Agatha Maria completou nove anos em fevereiro deste ano, e quando tinha apenas dois já dava sinais de que não se identificava com o gênero com o qual nasceu. Thamirys Nunes, mãe da menina, estranhou que ela não se interessava por brincadeiras associadas aos meninos e, quando a menina estava prestes a completar quatro anos, ouviu da boca da filha: "Posso morrer hoje para nascer menina amanhã?".
O Terra é o veículo oficial da Parada SP, que tem cobertura patrocinada por Vivo, Amstel e L'Oreal
Naquele dia, Thamirys começou a entender que tem uma filha trans. No começo, ela passou por momentos difíceis e dolorosos até entender a situação e a verdeira identidade da criança. Atualmente, a mãe de Agatha é presidente da ONG Minha Criança Trans voltada a ajudar outras famílias e crianças trans, trabalho esse que já fez com que a ativista sofresse ameaças de morte e precisasse até se mudar.
Após compreender que a filha é trans, Thamirys enfrentou diversas situações de preconceito nos ciclos sociais dos quais fazia parte. "As pessoas realmente não compreendiam. Foi um processo muito difícil mesmo. Foi difícil para mim, porque também tive que aprender o que significava tudo isso, mas as pessoas ao redor não conseguiam respeitar", relembra.
Por conta disso, decidiu fundar a organização em 2020 para auxiliar outras famílias. Hoje, ela se dedica 12 horas por dia ao trabalho com a instituição de forma completamente voluntária. "Infelizmente, a gente não tem financiamento nem de empresas, nem de mandatos, e é muito dcomplicado sermos contemplados em editais. Tem uma resistência ainda muito grande, a gente se inscreve, mas são contemplados projetos LGBTs adultos, ainda há um incômodo em trabalhar com crianças trans", argumenta.
Mesmo com a falta de verba, a 'Minha Criança Trans' tem oito voluntárias na diretoria, que ajudam nos trabalhos com as 680 famílias com crianças trans no Brasil e outras 75 famílias brasileiras que moram no exterior. Além de prestar auxílio as famílias, a organização também tem uma forte atuação política para cobrar pelos direitos de crianças trans, presta assessoria jurídica e ajuda a intermediar conflitos com escolas.
Junto desses trabalhos, Thamirys também é dona de um perfil no Instagram com mais de 160 mil seguidores, no qual produz conteúdos sobre maternidade de crianças trans. Com a visibilidade, a ativista virou alvo de um grupo terrorista neonazista, sofreu inúmeros ataques transfóbicos e ameaças contra sua vida.
"Já recebi prints de pessoas que me ameaçam com fotos da fachada da minha casa e a seguinte frase: 'Fecha a janela que daqui a pouco a gente está chegando'. Nunca houve ameaças à minha filha, são ameaças a mim, como 'vou te estuprar até você morrer' e 'a gente vai te matar'", relembra.
Devido a essas ameaças, a ativista precisou se mudar e também chegou a procurar o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas, vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
Apesar dos ataques transfóbicos, Thamirys não cogita desistir do papel que desempenha. "Se eu pensar só em mim e na minha filha, pego a minha cidadania italiana e vou embora me esconder em qualquer lugar do mundo, mas eu conheço cada família que tem aqui dentro. Isso daqui não são números para mim e, toda vez que eu penso em desistir, lembro de tantas histórias, tantas famílias, tantas crianças, tantos adolescentes e tantas mães que peguei na mão nos últimos quatro anos e não consigo parar", finaliza.