficiente para passagem de “um corpo inerte rolado sobre o guarda-corpo".
Vizinhos ouviram uma briga e barulhos
Ao que tudo indica, Carolina foi agredida antes de ser jogada da janela da sala de seu apartamento. Uma vizinha confirmou à polícia que ouviu passos rápidos vindos do apartamento da advogada, seguidos de um barulho muito forte no chão do cômodo, um estrondo, que a fez se levantar assustada.
Cerca de dez minutos depois, a mesma testemunha ouviu um segundo barulho, e algum tempo depois, soube que a vítima havia sofrido uma queda. Outro vizinho relatou que ouviu uma discussão, em que uma voz feminina dizia: "Vai. Eu não preciso mais te aguentar, aguentar isso ou aguentar você".
"Todos esses elementos deixaram claro que, primeiro, ele não estava dentro do elevador quando o corpo veio ao solo, e segundo, houve sim uma briga ali. Ele chegou a arremessar a cabeça dela ao solo. Não foi possível determinar se ela faleceu naquele momento ou em razão da queda. Porém, sabe-se que no mínimo ela desmaiou com aquela queda, e então ela foi jogada pela janela da sala", afirmou a delegada responsável pelo caso, Iara França Camargos.
O comportamento de Raul também causou estranheza. Segundo o porteiro que o viu e alertou sobre o corpo na área de lazer, afirmou que ele agiu com frieza.
"Somente na hora que falei que tinha uma pessoa caída próximo à piscina, ele fez uma cara de espanto, mas nada muito, e foi até o corpo. Quando ele viu que era a Carol, aí ele disse: ‘Carol’. E pronto, mais nada, com frieza, sempre com frieza. Depois, ele foi até o carro com as duas sacolas, hora nenhuma ele as soltou. Ninguém nunca vai saber o que tinha de fato naquelas sacolas", relata o funcionário do prédio.
A família afirma que o namorado de Carolina poderia ter sido preso em flagrante no dia do crime, caso a PM tivesse solicitado as câmeras de segurança do prédio e vistoriado as sacolas que Raul levou para o carro.
"Ele estava em estado de flagrância, não tinha saído da cena do crime, teria saído de lá preso e estaria respondendo preso", alega o irmão. Embora tenha se tornado réu no caso, apenas dois anos e meio depois do crime, o advogado segue em liberdade.
Em nota ao programa, a Polícia Militar de Minas informa que todas as informações colhidas preliminarmente, no local do fato, foram registradas em Boletim de Ocorrência e encaminhadas à Polícia Civil para as devidas apurações e providências cabíveis.
Histórico de violência
A investigação apontou que Raul Lages possui um histórico de violência contra as mulheres, com boletim de ocorrência registrado em 2018, em que a ex-mulher dele pede uma medida protetiva porque o advogado disse que iria matá-la.
Carol começou a namorá-lo um ano antes do crime ocorrer. "O Raul era um conquistador. Era tido como um bom perfil de relacionamento amoroso. Aparentemente bem-sucedido, aparentemente de uma boa família”, relata a delegada.
Os filhos contam que ela passou a se distanciar da família depois que começou a se relacionar com ele. Pouco depois, vieram os primeiros sinais de um relacionamento abusivo. "Ele conseguiu que ela bancasse a vida financeira dele, até mesmo a academia era a Carolina que pagava", disse Iara.
Em mensagens com as amigas, ela desabafava: "Eu não quero mais contato com ele não. Eu estou cansada de ameaça e tudo ele fala comigo em tom de ameaça". Além disso, a advogada chegou a ser agredida fisicamente, conforme relatou uma amiga, que disse que Raul a segurou pelo pescoço em uma briga.
Ela tentou terminar com ele, mas sempre voltava atrás. Segundo a família, eles tiveram 4 términos ao longo do tempo em que ficaram juntos. "Nessas idas e vindas, a gente sempre percebeu que não era um relacionamento saudável", disse o filho dela, Lucas.
Outra amiga contou que ele chegava a persegui-la de carro quando terminavam, e que ligada de 20 números diferentes. Três meses antes de morrer, Caroline enviou um email para si mesma, e uma das frases era: "Tenho convicção de que me faz mal, mas preciso de forças para acreditar nisso".
Depois disso, ela viajou às pressas para encontrar amigas que estavam no México, onde passou dez dias, e disse que foi “fugida” porque o namorado estava a perseguindo.
Quando voltou ao Brasil, se reconciliou com Raul e descobriu uma traição. Queria que ele pagasse as coisas de seu apartamento, mas ele a ameaçou novamente.
Raul foi acusado formalmente pelo crime depois de 2 anos e dois meses de investigação por homicídio triplamente qualificado, incluindo feminicídio. O julgamento ainda não tem data para acontecer.
"Ele esta solto, aproveitando a vida dele, sendo visto acompanhado de mulheres que a gente pensa que, provavelmente, estavam alheias à realidade da pessoa com quem elas estavam", declarou o irmão da vítima.
Em nota ao Fantástico, o advogado de Raul alega que ele é inocente e insiste que Carolina cometeu sucídio.
"Eu tenho fé e acredito que ela está em paz, e eu acho que o que nos resta é ressignificar esse acontecimento, essa perda tão grande para a gente. Que isso seja uma imagem, um espelho, do que as mulheres têm que perceber dentro dos relacionamento", desabafa a mãe de Carol, Maria Inês Magalhães,