"Sou Aretha Duarte Freitas, tenho 38 anos, nasci em Campinas, no estado de São Paulo, e moro no bairro Jardim Capivari, que fica na periferia da cidade. Eu sou a caçula e tenho dois irmãos mais velhos, Ailton Júnior e Stênio. Nós somos filhos da cozinheira Euleide e do ferreiro armador Ailton.
Os meus pais são pernambucanos e vieram do Nordeste para São Paulo para tentar uma vida melhor, mas quando chegaram não tinham onde morar e ocuparam um terreno na cidade de Campinas. Eles construíram um barraco de madeirite, onde puderam formar a família. Tempos depois, a prefeitura da cidade cedeu esse terreno para minha família e meus pais puderam transformar o barraco de madeirite numa casa de alvenaria. Eu vivi nesse barraco até os meus seis anos de idade e acompanhei toda a construção da casa de tijolos.
Sou formada em educação física, com pós-graduação em fisiologia, bioquímica, treinamento esportivo e nutrição. Hoje, sou montanhista, empreendedora socioambiental e guia de alta montanha. Além disso, também sou palestrante e desde o início do projeto "Da Sucata ao Everest", em 2020, venho ministrando palestras, tanto para escolas públicas como em empresas privadas, com o objetivo de inspirar jovens a buscarem suas realizações.
A minha relação com o esporte é muito íntima. Desde a infância, lembro que eu amava praticar qualquer tipo de esporte ou atividade lúdica, até as ditas masculinizadas. Por exemplo, o meu esporte mais praticado na infância e adolescência foi o futebol e quando alguém dizia que aquele esporte não era para mim, os meus irmãos resolviam a questão e facilitavam a minha prática.
Eu conheci o montanhismo durante a faculdade de educação física, em uma palestra. E a forma que encontrei para praticar esse esporte foi trabalhando. Então, a prática de montanhismo passou a ser o meu estilo de vida e eu me desenvolvi muito no segmento.
A minha trajetória como atleta do montanhismo foi a partir do trabalho em uma empresa que realiza expedições em alta montanha. Eu iniciei nessa empresa como uma vendedora de roteiros e, aos poucos, fui podendo acompanhar guias e dando assistência. Hoje, sou guia de alta montanha.
Para mim, ser a primeira mulher negra latino-americana a chegar ao topo do Everest significa representatividade. A minha conquista, sem sombra de dúvidas, significou dar esperança a outras pessoas negras, demonstrar a elas que nós temos direito de sonhar e de realizar. Eu sei que se hoje há tanta dificuldade, especificamente por conta da cor da pele, há algum erro estrutural na nossa sociedade e a gente precisa tentar corrigir. E quando eu digo 'a gente' não estou falando das pessoas negras, estou falando da sociedade de modo geral, pessoas físicas, pessoas jurídicas, poder público e o poder privado. Todos devem garantir essa equidade de oportunidade.
Eu tenho certeza que a minha realização no Everest gerou mudança social, a começar pela minha família. A minha família se sente muito mais empoderada, em condição de sonhar grande, sem medo, sem limites. Em segundo plano, coloco o bairro Jardim Capivari que se sentiu representado quando foi mencionado em entrevistas em grandes canais de televisão, rádio e podcasts.
Então, quando o bairro Jardim Capivari foi mencionado por mim nas entrevistas é como se finalmente aparecesse no mapa do Brasil. O terceiro momento são dos depoimentos de crianças, jovens, mulheres negras e pessoas periféricas. Muita gente se sentiu representada e com força para poder viver o melhor que puderem, elas se sentiram inspiradas verdadeiramente a partir da minha realização.
O meu projeto "Da Sucata ao Everest" ajudou muita gente a entender e tomar consciência da sua responsabilidade enquanto gestão de resíduos. A minha realização gerou essa cultura da sustentabilidade também voltada à reciclagem".