Intolerância religiosa, não: o que aconteceu no BBB é racismo religioso

Participantes do reality demonizam a religião de Fred Nicácio e rezam na tentativa de combatê-la

22 fev 2023 - 11h13
(atualizado em 23/2/2023 às 11h43)
Fred Nicácio sofre racismo religioso no BBB23
Fred Nicácio sofre racismo religioso no BBB23
Foto: Reprodução

O Big Brother Brasil é um programa que mistura pessoas diferentes e elas têm que conviver entre si, aprender sobre os outros para assim se tornarem o Grande Irmão. Mas não é isso que vemos na maioria das vezes e nessa edição não foi diferente. Há tempos que o racismo religioso vem rondando a casa mais vigiada do país, porém as falas eram dissimuladas. Já na última segunda-feira (20), os participantes do BBB Gustavo, Key e Cristian foram extremamente racistas religiosos com a fé de Fred Nicácio.

Começa com o Cristian chegando no casal e perguntando se eles não tinham visto. Nesse momento, Key começa a berrar “nem f*dendo” e “pode parar com essa p*rra". Já Gustavo fala “mentira”. A conversa vai se desenrolando e Key fala para Cowboy que não está louca, enquanto ele pergunta ao Cristian porque ele não o acordou. Key pergunta o que foi que ele fez e Cristian responde que não sabe e fala também que está com medo. Key, então, fala que vai apertar o botão da desistência e fala que não fica na casa se isso continuar acontecendo. Cristian fala que que viu Fred parado, com a cabeça abaixada, com as mãos juntas (ele mexe os dedos durante sua demonstração), e conclui com “fazendo os negócios dele”. Foi então que Gustavo fala que rezou, pois estava vendo Fred no seu momento íntimo de fé. Cristian fala que começou a ficar mal e então também começou a rezar e ele iria continuar, mas a câmera da Globo cortou e foi para outro local da casa.

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Muita gente vem relatando o episódio como se fosse intolerância religiosa, o que é um erro, já que quando falamos em religiões de matriz africana o termo intolerância não dá a dimensão correta sobre o tema. O que está por trás da fala dos participantes do BBB que é o âmago da questão. A sociedade racista sempre repeliu tudo que vem da África, sejam as pessoas negras, seja a capoeira, que hoje pode ser aceita, mas tem um histórico de repreensão, seja o acarajé, que tem cristãos que não comem também por racismo religioso, e não seria diferente com a religião, sobretudo em um país cristão que sempre caçou as pessoas que pensavam diferente.

Sabe por que intolerância religiosa não contempla religiões de matriz africana? Por que quando tem um evangélico orando e católico não sai por aí falando que ficou com medo ou quando um catolico está com seu terço, o evangélico não fala que vai desistir de um prêmio milionário por causa disso? Quando as pessoas ouvem um "amém" de outra religião elas aceitam, mas ao ouvirem um "Epahey Oyá" ou "Oke Arô" elas já remetem ao diabo e a tudo de mal que ele representa no imaginário da religião cristã. Diabo esse que é um personagem exclusivo do cristianismo. E que nem sequer existe no Candomblé. A lógica cristã jamais irá contemplar a complexidade das religiões de matriz africana. O maniqueísmo do cristianismo é característica particular e não universal.

A complexidade do racismo religioso é grande. A gente vive na sociedade em que traficantes de um grupo chamado "Bonde de Jesus" foram presos depois de ataques a terreiros de umbanda e candomblé. Entende a complexidade disso? E aí você verá pessoas justificando isso com falas como “Deus usa o ser mais improvável para seus planos”. 

É importante termos em mente que a perseguição do cristianismo às religiões de matriz africana é um projeto de poder. A forma com que as tradições de matriz africana são tratadas no Brasil é uma caça às bruxas. O racismo religioso desemprega, divide famílias, coloca filhos para fora de casa, violenta, segrega, fomenta o ódio e até mata. O cristianismo aparenta ter a necessidade de ser a única manifestação religiosa. Ele demoniza o candomblé e depois oferece a libertação através do seu salvador. É como se o simples fato do candomblé existir fosse uma violação às divindades cristãs.

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Por isso que eu aconselho a todas e todos que queiram se aprofundar nesse assunto: busquem o babalorixá Sidnei Nogueira para entender mais sobre o tema.

É nítido que alguns participantes não querem interagir com pessoas diferentes, tão pouco respeitar suas particularidades. Fred foi muito corajoso ao falar sobre sua religião no país racista em que vivemos, mais corajoso ainda ao evidenciar a todo momento sua gratidão pelos seus Orixás e ter seus momentos com eles. Infelizmente, nos dias de hoje, é mais fácil os intolerantes serem vistos como um suspiro moral e Fred ser visto como adorador de demônio. Ele sabe disso e é isso que o faz especial dentro daquela casa.

Fonte: Redação Nós
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