Luiz* tem 29 anos e, desde os 13, se entende como homossexual. Sua orientação sexual, que há muito tempo é uma “situação resolvida” para si mesmo, parece não ser para quem divide o expediente com ele.
Morador de uma cidadezinha de 23 mil habitantes do interior do Espírito Santo, Luiz é um funcionário público do primeiro escalão que precisa se esconder atrás de uma norma que não lhe pertence para garantir sua sobrevivência profissional. “É uma situação muito séria, acabo não falando da minha orientação sexual em nenhum espaço e em nenhum momento”, conta em entrevista ao Terra.
Ele fica atento ao que fala, como se veste e até como gesticula. O receio de ter sua vida íntima exposta e, consequentemente, até perder o emprego mina suas chances de ser feliz na cidade onde nasceu e foi criado.
“Acho isso pavoroso, mas é muito dual. Por mais que eu ache a coisa mais pavorosa, asquerosa e ilógica possível dentro da sociedade, na realidade a gente acaba vivendo isso para poder ter uma oportunidade profissional”, desabafa.
Esta é a realidade não só de Luiz, mas de muitos outros brasileiros. Aproximadamente 61% dos profissionais LGBTQIA+ no Brasil optam por não declarar a própria orientação sexual no trabalho para colegas e gestores, segundo o levantamento Out in the World: Securing LGBT Rights in the Global Marketplace (No mundo: garantindo os direitos LGBT no mercado global, em tradução livre), produzido pela Center for Talent Innovation.
O estudo também mostrou que 49% dizem que encobrem ou minimizam sua identidade LGBT+ no ambiente profissional.
Homofobia no trabalho
O especialista em liderança e facilitador de treinamento Bruno Moura, de 35 anos, foi vítima de homofobia dentro do ambiente corporativo em duas empresas. Em uma delas, ouviu de seu diretor, após uma apresentação, que o sócio pediu para ele não “desmunhecar muito a mão” na próxima. “De todos os feedbacks, ele poderia ter falado outras coisas, ou ter poderado”.
Na segunda, o caso virou denúncia e ocorreu dentro de uma multinacional da indústria de cigarros onde atuou em 2015. Quatro pessoas estavam envolvidas e acabaram demitidas: o head do centro de serviços compartilhados; a secretária dele; um subordinado de Bruno; e uma gerente.
“Nos primeiros momentos, de forma alguma consegui identificar que se tratava de homofobia, primeiro que desde criança eu sofria isso e se tornou rotineiro. Acho que a minha régua era muito comprida para isso”, explica.
Durante a sua jornada, passava por descredibilização de seu trabalho, era desautorizado, tinha reuniões desmarcadas com o head minutos antes delas acontecerem e projetos que eram da sua área sendo passados para outras. Por vezes, ouviu ‘piadas’ que transformavam em ‘humor’ aquilo que jamais deveria ser motivo de risada.
“Em alguns momentos, ele [head] falava coisas do tipo: ‘eu aceito pessoas gays, mas a minha família não’. Ele nunca chegou a falar abertamente, que não gostava de mim porque eu era gay”, afirma.
Durante o período que esteve na empresa, seu corpo começou a avisar que algo estava errado. Passou por episódios de insônia, depressão e precisou tomar remédios para se tratar. Só quando foi desligado foi que percebeu as microviolências que havia sofrido durante meses.
“Eu fiquei uns dias ruminando, tentando entender o que eu fiz de errado. Foi aí que decidi denunciar no canal da empresa. Fiz uma carta de seis páginas, mas sempre com muito medo. Como se prova uma coisa dessa? [...] Não tive qualquer amparo”, relembra.
Sua denúncia deu início a uma investigação dentro da empresa. Nesse meio tempo, ele descobriu que até seu computador foi acessado indevidamente, sob autorização do head, para verificar se ele havia vazado dados sigilosos.
Após a conclusão do caso, as pessoas envolvidas no caso foram demitidas. Ele optou por não processar a multinacional e seguiu a vida.
Ações trabalhistas
Cuidado com microagressões
*Os nomes foram alterados para preservar a identidade dos entrevistados.