Depois de Daniel Alves, vítimas de violência sexual não serão desacreditadas tão facilmente

Só assim, comportamentos de homens como Daniel Alves, que se acham poderosos com o mundo (e as mulheres) a seus pés, podem chegar ao fim

22 fev 2024 - 08h03
(atualizado às 14h00)
Daniel Alves, um jogador que se gabava de ser um dos maiores colecionadores de títulos da história do futebol, não escapou de ser preso, julgado e sentenciado pelo crime cometido
Daniel Alves, um jogador que se gabava de ser um dos maiores colecionadores de títulos da história do futebol, não escapou de ser preso, julgado e sentenciado pelo crime cometido
Foto: Getty Images

Foram 16 minutos dentro de um banheiro da boate Sutton, em Barcelona, que selaram o destino tanto de Daniel Alves quanto o da jovem, na época com 23 anos, que o acusou de estupro. A vida de ambos nunca mais foi a mesma depois daquela noite de 30 de dezembro de 2022

Ele, um jogador que se gabava de ser um dos maiores colecionadores de títulos da história do futebol, com carreira vitoriosa na Europa, não escapou de ser preso, julgado e sentenciado pelo crime cometido. A Justiça espanhola impôs uma pena de 4 anos e 6 meses de prisão ao jogador. Além disso, ele cumprirá 5 anos de liberdade vigiada e deve ficar 9 anos sem manter qualquer contato com a vítima. 

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Talvez tivesse passado em algum momento pela cabeça de Daniel de que poderia se safar como o colega Robinho. Condenado a 9 anos de prisão na Itália pela participação num estupro coletivo, Robinho fugiu para o Brasil antes de ser preso. 

Do outro lado, a vítima, uma jovem que teve a vida afetada pela violência a que foi submetida naquela noite. Não custa lembrar do relato chocante da jovem repetido diante do tribunal e já detalhado à Justiça ao longo do processo. Com identidade preservada e voz distorcida, a jovem contou ter ido com Daniel a um local mais reservado da boate. Ao perceber que entraria num banheiro com o jogador, mudou de ideia. Tentou sair mas foi impedida por ele. O jogador a teria forçado a fazer sexo oral nele . Diante da negativa, Daniel bateu na jovem e a penetrou de maneira violenta. Desde então, segundo relato da prima da vítima, ela chora com frequência e vive amedrontada de que será perseguida ao sair às ruas. 

Daniel Alves: da acusação de estupro à condenação de 4 anos e 6 meses de prisão Daniel Alves: da acusação de estupro à condenação de 4 anos e 6 meses de prisão

Já a versão de Daniel sobre o ocorrido mudou inúmeras vezes. No tribunal, acrescentou que estava bêbado naquela noite, na tentativa de que a bebedeira pudesse ser um atenuante para diminuir a pena. A defesa dele também tentou emplacar uma tese de que Daniel não teve direito a um julgamento justo. Por conta de ser quem é, teria sido submetido a um julgamento paralelo, em que a presunção de inocência não foi considerada. Vamos combinar que mudar a toda a hora a versão do que teria acontecido, não contribuiu muito para reforçar a tal presunção de  inocência.  

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Mas o que o julgamento de Daniel Alves deixa como precedente importante para casos similares no futuro é que ele enterra velhas e sussurradas teorias que sempre surgem quando um homem rico e famoso é denunciado por crime de violência sexual. 

A primeira delas é a de que a vítima quer se beneficiar ao fazer uma denúncia. Queria entender que tipo de benefício tem uma mulher que passa a tomar antidepressivo para poder seguir com a vida adiante depois de um estupro.

Além disso, no caso do jogador, houve desde início um cuidado para que a vítima não fosse exposta. Ela não queria ter a identidade revelada e teve seu direito respeitado pela Justiça. Adotar a não exposição como regra pode contribuir para que outras mulheres sintam mais segurança para denunciar seus agressores.  

Outra teoria antiga que cai por terra neste julgamento é a de que a mulher não pode mudar de ideia, após corresponder à abordagem de um homem. No caso de Daniel Alves, a abordagem já começou problemática, a ponto de a vítima, assim como a prima e uma amiga que estavam na boate com ela, se sentirem desconfortáveis com as investidas um tanto pegajosas do jogador, que chegou a colocar a mão nas partes íntimas delas. Quem é mulher, entende perfeitamente isso. É mais do que compreensível que uma mulher fique apreensiva nessa situação, temendo pela sua segurança. Mudar de ideia é o instinto de sobrevivência falando mais alto. Não há nada de errado nisso, muito menos algo que possa invalidar o testemunho de uma vítima de estupro.

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Talvez o grande legado do julgamento de Daniel Alves que chega ao fim é que ele jogou luz sobre o que representa um ato sexual realmente consentido. Uma vez que uma mulher diz "não", zera tudo. Sem consentimento, sem o "sim", o sexo se converte em violência sexual. 

Ao contrário do que pensava a vítima de Daniel Alves, que temia que ninguém iria acreditar no que tinha passado com ela na Sutton, seu depoimento não foi desacreditado. Só assim pode-se colocar um fim em comportamentos abusivos de homens como Daniel Alves, que se acham poderosos e que podem fazer o que bem entenderem quando avistam uma mulher que lhes desperta interesse.

Fonte: Redação Nós
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