O primeiro pensamento que brota na cabeça de uma pessoa que acredita ter sentimentos por alguém do mesmo sexo é: "O que é isso?". O segundo é bem mais complicado: "Por que eu?". Não se escolhe nascer LGBT, você simplesmente nasce. Não se escolhe amar, você simplesmente ama.
Alguns podem não ter problemas na descoberta, já outros, sim. Fato é que o apoio e respeito da família e dos amigos tornam o processo mais fácil. Por outro lado, a ausência desse suporte impacta, machuca e amedronta, mas não inibe sentimentos como o da tenente-coronel Patrícia Silva Santos, 39 anos.
A oficial da Polícia Militar não recebeu o apoio esperado da mãe ao revelar que iria morar com sua namorada, a também policial Susane Tamanho, 42. Sua mãe ficou sem falar com sua esposa por 9 anos.
O ano em que tudo isso aconteceu foi 2007, mas a história de amor das duas oficiais começou dois anos antes, em 2005. Susane e Patrícia já haviam se cruzado pelos corredores da academia militar, mas a primeira conversa acontece em um evento esportivo, no qual foram escaladas para jogar futebol.
Era 7 de março. Daquele dia em diante, elas começaram a se relacionar. Diferentemente de Patrícia, Susane conta que sua mãe não impediu o relacionamento entre as duas, mas a falta de compreensão da sua parte era notória.
A independência financeira foi o fator chave para ela revelar sua bissexualidade, orientação segundo a qual a pessoa sente atração sexual por homens e mulheres. Com o passar do tempo, lembra Susane, sua mãe entendeu o quanto o relacionamento com Patrícia a deixava feliz.
Até que o relacionamento fosse assumido para a família, elas tiveram que ultrapassar alguns obstáculos. No início, precisaram esconder o romance, já que Patrícia ainda era aluna da academia militar e Susane já era tenente formada.
O preconceito, apesar de ser velado, também amedrontava o casal, que assumiu o relacionamento no trabalho e decidiu se casar. Já são 18 anos juntas.
Mães de trigêmeas
A maternidade sempre foi um sonho do casal. Após Susane deixar a função de chefia que exercia, as duas decidiram então que aquele era o momento certo para realizar aumentar a família. A idade de Susane, que em 2019 beirava os 40 anos, preocupava, já que poderia incorrer em gravidez de risco.
Susane engravidou em dezembro de 2019. A gestação acompanhou o avanço da pandemia de covid-19, com o receio agravado, já que sua esposa estava trabalhando na rua enquanto ela fazia home office.
Na primeira ida ao médico para verificar se a inseminação artificial havia funcionado, elas descobriram estar grávidas de gêmeas. Na segunda consulta, uma surpresa: na verdade, eram trigêmeas.
Maria Lívia, Maria Sofia e Maria Fernanda nasceram saudáveis, mas ficaram na UTI neonatal por alguns dias. Hoje, as bebês têm 2 anos e 9 meses, e muita coisa mudou. A chegada das crianças foi maior que qualquer preconceito, e trouxe para perto a mãe de Patricia, que se aproximou da nora e da família de sua filha.
A rotina da família é compartilhada em seu perfil no Instagram e inspira muitas pessoas da comunidade LGBTQIA+ a construírem sua própria história. As três Marias mudaram a vida das avós, que no início não aceitavam a relação de Susane e Patrícia, mas que hoje acolhem, respeitam e entendem que família é família, independentemente de gênero, raça, cor e orientação sexual.