Procurado pelo blog Vencer Limites para comentar a decisão, o humorista não respondeu. Ele pode recorrer da sentença.
O caso - A ação foi aberta em 2020 por Adriana Cristina da Costa Gonzaga, depois da publicação de um vídeo no Instagram, no perfil da modelo Aline Mineiro, namorada de Léo Lins na época. "Como em todas as festas, ele não fala nada, é um pouco autista", disse Aline no stories, que não está mais disponível, mas foi replicado em várias páginas da comunidade autista.
Adriana Gonzaga trocou mensagens com Leo Lins, pedindo uma retratação, e recebeu a seguinte resposta do comediante: "Juro que falei pra ela responder todas as pessoas que estão indignadas como você. Aconselhei ela a mandar vcs enfiarem uma Rola gigantesca no cu. Um pau bem veiúdo, mais vascularizado que seu cérebro (se bem que pra isso não precisa muito). A ideia era socar essa rola até a cabeça sair na boca, empalando o corpo. Depois remover a piroca, (que aliás, estaria de máscara, pois não quero que pegue covid), remover cuidadosamente, o que deixaria um buraco cilíndrico, ai jogaria milho para o corpo se tornar um abrigo de pombas brancas da paz. Essa foi minha sugestão, mas ela achou absurdo. Prometo que vou seguir tentando".
A mãe da criança autista registrou boletim de ocorrência na 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência de São Paulo. Segundo a delegada titular, Maria Valéria Pereira Novaes de Paula Santos, prints das mensagens foram incluídos no boletim.
Depois da repercussão, Leo Lins e Aline Mineiro gravaram um vídeo no qual tentam justificar suas reações. E um comunicado divulgado pelo SBT afirmava que o comediante iria pedir desculpas à comunidade autista durante o programa 'The Noite, com Danilo Gentili', no qual ele trabalhava, mas isso não foi ao ar.
Adriana Gonzaga celebrou a decisão do TJSP. "Me fez acreditar na justiça. Em alguns momentos. achei que não haveria essa justiça. Essa vitória não é só minha e nem somente dos autistas. É positivo para todas as pessoas com deficiência. É a nossa luta contra o preconceito e o capacitismo ganhando força e visibilidade", disse.
Ela diz que, na audiência de conciliação, Leo Lins debochou da ação. "Ele estava provocativo, sem nenhuma intenção de diálogo, então me calei. Ele chegou no Fórum rindo, fazendo vídeo para os seguidores e dizendo que 'estava novamente no fórum', como se isso fosse bacana. Ele não acredita que errou. Fui atacada por ele, muitas vezes. Ele me ridicularizou, me fez parecer criminosa e ele a vítima. Recebi ofensas e xingamentos no meu Instagram", relata Adriana.
Em julho deste ano, Leo Lins foi demitido pelo SBT após a repercussão de uma piada, durante apresentação ao vivo, sobre uma criança com hidrocefalia do Ceará. "Eu acho muito legal o Teleton, porque eles ajudam crianças com vários tipos de problema. Eu vi um vídeo de um garoto do interior do Ceará com hidrocefalia. O lado bom é que o único lugar na cidade onde tem água é a cabeça dele. A família nem mandou tirar, instalou um poço. Agora o pai puxa a água do filho e todos estão felizes e tomam banho", disse o humorista (ouça abaixo).
https://brasil.estadao.com.br/blogs/vencer-limites/wp-content/uploads/sites/189/2022/07/leolins-teleton-hidrocefalia_040720220422.mp3
A AACD publicou nas redes sociais uma nota de repúdio veemente à fala de Leo Lins, destacou que o artigo 88 da Lei Brasileira de Inclusão prevê multa e prisão para quem "praticar, induzir ou incitar discriminação da pessoa por sua deficiência" e afirma aguardar um pedido de desculpas.
Após o anúncio da demissão, Leo Lins publicou um post no Instagram, no qual não comenta o caso, mas faz uma ironia sobre "bolhas" e o "mundo cor de rosa".
"A ACP visa coibir que o humorista continue fazendo piadas de cunho preconceituoso contra pessoas com deficiência, idosos e outras minorias. Lins tem show agendado em Fortaleza no próximo dia 30 de julho. Instaurada após representação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) secção Ceará, a ação do MPCE também pede que a Justiça determine a aplicação de multa no valor de R$ 20 mil por cada menção desrespeitosa a quaisquer minorias que eventualmente seja feita durante o show", disse o comunicado oficial do MPCE.
O órgão considerou preconceitusos os vídeos divulgados por Leo Lins com piadas sobre nordestinos, crianças com hidrocefalia, surdos e pessoas acometidas pela doença de Parkinson e por gagueira, e reforçou que o Brasil é signatário da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
"O artigo 4º da Convenção estabelece que os estados partes - o que inclui o Brasil - comprometeram-se a assegurar e promover o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais de todas as pessoas com deficiência, sem qualquer tipo de discriminação por causa de sua deficiência. Diante disso, as nações que incorporaram a convenção com status constitucional devem se comprometer a tomar todas as medidas para eliminar a discriminação baseada em deficiência, por parte de qualquer pessoa, organização ou empresa privada", ressaltou o MPCE.
A Ordem dos Advogados do Brasil Secção do Ceará enviou ao Ministério Público do Ceará uma representação na qual pediu "as providências que julgar cabíveis" no que diz respeito à fala de Leo Lins sobre o Teleton e uma criança com hidrocefalia.
"É necessário afirmar que "piadas" dessa natureza são indignas de serem veiculadas. A reiterada falta de sensibilidade e falta de respeito demonstrado pelo artista reafirma que, na busca por momentos de destaque e aplausos, o ser humano pode ser frio e maldoso. Ressaltamos que apoiamos a liberdade de expressão, mas que fatos dessa natureza não podem ficar imune à lei. A inércia das instituições ante algo tão reprovável não é o que se espera em um estado democrático de direito. Salientando, final e novamente, que inúmeras notas de repúdio já foram emitidas por diversos órgãos e entidade no Brasil e, percebemos que elas não são muito efetivas. Mesmo tendo uma repercussão negativa com o "capacitismo recreativo", quanto mais ele é citado, mais ele encontra alcance nas redes sociais ou na mídia", destacou o documento assinado pelo presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB Ceará, Emerson Maia Damasceno, além do presidente e da vice-presidente da secção, José Erinaldo Dantas Filho e Christiane do Vale Leitão.
A representação também reforçou a determinação do artigo 88 da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (nº 13.146/2015). "Praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência: Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Aumenta-se a pena em 1/3 (um terço) se a vítima encontrar-se sob cuidado e responsabilidade do agente. Se qualquer dos crimes previstos no caput deste artigo é cometido por intermédio de meios de comunicação social ou de publicação de qualquer natureza: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa".