Outro dia me deparei nas redes sociais com o texto de uma advogada que vive entre São Paulo e Lisboa e que costumava colaborar para um portal de notícias de Portugal. Aos milhares de seguidores, ela relatou que, com o nascimento de seu primeiro filho, tinha ganhado lugar de fala como mãe. No entanto, poucos meses depois, havia ganhado também lugar de fala como mãe que perdeu o emprego.
Essa é uma realidade extremamente familiar às mulheres brasileiras. Uma pesquisa divulgada neste ano pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostra que cerca de 50% das mulheres perdem o emprego depois do início da licença-maternidade. Além disso, depois da maternidade, metade delas se distancia de seus ambientes de trabalho. Entre os homens, apenas 15% deixam seus empregos depois de terem filhos. Pouco importa se a mulher tem um grau de instrução elevado. Todas são afetadas. Entre as que têm curso superior, o índice é de 35%. Entre as menos escolarizadas, 51%.
Trocando em miúdos, isso quer dizer o seguinte: as mulheres não são afetadas apenas pela dispensa de seus empregadores. Grande parte delas, na volta da licença maternidade, se vê praticamente obrigada a pedir demissão porque fica impossível manter o mesmo ritmo ou a mesma ocupação tendo agora uma outra vida que depende dela.
Lembrei de uma amiga que passou por isso. Em sua volta da licença maternidade, foi colocada numa função que seria impossível conciliar a rotina do trabalho com a de mãe que amamentava uma criança de meses. A única solução naquele momento era pedir demissão, confirmando o quanto as mulheres são penalizadas quando buscam equilibrar a vida profissional e familiar, um problema que os homens praticamente desconhecem.
Esse é um dos pontos no qual se debruçou a estadunidense Claudia Goldin, vencedora do Nobel de Economia de 2023, ao pesquisar sobre o que está por trás da desigualdade salarial entre homens e mulheres desde os tempos mais remotos. Goldin, que é professora de Harvard, aponta que ao contrário de outros períodos da história, em que as disparidades salariais se deviam mais à diferença de educação ou ao tipo de ocupação, a desigualdade atual é entre homens e mulheres que fazem o mesmo trabalho. Qual a explicação para isso?
Aí entra a importância do trabalho de Goldin, sendo reconhecido com o Nobel de Economia. As disparidades, segundo as pesquisas da economista, começam a se intensificar após o nascimento do primeiro filho. Goldin demonstra isso, por exemplo, num estudo que durou 15 anos, com os estudantes do curso de Administração da Universidade de Chicago. Ela e sua equipe descobriram que a diferença de remuneração entre os dois gêneros começou a aumentar um ou dois anos depois que uma mulher teve seu primeiro bebê. Assim, voltamos àqueles exemplos das mulheres que precisam buscar outro trabalho depois da maternidade, para ter um pouco mais de tempo livre para se dedicar ao filho.
Na prática, a busca por mais flexibilidade na hora de aceitar um emprego acaba jogando o salário da mulher para baixo. É a maneira como o mercado há tempos responde a essa demanda. Como se ao pleitear mais flexibilidade para dar conta de trabalho e vida pessoal, fosse quase um crime no mundo do trabalho. Não é.
Chega a ser irônico que a prática de demitir mães recentes continue a existir mesmo num momento em que empresas se esforçam para vender a imagem de defensoras da diversidade e da equidade de gênero em seus locais de trabalho. Mulheres mães têm que ser reconhecidas pelo imenso potencial de contribuição num ambiente de trabalho. Enquanto o cuidado com o outro for visto como um "problema" não há equidade e nem inclusão possíveis.