O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a suspender nesta quarta-feira (07/06) o julgamento do processo que trata da legalidade do marco temporal para a demarcação de terras indígenas.
Pela tese do marco, defendida por proprietários de terras, poderiam ser demarcadas apenas terras indígenas que estivessem tradicionalmente ocupadas por esses povos até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
A suspensão do julgamento foi provocada por um pedido de vista do ministro André Mendonça. Pelas regras internas do STF, o caso deverá ser devolvido para julgamento em até 90 dias.
Antes do pedido de vista, o ministro Alexandre de Moraes votou contra a tese do marco temporal.
O placar do julgamento está em 2 a 1 contra o marco - em 2021, antes da interrupção anterior do julgamento, o ministro Edson Fachin havia votado contra a tese, e Nunes Marques, a favor.
O processo em discussão trata da disputa pela posse da Terra Indígena (TI) Ibirama, em Santa Catarina. A área é habitada pelos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e a posse de parte da TI é questionada pelo governo catarinense, que pede a aplicação do marco temporal.
O processo tem repercussão geral, o que significa que a decisão servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 82 casos semelhantes, segundo o STF.
Voto de Moraes
Em seu voto, Moraes argumentou que o reconhecimento da posse de terras indígenas independe da existência de um marco temporal baseado na promulgação da Constituição de 1988.
Ele citou o caso específico julgado pelo STF para justificar a ilegalidade do marco, lembrando que os indígenas Xokleng abandonaram suas terras em Santa Catarina devido a conflitos que ocasionaram o assassinato de 244 deles, em 1930.
"Óbvio que, em 5 de outubro de 1988, eles não estavam lá, porque se estivessem, de 1930 a 1988, não teria sobrado nenhum. Será que é possível não reconhecer essa comunidade? Será que é possível ignorar totalmente essa comunidade indígena por não existir temporalidade entre o marco temporal e o esbulho [saída das terras]?", questionou.
Contudo, ele votou para garantir aos proprietários que possuem títulos de propriedades localizadas em terras indígenas o direito de indenização integral para desapropriação em casos que não forem alvo de controvérsias nem envolverem a usurpação ilegal de áreas. Para o ministro, existem casos de pessoas que agiram de boa-fé ao comprar suas terras.
"Quando reconhecido efetivamente que a terra tradicional é indígena, a indenização deve ser completa. A terra nua e todas benfeitorias. A culpa, omissão, o lapso foi do poder público", completou.
Congresso também debate o tema
A análise do marco temporal das terras indígenas pelo STF ocorre paralelamente ao debate no Congresso sobre o tema. Em 30 de maio, o plenário da Câmara aprovou um projeto de lei que modifica as regras para demarcação de terras e adota o marco temporal para esses processos.
A matéria estava em tramitação na Câmara desde 2007, mas teve sua análise acelerada após aprovação de um requerimento de urgência em 24 de maio. Segundo críticos da proposta, o objetivo teria sido tentar pressionar o STF.
Os ruralistas, favoráveis à aprovação do texto, argumentam que o marco temporal daria maior segurança jurídica contra desapropriações de suas propriedades e para o agronegócio.
Já os críticos do marco temporal afirmam que ele limitaria o acesso dos indígenas ao direito originário sobre suas terras, e que há casos de povos que foram expulsos delas algumas décadas antes da entrada em vigor da Constituição.
O projeto de lei agora está sob análise do Senado.
bl (Agência Brasil, ots)