O aluno autista que foi acusado de homofobia por um professor e suspenso da escola por dez dias em Ibaté, no interior de São Paulo, retornou às aulas nesta segunda-feira, 11, ainda sem atendimento especializado, apesar da ordem judicial publicada em janeiro determinando a presença de docente específico a todos os alunos com deficiência na unidade de ensino.
A mãe do menino afirma não ter recebido documento sobre o caso ou boletim de ocorrência registrado pelo professor.
"Me acusam de querer dinheiro, mas estou defendendo meu filho. Quantas vezes vou aguentar calada esses ataques? Não é a primeira vez que fazem isso com meu filho. No ano passado foi a mesma coisa, na mesma escola. E o que fiz? Abafei o caso e deixei para lá. Agora de novo? A mesma coisa com meu filho? E toda vez vou deixar acontecer sem fazer nada?", questiona.
"Estou cansada de ver meu filho passar por tudo isso. Toda vez é meu filho, toda vez é meu filho", afirma a mãe.
Em conversa por WhatsApp obtidas pelo blog Vencer Limites, um morador é advertido por uma professora. Na conversa, a docente chama a criança de "perigosa" e diz que o menino "tem comportamento diferenciado desde muito pequeno".
Em documento enviado à OAB de São Carlos, após cobrança de advogada que apoia a família, a Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Ibaté nega que o aluno autista tenha sido suspenso, mas em áudios também obtidos pelo blog Vencer Limites, a diretora da escola afirma que o menino não pode retornar à unidade de ensino até decisão do conselho escolar.
Respostas - A Prefeitura de Ibaté, as autoridades de segurança pública da cidade, a Secretaria de Educação e o professor que acusou a criança autista de homofobia não responderam aos pedidos de posicionamento solicitados pelo blog Vencer Limites.
Entenda o caso - Um menino autista, aluno da rede municipal de Ibaté, no interior de SP, foi suspenso da escola por mais de uma semana depois de ser acusado de homofobia por um professor. O docente registrou boletim de ocorrência pela internet e o caso foi encaminhado à única delegacia da cidade. A mãe do estudante não recebeu qualquer informação ou apoio da administração pública, da unidade de ensino ou das autoridades de segurança.
"É um claro constrangimento imposto a essa mãe", diz a advogada da família, integrante da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB de São Carlos, também professora e mãe de um aluno com deficiência que frequentou a mesma escola.
No começo deste ano, a Justiça obrigou a Prefeitura de Ibaté a conceder ao menino um "professor auxiliar especializado e habilitado, que poderá ser compartilhado com outros infantes da mesma escola e que também necessitem de atendimento especializado", conforme estabelece a sentença publicada em 22 de janeiro pela Vara Única do Foro de Ibaté do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
"Além de não obedecer à decisão da Justiça, a Prefeitura ainda recorreu, e meu filho não tem nenhuma assistência especializada", diz a mãe.
De acordo com ela, no dia 29 de fevereiro, uma quinta-feira, aproximadamente 20 minutos após deixar o filho na escola, recebeu uma ligação para que retornasse imediatamente à unidade de ensino.
"Quando cheguei na escola, a diretora disse que meu filho tinha xingado o professor de 'v**** que o dava o **', queria furar com lápis e bater com pedaço de madeira", conta. "A diretora afirmou que havia acionado o conselho tutelar, a guarda municipal e o conselho escolar, que eu teria de esperar uma decisão sobre advertência ou expulsão", relata a mãe.
Somente nesta segunda-feira, 11, o menino retornou à escola, ainda sem atendimento especializado e sem qualquer explicação à mãe sobre os desdobramentos do caso. A ficou vários dias sem poder trabalhar.
"Suspenderam arbitrariamente, porque o regimento manda o conselho de escola decidir e isso não ocorreu, a mãe não participou de nada até agora, não houve nenhuma reunião do conselho. Nesse período em que o aluno ficou sem aulas, a escola teria de forner atividades, mas não foi passado nada", diz a advogada.
Laudo emitido em 2022 e assinado por médico neurologista infantil da Apae de São Carlos (SP) atesta que o menino é autista. "Apresenta caracteristicas que preenchem critérios diagnósticos para Transtornos do Espectro Autista (DSM 5) (CID 10: F 84.0) por apresentar déficits na sóciocomunicação, desordens sensoriais e comportamentos restritos e repetitivos. Sugere-se acompanhamento multidisciplinar (psicológico e fonoaudiológico) na abordagem da Análise do Comportamento Aplicada e intervenção psicopedagógica, e acompanhamento especializado conforme as necessidades no contexto escolar", destaca o documento.
Atraso e fome - Questionada sobre possíveis motivos que teriam desencadeado a reação da criança na escola, a mãe acredita em uma combinação de fatores.
"Naquele dia, saímos atrasados de casa, não deu para tomar café da manhã. Meu filho saiu em jejum, com fome. No caminho comprei uma bolacha e um refrigerante e mandei ele comer no intervalo, mas ele quis comer na sala de aula e o professor não deixou. Ele surtou, ficou desse jeito, querendo bater no professor, foi isso que aconteceu", relata.
Ela explica que o filho autista faz uso de dois medicamentos: Risperidona e Carbamazepina.
Segundo informações do Ministério da Saúde, a Risperidona ajuda no controle dos sintomas de pacientes que sofrem com esquizofrenia, além de outros transtornos, como alucinações, delírios, ansiedade, demência e até mesmo autismo. E a Carbamazepina pode ser utilizada isoladamente ou associada a outras medicações no tratamento de alguns tipos de convulsões em pessoas com epilepsia, dor no nervo da face (neuralgia do nervo trigêmeo), quadros psiquiátricos (episódios de mania no transtorno bipolar e certo tipo de depressão).
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