O resultado obtido em 2018 pela EDP Brasil, com a formatura da primeira turma da escola de eletricistas criada pela empresa exclusivamente para mulheres, é mais do que simbólico. Pode até parecer óbvio, a iniciativa tomada pela companhia do setor energético, mas ela só virou realidade após a ultrapassagem de alguns obstáculos.
"A primeira dificuldade que tivemos foi convencer, até internamente, que haveria demanda para a escola", afirmou Fernanda Carsughi, vice-presidente de Pessoas & ESG da EDP Brasil, no Summit ESG, do Estadão. Na verdade, alguns indicadores ajudavam a corroborar o mito de que as mulheres não iriam se interessar em serem capacitadas na área. Mas um exame mais detalhado do assunto rapidamente identificou o real problema.
Na fase de estruturação do programa, explicou Fernanda, entendeu-se que havia algumas regras do edital do concurso que travavam a participação de mais gente. "Havia pré-requisitos técnicos que muitas mulheres, por não terem estudado na área, não tinham. Outra questão foi que retiramos a obrigação de as candidatas terem CNH no início do processo. Depois, durante o curso, demos condições para que elas conseguissem o documento."
Resultado
Por volta de 800 candidatas se inscreveram na primeira turma da escola em 2018. Da classe feita em Mogi das Cruzes, com 16 alunas, 7 foram selecionadas para trabalhar na própria empresa. "Tivemos de dar alguns passos para trás, mas foi importante para solidificar o modelo", disse Fernanda.
As ações afirmativas para aumentar a participação feminina no mundo corporativo já consegue apresentar alguns resultados palpáveis, segundo Carolina Figueiredo, diretora de Estratégia da Philip Morris Brasil. A meta da empresa para este ano é chegar em dezembro com 40% dos cargos de liderança da companhia ocupados por mulheres. "Agora, estamos muito perto, com 39,6%", explicou a executiva da empresa no Summit ESG. Se a meta não for atingida, o bônus de fim de ano dos executivos será afetado.
"Temos ainda vários programas de desenvolvimento para as lideranças femininas tanto júnior quanto mais sênior", disse.
No caso da Neoenergia, que inclusive passou a apoiar o futebol feminino em um país onde, por 38 anos, entre 1941 e 1979 a lei proibia as mulheres de jogar bola, a questão de gênero está em sintonia com o discurso principal da empresa, voltado para a transição energética, em direção a um mundo mais sustentável, e a economia de baixo carbono de forma geral, segundo Laura Porto, diretora de Renováveis do grupo. "É uma mudança de cultura que está em curso. O ESG é tratado como uma pauta real e não um discurso teórico."
O que não significa, segundo Maristella Iannuzzi, fundadora da CMI Business Transformation, que a preocupação, por exemplo, em contratar pessoas com mais de 50 anos esteja consolidada no mundo corporativo. "O etarismo ainda é um assunto muito discreto nas empresas. Apesar da questão de gênero ter avançado, pautas como o 50+, LGBTQIA+ ainda são muito incipientes", disse a consultora.