Liniker não tem obrigação de ser simpática o tempo todo

Pessoas negras são constantemente atacadas nas redes por não corresponderem às expectativas de terceiros

13 dez 2024 - 17h41
Com o disco Caju, Liniker conquistou diversos prêmios.
Com o disco Caju, Liniker conquistou diversos prêmios.
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A cantora Liniker foi a grande vencedora do prêmio Multishow deste ano. Ela ganhou quatro categorias, sendo elas capa do ano, MPB do ano, álbum do ano e o cobiçado, artista do ano. Musicalmente, quase ninguém achou brecha para criticar o grande disco intitulado Caju, talvez por isso, algumas pessoas que se incomodam em ver uma mulher trans negra alcançando tamanho respeito musical, tiveram que buscar fora do palco meios para atingir a Liniker.

Ocorreu que no fim da premiação, ao sair do local onde foi feita a cerimônia, uma fã abordou a Liniker, que segurava seus quatro troféus, para tirar uma foto. A cantora então tirou uma foto com a fã, em seguida a mesma fã pediu para tirar uma nova foto, porém dessa vez, ela queria segurar os prêmios que estavam nos braços da cantora. Liniker então respondeu que não, que aquela vitória era dela e vida que segue.

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No momento do acontecido muitas pessoas deram risada, mas quando o vídeo foi parar nas redes sociais as pessoas começaram a questionar de maneira dura, a negativa da cantora. Uns falando que se não fossem os fãs consumindo a música, nem troféu ela teria, outros dizendo que tem artista que quer ser reconhecida, ganhar dinheiro e depois age de maneira ríspida, gente chamando ela de chata e coisas ainda piores.

Não tem como analisar essa situação sem pensar de uma perspectiva racial. Pessoas negras de maneira geral, ao não demonstrarem um certo tipo de cordialidade, rapidamente são apontadas e questionadas de forma desleal. É como se as pessoas, e a sociedade como um todo, esperassem do corpo negro um determinado tipo de comportamento, e no momento que a expectativa não é correspondida aquela pessoa se torna alvo de falacias e critias. É como se pessoas negras não tivessem o direito de ter sua própria subjetividade, como se fossemos um bando que deveríamos agir de maneira homogênea, sem nenhum tipo de particularidade.

Pode parecer bobagem, mas analisando situações como essa envolvendo a Liniker, percebe-se como é fácil colocarem pessoas negras como arrogantes, prepotentes ou “chatas”. Basta o indivíduo ser mais fechado, delimitar bem sua tolerâncias e não deixar que ninguém invada seu espaço, que rapidamente começam os apontamentos. Quando falamos de uma artista do tamanho da Liniker que o hate sofrido por ela gera debate e defesas essa discussão pode ser, por muitos, vista como bobagem. Contudo, como já dito, esse tipo de comportamento não acontece só com pessoas negras famosas, e sim com todas as pessoas negras, e afetam sua vida de uma maneira perversa e que pode custar muito caro.

No caso da Liniker quiseram cancelar a gata, mas uma galera saiu em defesa, mas e quando isso ocorre no dia a dia? Aí eu vou até trazer um exemplo pessoal, tá? Eu trabalhei em uma empresa em que a gerente do meu setor era uma mulher negra, e com frequência, dentro e fora do setor, as pessoas falavam que era ela metódica, pulso firme, comprometida, não tolerava erro e viciada em trabalho. Essas são características que dentro de um cargo de um salário que pode chegar a seis dígitos, é extremamente valorizado, porém no caso dela não. As pessoas, sobretudo quem estava subalterno a ela, a criticava de maneira duríssima, mas quando era o gerente de outro setor, homem branco, com o mesmo comportamento, a galera achava um exemplo de profissional.

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Fato é que ninguém se questiona o que uma pessoa negra passa pela vida. Como o racismo atravessa diariamente sua formação. Por vezes, vendo acontecimentos como esses, questiono se as pessoas acham que estão fazendo uma espécie de favor para Liniker só em consumir sua música. Respeitem a individualidade das pessoas. Artistas brancos e brancas já tiveram atitudes muito piores do que essa e não gerou metade das ofensas nas redes sociais. Se o público tivesse metade da empatia pelo jeitinho da Liniker que tem com um monte de artistas racista por aí, textos como esse não seriam necessários.

Fonte: Redação Nós
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