A mulher que foi mantida em cárcere privado por 17 anos, junto com os filhos de 19 e 22 anos, em Guaratiba, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, contou que a família era agredida com fios e até pedaços de madeira pelo marido, que também é pai dos dois jovens. O relato foi dado em entrevista exclusiva à TV Globo. O suspeito segue preso.
"Eu fiquei 17 anos em cárcere privado, sofrendo maus-tratos. Ficava sem comida, sem água e apanhava. Meus filhos também, amarrados. [A gente] apanhava de fio e era enforcado também. Não tinha televisão e ele ficava com o som muito alto", relatou ao veículo.
A vítima ainda contou que ao longo dos anos, o marido se tornou ainda mais agressivo. "Ele já era bem agressivo, mas com o decorrer dos anos foi piorando as agressões”, contou à TV Globo.
Relembre o caso
Na manhã dessa quinta-feira, 28, policiais militares do 27º BPM do Rio de Janeiro libertaram uma mulher e dois jovens que estariam mantidos em cárcere privado há 17 anos. Segundo a corporação informou ao Terra, os jovens - um rapaz de 19 anos e uma moça de 22 -, que seriam filhos da mulher e do suspeito de mantê-los em cárcere, estavam amarrados, sujos e subnutridos.
A equipe policial localizou as vítimas em uma residência na Rua Leonel Rocha, em Guaratiba, após receber uma denúncia anônima. O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) foi acionado e o suspeito foi preso.
Em nota, a Polícia Civil informou ao Terra que, de acordo com a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Campo Grande, o caso foi apresentado na unidade por policiais militares. O autor foi autuado em flagrante pelos crimes de tortura, cárcere privado e maus-tratos. A investigação está em andamento.
Em entrevista para o jornal O Globo, o capitão William Oliveira, chefe do setor operacional do 27º BPM (Santa Cruz), afirmou que a situação do imóvel era precária.
"A situação foge da realidade. Difícil de compreender. Quando a guarnição entrou na casa, encontrou dois jovens amarrados pelos pés e sujos. Havia até fezes no local. Inicialmente, pensávamos que eram crianças, tal era o nível de desnutrição da moça e do rapaz", descreveu.
Segundo o capitão informou ao veículo, a mãe do casal de jovens também era mantida presa dentro de casa. O marido dela e pai das vítimas afirmou aos PMs que não fez nada errado.
"Ele nos disse que os filhos eram doentes mentais e precisavam estar presos. Quando conversamos com a senhora, ela nos disse que ela e os filhos não saiam de casa há 17 anos. Provavelmente, eles viviam sendo agredidos, mas isso será a Polícia Civil quem irá constatar. O ambiente da casa é um horror. Um imóvel simples, quase sem móveis, sujo e com mau cheiro. A gente que já pensa que viu de tudo nessa vida, nunca imagina que haja algo tão assustador", acrescentou.
Suspeito era conhecido como DJ
O homem preso suspeito pelo crime usava som alto com frequência para abafar as vozes e gritos da família. Por causa desse costume, Luiz Antônio Santos Silva - preso nessa quinta-feira, 28 - recebeu o apelido de 'DJ' pelos vizinhos em Guaratiba, na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Em entrevista para o RJ2, da TV Globo, uma vizinha mencionou o apelido. “Era difícil ouvir alguma coisa porque as crianças gritavam e ele botava o som bem alto. Tanto é que chamavam ele de DJ”.
O relato foi confirmado por outro morador da região: “A gente passava muitas vezes aqui e o som alto. Ele tinha uma aparelhagem de som muito grande aí dentro, parece que para abafar a situação que estava acontecendo”.
"Muita fome"
Outra testemunha disse que suspeitou da situação e tentou se aproximar das vítimas, chegando a oferecer comida. “As crianças ficavam presas, amarradas. Na quarta-feira, eu trouxe pão, mas a mulher contou que o Luiz viu e jogou fora, contou que ele queria bater nela, que achou ruim, e que eles não comeram nada”, disse Sebastião Gomes da Silva à reportagem.
Ainda segundo Sebastião, no dia da libertação, ele finalmente conseguiu alimentar uma das jovens e ficou emocionado com a reação dela. “A ‘bichinha’ pegou a banana e comeu com casca e tudo. Ela estava com muita fome”.
A Secretaria Municipal de Saúde se manifestou sobre o caso. De acordo com a pasta, as vítimas apresentam quadro de desidratação e desnutrição grave, e seguem sob os cuidados clínicos e acompanhamento dos serviços social e de saúde mental.