De olho na diversidade na propaganda brasileira desde 2015, a pesquisa Todxs, do Movimento Aliança sem Estereótipos - uma iniciativa da ONU Mulheres em parceria com a gigante multinacional Unilever - mostra que, no ano passado, a publicidade nacional "andou de lado" quando o assunto é a questão da inclusão em suas mais variadas formas, como gênero, raça e identidade sexual.
Para Isabel Aquino, consultora técnica da ONU Mulheres para o movimento, depois de forte avanço entre 2015 e 2017 - período no qual a representação de grupos minorizados deu um salto considerável -, os ganhos no quesito diversidade foram tímidos. Na mais recente versão da pesquisa, por exemplo, os progressos ficaram mais restritos à questão racial, embora a situação ainda não reflita a realidade do País.
A pesquisa analisou quase 7,7 mil conteúdos, de 425 anunciantes, veiculados em redes sociais e em cinco emissoras de televisão: Rede Globo, Discovery Kids, Record, Megapix e SBT. As amostras consideraram propagandas veiculadas nos meses de março, abril, julho e dezembro de 2021.
Questão racial
A representação de homens e mulheres negros na publicidade teve avanço em relação à ultima rodada da pesquisa, feita no fim de 2020. A presença de mulheres negras como protagonistas em campanhas publicitárias subiu de 22% para 27% nessa comparação, enquanto a dos homens foi de 7% para 20%.
Segundo Isabel, os resultados não refletem a ampliação do debate sobre diversidade nas empresas e sequer se aproximam do patamar de 56% de brasileiros que se autodeclaram negros, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Ela diz também que o protagonismo de homens negros já atingiu patamar superior em 2019 (22%), enquanto o dado sobre mulheres está pouco acima ao recorde de 25%, em 2018. A consultora da ONU Mulheres frisa que o grande salto nessa inclusão foi percebido entre 2015 e 2017, mas que tem oscilado pouco desde então.
Diversidade limitada
Para além da raça, a pesquisa também se dedica à questão da diversidade sexual. Mas entre as propagandas estudadas, o total de protagonistas LGBTQIAP+ em peças publicitárias foi zero. "Tenho certeza de que, se tivéssemos incluído o mês de junho (que celebra o orgulho da comunidade), teríamos encontrado exemplos. Mas achamos importante olhar para além dessas datas."
Sobre os motivos pelos quais o avanço da diversidade não se consolida na publicidade, Isabel diz que o problema central é a falta de perspectiva dos profissionais que atuam nas agências. Isso porque esse contingente não representa o País em termos raciais, de gênero e de diversidade sexual.
As propagandas direcionadas a crianças entraram pela primeira vez no estudo. E o resultado também não foi animador. A representatividade negra entre os protagonistas cai para 2% nessa análise (chegando perto de zero entre meninas). Além disso, foi observada uma visão estereotipada de masculino e feminino nesses conteúdos, diz Isabel.
Cofundadora do More Grls, grupo dedicado ao debate sobre gênero nas corporações, a publicitária Laura Florence diz que a diversidade avança devagar porque as iniciativas de inclusão na maioria das empresas se militam ao setor de responsabilidade social, fora da estratégia do negócio. "Existe uma falsa noção de que discutir o tema já basta, mas faltam ações efetivas", diz Laura, que é diretora executiva da agência Havas Health & You.
A publicitária acredita que a formação dos times faz total diferença na "cara" dos conteúdos produzidos. Para ela, o aumento da diversidade virá somente com processos de contratação que coloquem como pré-requisito a seleção de mulheres, pessoas negras e membros da comunidade LGBTQIAP+. "É preciso que a busca seja intencional, para garantir que determinadas vagas sejam preenchidas por determinados grupos", frisa.