Nadia Murad, Nobel da Paz, fala, no Brasil, sobre a violência sexual que sofreu

A ativista iraquiana participou do Fronteiras do Pensamento, em São Paulo

25 jun 2023 - 15h27
(atualizado às 20h11)
Nadia Murad, ativista iraquiana
Nadia Murad, ativista iraquiana
Foto: Foto:Reprodução instagram/@nadia_murad

Segundo o filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein, "os limites do mundo são os limites da linguagem de cada um, o mundo é definido e recebe significado pelas palavras que escolhemos". A importância da máxima de Wittgenstein que coloca a forma como nos comunicamos em destaque como vetor de mudança se fez clara no discurso da ativista Nadia Murad, Prêmio Nobel da Paz que esteve em São Paulo para o ciclo de conferências Fronteiras do Pensamento, que nos últimos 16 anos reuniu grandes pensadores para discussão de assuntos da atualidade.

Iraquiana da comunidade étnico-religiosa yazidi, Nadia teve sua história contada para o grande público pela primeira vez no 60 Minutes, programa de TV mais visto dos Estados Unidos, quando foi entrevistada em um campo de refugiados no Iraque.

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Na época, Nadia conseguiu abrigo entre 12 mil refugiados, depois de ter fugido do cativeiro em que sofreu todo tipo de abuso e violência sexual por parte de terroristas que invadiram sua aldeia, matando parte de sua família.

Apesar do medo de expor o que tinha vivido e ter sido alertada de que falar sobre violência sexual seria perigoso, Nadia decidiu mesmo assim contar sua história. Diante da repercussão dessa primeira experiência, percebeu a força da comunicação e decidiu usar sua voz para tentar salvar sua família e comunidade, tornando-se ativista dos direitos humanos.

Nadia conseguiu em um programa que beneficiou mulheres e crianças refugiadas se mudar para a Alemanha onde vive e é responsável, entre outros feitos, pela criação do chamado Código Murad, um guia desenvolvido em parceria com o Centro de Direitos Humanos da Universidade Berkeley, na Califórnia.

Nesse documento é oferecida uma solução prática, tendo em vista o cuidado e a importância da veracidade das narrativas oferecidas por sobreviventes a jornalistas que divulgam as histórias para portais de notícias ao redor do mundo.

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O código destaca os principais problemas na abordagem de sobreviventes de violência sexual, como as repetidas e desnecessárias entrevistas realizadas por entrevistadores não qualificados com métodos ineficazes prejudiciais e causadores de novos traumas para os sobreviventes.

"Muitas vezes, a pergunta do entrevistador coloca a vítima como culpada. Dessa forma, existe uma deturpação da narrativa. As mulheres vítimas de violência sexual são estigmatizadas e a única forma de evitarmos essa violência é escutarmos as histórias dos sobreviventes. Conversar sobre a violência sexual contra as mulheres e de como ela é usada como uma arma de guerra para destruir comunidades e famílias é essencial. Não podemos simplesmente passar para o próximo assunto sem termos resolvido esse", explica.

Na mesma invasão em que Nadia foi escravizada houve também o assassinato de sua mãe pelos sequestradores do Estado Islâmico, que a consideraram "velha demais para ser abusada sexualmente".

Em seus agradecimentos pelo Nobel da Paz de 2018, Nadia dedicou o prêmio à mãe: "Eu penso em minha mãe e me sinto incrivelmente honrada e humilde por ser sua filha. Compartilho também esse prêmio com yazidis, iraquianos, curdos e outras minorias perseguidas e com as incontáveis vítimas da violência sexual em todo o mundo".

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Fernando Schüler, curador e um dos fundadores do Fronteiras do Pensamento, convidou Nadia Murad para o evento que, em 2023, se propõe a abordar temas como Entre o Caos e a Ordem e apontar caminhos para superar as incertezas da contemporaneidade. Mais quatro painéis estão programados até outubro de 2023.

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