Quando a lei abandona as mulheres: para um terço do mundo violência doméstica não é crime

O Dia Internacional de Luta pelo Fim da Violência contra as Mulheres chama a atenção para um problema que afeta mulheres do mundo todo.

25 nov 2024 - 15h44
Segundo a ONU, violência contra mulheres tem raízes em normas sociais, estereótipos e discriminação
Segundo a ONU, violência contra mulheres tem raízes em normas sociais, estereótipos e discriminação
Foto: DW / Deutsche Welle

As cenas de um homem que saca uma arma e mata a ex-esposa na movimentada rua 25 de março são um emblema de como o Brasil está longe de ser um lugar seguro para mulheres.

O caso é recorte de como homens podem ver a vida de mulheres com desprezo, como se elas fossem propriedade deles. Como sintetizou o vilão Mavi, personagem de Chay Suede na novela "Mania de Você" ao se referir à Viola (Gabz): “ou ela vai ser minha, ou ela vai ser minha".

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No Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres (25/11), somos tristemente lembradas de que essa é uma tragédia global. Segundo a ONU, uma mulher ou menina é morta a cada 10 minutos por seu parceiro íntimo ou outro membro da família. Ou seja, a casa continua sendo um lugar perigoso para mulheres do mundo todo. 

Igualmente estarrecedor é saber que, segundo as Nações Unidas, apenas 2 a cada 3 países criminalizam a violência doméstica. Significa que para um terço do mundo, um homem que agride sua parceira de todas as formas não é considerado um criminoso. Portanto, não será punido pela justiça. Além disso, 37 países isentam os estupradores de processos se eles forem casados ou se casarem com a vítima. 

Só consigo pensar que se Gisèle Pelicot fosse cidadã de um de países, seu marido escaparia de ser julgado e condenado pela justiça. Um homem que durante décadas administrou altas doses de sedativos sem que a mulher soubesse, para que fosse estuprada por grupos de homens que entravam e saiam da casa do casal, ficaria totalmente impune. 

Mas Gisèle é francesa e por lá a promotoria pediu a pena máxima para o agressor: 20 anos de prisão. Mesmo neste caso, cuja vítima se converteu em uma espécie de ícone da luta contra a violência de gênero, há um outro lado que expõe a dificuldade para erradicar este tipo de agressão. 

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A filha do casal, Caroline Darian, de 45 anos, se considera a vítima esquecida neste processo. Ao contrário do processo da mãe, em que haviam vídeos apreendidos pela polícia com as cenas de estupro para incriminar Dominique Pelicot, a filha Caroline não teve como provar que foi abusada sexualmente pelo pai. “Descobri que meu pai me fotografou, sem meu conhecimento, nua. Por quê?”, pergunta a filha em depoimento no Tribunal de Avignon, convencida de que o pai também a drogou. Mesmo que o senhor Pelicot receba a pena máxima, o sofrimento que causou à filha nunca será reparado. 

No Brasil, temos a Lei Maria da Penha, sancionada em 2006 por Lula, em seu segundo mandato, e que entrou em vigor em 22 de setembro do mesmo ano. É uma lei fundamental para combater a violência doméstica. Mas é preciso mais. É preciso uma rede proteção, com profissionais capacitados, muito maior da que existe hoje, especialmente para mulheres que vivem distantes dos centros urbanos. É preciso que haja abrigos suficientes para acolher as vítimas de seus agressores e uma justiça que não seja leniente com abusadores. Já seria um começo para estancar uma tragédia que parece enraizada na sociedade brasileira. 

Fonte: Redação Nós
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