Quero começar esse texto lembrando a vocês que militantes negros, historicamente, são mal vistos pelo BBB. Trago o exemplo clássico da Lumena, que recebeu um saco de fezes na porta de sua casa após sair do programa. Também posso falar tranquilamente do BBB19, onde Gabi Hebling e Rodrigo França foram difamados, enquanto a vencedora da edição, Paula, teve falas, no mínimo, problemáticas, sendo que muitas delas foram omitidas nas edições do programa. Para além disso, teve também participantes que foram julgados pelo fato de externar incômodos, como Ronan Oliveira do BBB16, que ficou chateado porque a bucha de lavar pratos do programa era um boneco negro de black power. Ou ainda o caso do João do BBB21 que, além de ser duramente criticado pelo público por ter apontado uma atitude racista de Rodolffo, ainda teve que ver seu algoz com música no topo dos aplicativos de música.
Na minha percepção, a ficha da Aline vinha caindo desde o momento que Alface foi esculachado pelos seus pares e, ontem, depois de ter uma conversa com Bruna e Fred Bruno, me parece que a ficha caiu de vez. A conversa foi mais ou menos assim: "Ela sempre vem falar disso de servir e que sou milionário e tal... que a favela venceu...Ok, é o jogo dela...", disse Fred. Aline rebateu: "Acho complicado falar de jogo dela porque é o lugar de fala dela". Aí Bruna falou: "Mas ela fala isso e a gente tentou proteger a Marvvila". E Aline finalizou dizendo: "Ok, a Marvvila é uma mulher negra, mas não podemos invalidar a Domitila". Após conversar com Sarah Aline e Aline se questionar sobre não ter notado logo a questão racial no jogo, ambas se emocionaram. Foi uma cena bem bacana.
Já tem algum tempo que as pessoas queriam que eu escrevesse sobre a apatia da Aline sobre a questão racial durante o programa. Muitos inconformados sobretudo porque ela tem letramento racial. Quando eu me recusava a fazer essa crítica, era até comum a retórica de citar outras pessoas negras que a estavam questionando. Para nós que vemos tudo de fora, e o tempo todo, é muito fácil e nítido ter convicção das coisas. Vemos e ouvimos coisas que eles não, percebemos as movimentações e alianças de forma macro e isso facilita muito nos julgamentos. Para nós, era óbvio que Paula, Bruno Gaga e Alface, pessoas negras do quarto Deserto, eram as menos protegidas. Para nós, era óbvio que seletividade na indagação, principalmente do Sapato e da Amanda, tinha cor, mas isso para aqui fora! Para ela, Aline, ali inserida, recebendo afeto, sendo acolhida e protegida, é bem diferente.
Virar as costas para Aline, especialmente nesse momento, é dar as mãos ao racismo e julgar pessoas negras da mesma forma que os racistas fazem. Eu também queria que a Aline notasse desde o início as movimentações, se colocasse contra o grupo dela e apontasse o dedo na cara dos seus pares de quarto, mas isso não é sobre o que eu quero, é sobre a Aline e suas identidades. É muito fácil julgá-la do lado de cá. Quem garante que eu - ou você - não estaria fazendo o mesmo? Por medo de estar passando por militante chato, por medo de perder 2 milhões de reais, por medo de sair e não fazer um publi, por medo de militar errado e ser acusado de esvaziar a pauta e por outros tantos receios que só quem vive pode ter.
Nas redes sociais ela estava sendo questionada por ser planta, e eu concordo que ela seja, mas tem uma planta, que é branca, que inclusive não recebeu nenhuma placa no último jogo da discórdia, que é a favorita. Tinha uma galera a criticando por não ter se posicionando para defender outras pessoas negras e agora, por fim, tem gente questionando Aline por chorar e ter percebido as nuances raciais do jogo. Sendo criticada até pela torcida de uma das suas aliadas por não ter atendido às expectativas deles em não ter dado a placa de protagonista para a Amanda, que repito, é uma PLANTA. Isso me faz pensar que, independente da postura da Aline, nesse momento do jogo, ela será alvo das torcidas inconformadas por ela ter sido a Aline e não o que “A” ou “B” esperava dela.
Pelos fatos citados acima, eu tenho certeza que Aline não ganhará o programa, mas eu quero deixar bem estabelecido que eu jamais irei julgá-la por ter enxergado as coisas nesse momento. Foi o momento dela! É sobre ela! Ela não tem obrigação nenhuma de fazer o que Luã quer, até porque quem irá assumir os BOs das suas escolhas será ela mesma! Me preocupa, nesse momento, o pós BBB. Ela já irá sofrer bastante indelicadezas de uma parcela dos telespectadores do programa, o que eu espero é que exista um outro lado que queira acolhê-la sem julgamentos.
Nas redes sociais já estão questionando o fato dela ter 40 anos, e por isso, por ser vivida, deveria ter entendido tudo rápido. Estão julgando por ela ser casada com homem branco, estão dizendo até que ela perceber isso agora é conveniente, ou seja, ódio já está sobrando para Aline. O BBB tem sido uma máquina de moer pessoas negras e eu não serei uma engrenagem desse mecanismo.