O Carnaval é uma manifestação cultural onde, em um determinado período do ano, acontecem desfiles de escolas de samba e blocos, shows e festejos divertidos, coloridos e "plurais" ao longo do nosso país e cada região faz questão de manter e valorizar cada vez mais suas tradições.
Segundo o dicionário, diversidade significa: “qualidade daquilo que é diverso, diferente, variado, variedade”.
Dito isso, acredito que a maior parte das pessoas que me lêem deve ter respondido sim a pergunta que antecede esse texto. Isso porque é inegável a multiplicidade de pessoas que encontramos nas ruas nessa época, não é? No entanto, há um determinado grupo da sociedade, do qual eu faço parte, que é historicamente segregado, escondido e discriminado. E que, ainda hoje, parece não ser visto, muito menos considerado, também nessa festa que consideramos muito diversa! Antes de tudo, preciso dizer que sou cega.
De acordo com o IBGE, cerca de 45 milhões de pessoas têm algum tipo de deficiência em nosso país e, por mais expressivo que esse número seja, não tivemos no Carnaval de 2022 pessoas com deficiência ocupando, de forma significativa e participativa, esses espaços.
Frequento o Sambódromo da Marquês de Sapucaí do Rio de Janeiro há mais ou menos 15 anos, onde já vivi e presenciei muitas situações desesperadoras no que diz respeito a acessibilidade, seja estrutural e/ou atitudinal, que dariam para escrever um livro. É como se fosse proibido que as pessoas com deficiência ocupem aqueles espaços. A sensação é, por mais pesado que seja, de que estamos cometendo um crime.
Quase não se vê gente da gente nas arquibancadas, nas frisas e nos camarotes; também é difícil de nos encontrarem desfilando, seja no meio daquele lindo mar de gente ou em posição de destaque. Trabalhando então, nem se fala.
Mas se você é um folião, assim como eu, deve estar se perguntando: "E aquele espaço, lá no final da Marquês de Sapucaí, quase saindo, que eu vejo um monte de pessoas com deficiência?". Eu lhes respondo: - Justo, temos sim um lugar, lá no final, oferecido pela Prefeitura do Rio, da qual nós temos que escolher um dia no Grupo Ouro e um dia no Grupo Especial para ganhar um ingresso. No entanto, é um local pequeno, que não comporta muita gente, dependendo do governo vigente oferece pouca estrutura e o período para a solicitação do ingresso é não divulgado.
Bom, e se por um acaso eu quiser comprar para ir em outro lugar como arquibancada, frisas, cadeira especial ou camarote? Tenho direito a meia entrada, garantida por lei e só. Nada mais. A acessibilidade estrutural passa longe e a atitudinal é quase nula. Neste ano, tive uma grata surpresa, fui convidada para um camarote (Folia Tropical) e quando cheguei lá encontrei portas largas, quem usa cadeira de rodas sabe bem a importância disso, rampas sem degrau antecedendo, elevador, um espaço com vista privilegiada, que para quem enxerga faz uma grande diferença e, para mim, o mais importante, a minha presença como uma pessoa com deficiência visual total sendo tratada como a de uma foliã que estava ali para curtir o Carnaval como qualquer um outro. Não tive a minha deficiência ignorada e nem supervalorizada.
Pasmem, eu estou falando do básico, mas que eu não tinha encontrado em mais de 15 anos de Marquês. E os blocos, os shows, as festas privadas? Já viu algum banheiro químico adaptado? Alguma pessoa com deficiência que use cadeira de rodas ou andador em cima de algum trio elétrico? Se respondeu sim, foi algo bem raro e pouco comum. Você, pessoa com deficiência, já recebeu os parabéns por estar se divertindo em algum bloco/festas/show? Pois eu sim e muitas vezes.
Respondendo a pergunta que eu mesma fiz... Acho sim o Carnaval uma festa diversa, mas com uma diversidade seletiva, assim como, na maioria dos espaços e lugares na nossa sociedade. Nós, pessoas com deficiência, também queremos, em sua maioria, pertencer e participar desse que é um dos maiores espetáculos da terra.
Para terminar, não posso deixar de perguntar: - Será que esses espaços/lugares não são acessíveis por que as pessoas com deficiência não frequentam ou será que as pessoas com deficiência não frequentam por que esses lugares/espaços não oferecem nenhuma acessibilidade?