O caso do adolescente negro baleado após tocar campainha de casa nos EUA

Os pais de Ralph Yarl o enviaram para buscar seus irmãos, mas ele tocou a campainha no endereço errado.

18 abr 2023 - 06h29
(atualizado às 07h11)
Ralph Yarl, de 16 anos, é um 'garoto fantástico', afirma a tia do adolescente
Ralph Yarl, de 16 anos, é um 'garoto fantástico', afirma a tia do adolescente
Foto: FAITH SPOONMORE/GOFUNDME / BBC News Brasil

Protestos eclodiram no final de semana em Kansas City, nos Estados Unidos, depois que uma pessoa atirou duas vezes em um adolescente negro que tocou a campainha da casa dela por engano.

Ralph Yarl, de 16 anos, foi enviado por seus pais para buscar os irmãos na casa de um amigo no dia 13 de abril, mas foi para o endereço errado.

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O suspeito atirou em Yarl através da porta da frente. Uma das balas acertou a cabeça do adolescente, segundo a família e os advogados.

Yarl recebeu alta do hospital no domingo (16/4) e está se recuperando em casa, contou o pai do garoto ao jornal Kansas City Star.

"Ele continua a melhorar", afirmou ele. "Ralph está respondendo ao tratamento, com um bom progresso."

Os advogados de direitos civis Ben Crump e Lee Merritt estão representando a família Yarl no caso. Eles criticaram as autoridades por libertarem o suspeito, que é um homem branco.

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"Você não pode simplesmente atirar em pessoas sem ter justificativa quando alguém bate à sua porta — e bater na porta não é uma justificativa", defendeu Crump.

O suspeito foi conduzido à Central de Polícia para prestar depoimento antes de ser liberado. Segundo as leis do Estado do Missouri, uma pessoa presa para uma investigação criminal deve ser libertada ou acusada num prazo de 24 horas.

Os investigadores também avaliaram se o suspeito está ou não protegido pelas leis de Stand-Your-Ground ("Defender o Seu Terreno", em tradução livre para o português), que concedem às pessoas permissão para usar força letal se se sentirem seriamente em perigo. Os críticos dizem que essas leis facilitam a violência contra pessoas negras.

"Reconheço os componentes raciais deste caso", admitiu Stacey Graves, chefe da polícia de Kansas City. "Reconheço e entendo a preocupação e a resposta da comunidade a este incidente em particular."

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No domingo (16/4), centenas de manifestantes se reuniram perto da casa onde ocorreu o tiroteio, gritando "vidas negras importam" e "justiça para Ralph".

"Isso não foi um 'erro', foi um crime de ódio", disse a tia de Yarl, Faith Spoonmore, à agência de notícias Kansas City Defender.

"Você não atira na cabeça de uma criança porque ela tocou sua campainha. O fato de a polícia ter dito que foi um 'erro' é o motivo pelo qual a América é do jeito que é."

Spoonmore criou uma página no serviço de vaquinha virtual GoFundMe para arrecadar dinheiro que será usado no tratamento do sobrinho.

De acordo com a página, Yarl pretendia pegar os irmãos no endereço 115th Terrace, mas acabou se confundindo e tocou na 115th Street.

O texto diz: "Meu sobrinho caiu no chão e o homem atirou nele novamente. Ralph então conseguiu se levantar e correr para a casa do vizinho em busca de ajuda."

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A página do GoFundMe também descreve o adolescente como "um dos melhores clarinetistas do Missouri" e aquele que "toca vários instrumentos na orquestra jovem metropolitana".

A vaquinha virtual já arrecadou mais de US$ 2,1 milhões (R$ 10,3 milhões).

Quem é o suspeito

Andrew Lester, de 84 anos, foi acusado de agressão em primeiro grau e ação criminosa armada.

Lester, que é branco, supostamente atirou em Yarl na cabeça e no braço.

O principal suspeito não foi acusado de crime de ódio, e os documentos do indiciamento não descrevem um suposto viés racial no crime.

Em uma coletiva de imprensa realizada na segunda-feira (17/4), o promotor do condado de Clay, Zachary Thompson, disse: "Minha mensagem para a comunidade é que aqui nós aplicamos as leis e as seguimos."

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"Isso não importa de onde você vem, como se parece ou quanto dinheiro possui."

O suspeito Andrew Lester, de 84 anos
Foto: Departamento de Polícia de Kansas City / BBC News Brasil

A polícia inicialmente deteve Lester para interrogatório e o soltou, o que gerou protestos em toda a cidade no domingo.

Na segunda-feira, os manifestantes se reuniram do lado de fora da casa do suspeito. A casa dele também teria sido vandalizada.

Nenhuma palavra foi trocada antes que o dono da casa abrisse fogo com um revólver calibre 32, disseram os promotores do caso.

Lee Merritt, um dos advogados da família do adolescente, disse à rede NBC News: "Yarl ouviu um barulho na casa e, finalmente, a porta foi aberta."

"E ele foi confrontado por um homem que lhe disse para não voltar ali e imediatamente disparou a arma."

De acordo com relatos locais, Lester disse à polícia que acreditava que alguém estava invadindo sua casa e disparou dois tiros em sua porta.

Uma testemunha também disse à imprensa local que ouviu Yarl "gritando que havia levado um tiro".

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Na segunda-feira, os promotores também disseram que os cidadãos do Missouri têm o direito de usar a força se temerem "razoavelmente" que estão em perigo. Eles se recusaram a dar mais detalhes deste caso.

O pai do menino, Paul Yarl, afirmou que as acusações foram "um grande alívio".

"Isso é o que estávamos procurando."

De acordo com os advogados da família, o presidente dos EUA, Joe Biden, ligou para a família Yarl na segunda-feira e conversou com eles por cerca 20 minutos.

Ele disse aos repórteres que Biden ofereceu suas orações e os convidou para a Casa Branca assim que o adolescente se recuperasse.

Celebridades como Viola Davis, Justin Timberlake, Halle Berry e Kerry Washington condenaram o tiroteio nas redes sociais.

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