Cobrir uma Copa do Mundo sempre foi um sonho. Foi justamente esse enorme desejo que me fez superar o temor de viajar sozinha para o Catar.
Pensei: "Eu uso as roupas que eles quiserem, o importante é estar acompanhando o Mundial de pertinho, é o sonho de uma vida inteira, não posso deixar passar essa oportunidade."
Realmente, tive cuidado na hora de montar a mala. Não trouxe nenhuma blusa regata ou shorts. Só calças da canela para baixo ou saias longas. Por precaução, coloquei alguns lenços na bagagem.
No entanto, me senti confortável em não utilizar, mesmo no metrô, local em que só entraria com o cabelo coberto.
Esse meu conforto até o momento é o mesmo da maioria das mulheres que estão em Doha. Conversei com argentinas, brasileiras, espanholas, francesas, entre outras. Todas são unânimes: está bem diferente do que esperávamos.
Na partida de estreia da Argentina, por exemplo, as torcedoras se sentiram confortável até para vestir shorts curto e cropped. "Está bem tranquilo, eles respeitam muito", disse uma argentina para mim na porta do estádio de Lusail.
Durante uma tentativa frustrada de entrar em uma das salas de orações dos estádios, conversei com uma catari e questionei se a maneira como eu, uma ocidental, se veste era uma ofensa para ela. No momento, estava com calça três quartos e blusa de manga. Me chamou a atenção a preocupação dela em me deixar à vontade e contar que tem amigas de outras nacionalidades.
Ao final, ela até pegou na minha mão para se despedir. Foi o primeiro contato físico que tive com um não brasileiro no Catar em seis dias.
A minha impressão é que todos estão muito felizes com a realização da Copa do Mundo no país, principalmente as mulheres.
E, apesar dessa primeira imagem positiva, quebrando o estereótipo, fica o receio de estarmos todos caindo no "conto do vigário", afinal a repressão as manifestações LGBTQIA+ estão aí para provar que tem muita fumaça atrás dessa cortina.