Nos áudios obtidos pela justiça italiana e revelados nesta semana pelo portal UOL, Robinho avisa: "a gente vai dar um soco na cara dela". O ex-jogador se referia à mulher albanesa que foi estuprada por ele e outros cinco amigos brasileiros numa boate em Milão, em 2013. Sem saber que seu carro tinha sido grampeado pelas autoridades italianas, Robinho arquiteta com o amigo Ricardo Falco, também envolvido no caso, o que na época pareceu ser a melhor estratégia para escapar da acusação de estupro. "Tu vai dar um murro na cara e vai falar 'porra, que que eu fiz contigo'?", diz ao amigo.
Robinho queria desferir um murro na cara da vítima. Queria dar um "cala-boca" na mulher que ele e seus amigos estupraram no dia em que ela comemorava o aniversário de 23 anos. Queria intimidar com um soco na cara uma mulher que nunca vai mais se recuperar dos traumas trazidos por um estupro coletivo e tudo o que viveu na sequência depois de fazer a denúncia.
Um soco na cara, insisto, foi o que ele conseguiu pensar para se safar da acusação que depois resultou na condenação a nove anos de prisão pelo crime de estupro.
Um ano atrás, num dia que já parecia ter se encerrado na prefeitura de Registro, em São Paulo, a promotora-geral da cidade Gabriela Monteiro de Barros foi surpreendida pela chegada do promotor Demetrius Oliveira Macedo assim que ela parou para conversar na mesa de uma outra colega.
O promotor, que era subordinado a Gabriela, passou então a agredir a chefe, mirando a cabeça dela. O vídeo que circulou na época mostra parte das agressões. A procuradora-geral contou depois à imprensa que as cenas de violência duraram muito mais do que aquilo que estava no vídeo. Ela achou que fosse morrer, pensou que sua vida terminaria naquele dia, sendo espancada por um colega que era conhecido pelo desprezo às mulheres no ambiente de trabalho. Mas que, estranhamente, não exibia esse mesmo comportamento quando se tratavam de homens.
Por causa de seu comportamento agressivo com outras colegas, Gabriela havia aberto um processo administrativo contra o promotor. Assim que soube do processo, veio a agressão. “Se ele tivesse a intenção só de me machucar, ele não teria dado tantos golpes violentos só na minha cabeça. Ele poderia ter batido em outros locais do meu corpo, ter me dado tapas, ter me chutado nas pernas. A intenção dele estava bem direcionada para me matar", disse Gabriela dias após ter sido agredida.
Chama atenção essa fixação de homens agressores em atingir a cabeça e o rosto de mulheres. Esse dado consta inclusive de um relatório do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) sobre violência contra mulher. Segundo relatório do instituto, golpes nas regiões da cabeça e do rosto representam mais da metade das agressões contra as mulheres de acordo com os números dos serviços de saúde.
Qualquer pessoa que pesquise no Google dados sobre violência contra a mulher vai ver uma quantidade espantosa de manchetes de veículos de comunicação que parecem repetições de uma mesma notícia. "Mulher é agredida pelo ex- companheiro com soco na boca". "Mulher é agredida pelo companheiro com soco no rosto". "Mulher é agredida com soco no rosto por policial". Mudam o nome da vítima, a faixa etária, que varia de idosa a adolescente, a cidade onde ocorreu a agressão e o nome dos agressores. Mas não muda o que todos eles têm em comum: o desprezo e o ódio às mulheres. São eles que representam o combustível principal para alimentar os episódios de violência praticadas contra elas.
Em tempo: nesta semana, veio a notícia de que Demetrius Oliveira, o promotor que espancou a chefe foi absolvido dos crimes de tentativa de homicídio e feminicídio. Foi considerado pela justiça paulista inimputável, que é o termo usado para descrever quando a pessoa que não compreende a ilegalidade do próprio comportamento em razão de alguma doença mental. No caso, um laudo assinado por cinco médicos atestando que Demetrius sofre de esquizofrenia paranoide. Prevaleceu a tese da defesa.