Quem não conhece histórias de mulheres que assinaram documentos acreditando na palavra do parceiro e depois se viram prejudicadas financeiramente? Ou então de uma mulher que descobriu que o ex-parceiro fazia gastos em seu cartão de crédito sem que ela soubesse? Ou ainda de parceiros que tentaram impediram a ex-mulher de ficar com seus bens como forma de se vingar pelo fim da relação?
A lista de práticas que configuram violência patrimonial é extensa e toda vez que tomamos conhecimento de um novo caso é uma oportunidade para que outras mulheres possam se reconhecer como vítimas da mesma violência.
Com as denúncias recentes de famosas, pode parecer que a violência patrimonial envolve grandes quantias de dinheiro. São casos de celebridades que chamam a atenção da opinião pública. É um choque saber que alguém que ganhou muito dinheiro, graças ao seu trabalho, ficou de uma hora para outra com o patrimônio comprometido. Pior: pela ação de alguém que era amado pela vítima, alguém que fazia declarações nas redes sociais. E, no entanto, o cidadão acima de qualquer suspeita foi capaz de uma tremenda canalhice como roubar dinheiro da mulher amada.
Longe de acontecer somente com as mais endinheiradas, esse tipo de conduta é muito mais frequente do que a gente imagina. Pára um instante e pensa no seu círculo de relações. Tenta lembrar quantas mulheres que você conhece que bancam praticamente sozinhas a criação dos filhos, tendo que se "virar nos 30", enquanto os ex-parceiros estão de boa. Quando cobrados, alegam dificuldades financeiras, que o dinheiro anda pouco e pronto! Assunto encerrado.
Tem aqueles que até levam os filhos para sair no final de semana, dão presentes, mas não põem comida na mesa diariamente, nem pagam escola ou plano de saúde, com a frequência que esses compromissos exigem. No entanto, não se acanham de gastar o dinheiro com coisas bem mais prazerosas como viagens ou a compra de um carro novo, por exemplo. Parece uma história que já ouviu em algum lugar?
E, para completar a lista, tem os homens que se sentem muito à vontade para ameaçar suas companheiras de não dar um tostão a elas e aos filhos caso resolvam sair de casa. Esse mesmo homem pode também fazer de tudo para que a mulher não consiga ser independente financeiramente, colocando mil obstáculos para ela trabalhar fora e ter o mínimo de autonomia.
É a velha tática de manter o controle sobre a mulher, como se ela pertencesse ao homem, sem que família ou amigos tenham acesso. Na cabeça do abusador, se a mulher não estiver ao lado dele, vai ter a vida transformada em um inferno. Foi ela que procurou, pensa ele.
A maior dificuldade parece estar em reconhecer que essas dinâmicas não são aceitáveis na vida de um casal. Nada disso é normal, muito pelo contrário. A violência patrimonial é uma das formas de violência contra a mulher descritas na Lei Maria da Penha que, neste ano, completa 18 anos. Ela define como violência patrimonial qualquer conduta que subtraia ou destrua bens, instrumentos de trabalho, documentos pessoais ou recursos econômicos da vítima. Mas muitas mulheres continuam sofrendo caladas e evitando o confronto, por dificuldades até de se identificarem como vítimas.
Por isso, toda voz de uma mulher que ousa denunciar tem que ser ouvida. Mais ainda: é preciso acreditar no que ela diz. O relato de uma vítima pode ser a única coisa concreta que resta quando a violência é praticada longe dos olhos de outras pessoas e não deixa marcas físicas.