Uma professora de Ibaté (SP) afirma que o aluno autista acusado de homofobia e suspenso da escola "é uma criança perigosa". A afirmação está em mensagem enviada pelo WhatsApp, obtida com exclusividade pelo blog Vencer Limites. O morador que recebeu a advertência pediu para não ser identificado e não revelou o nome da docente.
"Eu fui professora na escola, esse ano não sou mais, gostaria de falar sobre o -- para VC. é uma criança perigosa, eu mesmo já presenciei ele pegar 5 pedras e ameaçar jogar a psicóloga que fora chamada na época. Ele ameaça e agride todos a sua volta, as professoras que pegaram a sala dele deixam ele sair da sala para proteger os outros alunos. Não coloque tua mão no fogo pelo -- porque vc se queimará inteiro", adverte a docente. "Pergunte para a xxx que foi professora dele no pré 1. Desde de lá ele já apresentava um comportamento diferenciado", escreve a professora.
As acusações revoltaram a mãe do aluno. "Quem é essa professora? Quero saber onde meu filho é uma criança perigosa?".
A Prefeitura de Ibaté permanece em silêncio e, mais uma vez, questionada pelo blog Vencer Limites sobre a mensagem e as acusações, não respondeu
Após dez dias afastado, o aluno voltou a frequentar a escola na segunda-feira, 11, sem atendimento especializado. No começo do ano, a Justiça obrigou a Prefeitura de Ibaté a conceder ao menino um "professor auxiliar especializado e habilitado, que poderá ser compartilhado com outros infantes da mesma escola e que também necessitem de atendimento especializado", conforme estabelece a sentença publicada em 22 de janeiro pela Vara Única do Foro de Ibaté do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
"Além de não obedecer à decisão da Justiça, a Prefeitura ainda recorreu, e meu filho não tem nenhuma assistência especializada", afirma a mãe.
"Me acusam de querer dinheiro, mas estou defendendo meu filho. Quantas vezes vou aguentar calada esses ataques? Não é a primeira vez que fazem isso com meu filho. No ano passado foi a mesma coisa, na mesma escola. E o que fiz? Abafei o caso e deixei para lá. Agora de novo? A mesma coisa com meu filho? E toda vez vou deixar acontecer sem fazer nada?", diz.
Em documento enviado à OAB de São Carlos, após cobrança da advogada, integrante da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência, a Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Ibaté nega que o aluno autista tenha sido suspenso, mas em áudios também obtidos pelo blog Vencer Limites, a diretora da escola afirma que o menino não pode retornar à unidade de ensino até decisão do conselho escolar.
Entenda o caso - O menino autista, aluno da rede municipal de Ibaté, no interior de SP, foi suspenso da escola por mais de uma semana depois de ser acusado de homofobia por um professor. O docente registrou boletim de ocorrência pela internet e o caso foi encaminhado à única delegacia da cidade. A mãe do estudante não recebeu qualquer informação ou apoio da administração pública, da unidade de ensino ou das autoridades de segurança.
"É um claro constrangimento imposto a essa mãe", diz a advogada, integrante da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB de São Carlos, também professora e mãe de um aluno com deficiência que frequentou a mesma escola. Ela apoia a família no caso.
De acordo com a mãe, no dia 29 de fevereiro, uma quinta-feira, aproximadamente 20 minutos após deixar o filho na escola, ela recebeu uma ligação para que retornasse imediatamente à unidade de ensino.
"Quando cheguei na escola, a diretora disse que meu filho tinha xingado o professor de 'v**** que o dava o **', queria furar com lápis e bater com pedaço de madeira". "A diretora afirmou que havia acionado o conselho tutelar, a guarda municipal e o conselho escolar, que eu teria de esperar uma decisão sobre advertência ou expulsão", relata a mãe.
Somente nesta segunda-feira, 11, o menino retornou à escola, ainda sem atendimento especializado e sem qualquer explicação à mãe sobre os desdobramentos do caso. Ela ficou vários dias sem poder trabalhar.
"Suspenderam arbitrariamente, porque o regimento manda o conselho de escola decidir e isso não ocorreu, a mãe não participou de nada até agora, não houve nenhuma reunião do conselho. Nesse período em que o aluno ficou sem aulas, a escola teria de forner atividades, mas não foi passado nada", diz a advogada da família.
Laudo emitido em 2022 e assinado por médico neurologista infantil da Apae de São Carlos (SP) atesta que o menino é autista. "Apresenta caracteristicas que preenchem critérios diagnósticos para Transtornos do Espectro Autista (DSM 5) (CID 10: F 84.0) por apresentar déficits na sóciocomunicação, desordens sensoriais e comportamentos restritos e repetitivos. Sugere-se acompanhamento multidisciplinar (psicológico e fonoaudiológico) na abordagem da Análise do Comportamento Aplicada e intervenção psicopedagógica, e acompanhamento especializado conforme as necessidades no contexto escolar", destaca o documento.
Atraso e fome - Questionada sobre possíveis motivos que teriam desencadeado a reação da criança na escola, a mãe acredita em uma combinação de fatores.
"Naquele dia, saímos atrasados de casa, não deu para tomar café da manhã. Meu filho saiu em jejum, com fome. No caminho comprei uma bolacha e um refrigerante e mandei ele comer no intervalo, mas ele quis comer na sala de aula e o professor não deixou. Ele surtou, ficou desse jeito, querendo bater no professor, foi isso que aconteceu", relata a mãe.
Ela explica que o filho autista faz uso de dois medicamentos: Risperidona e Carbamazepina.
Segundo informações do Ministério da Saúde, a Risperidona ajuda no controle dos sintomas de pacientes que sofrem com esquizofrenia, além de outros transtornos, como alucinações, delírios, ansiedade, demência e até mesmo autismo. E a Carbamazepina pode ser utilizada isoladamente ou associada a outras medicações no tratamento de alguns tipos de convulsões em pessoas com epilepsia, dor no nervo da face (neuralgia do nervo trigêmeo), quadros psiquiátricos (episódios de mania no transtorno bipolar e certo tipo de depressão).