"Votamos pela diminuição das desigualdades", diz antropóloga sobre voto de mulheres negras

Escolha deve ser motivada pela diminuição da desigualdade social, o combate à fome e a ampliação dos serviços públicos

28 out 2022 - 17h31
(atualizado às 18h27)
Imagem mostra mãos negras fazendo identificação biométrica para votar.
Imagem mostra mãos negras fazendo identificação biométrica para votar.
Foto: Imagem: Dado Galdieri/Bloomberg / Alma Preta

"Meu voto é totalmente influenciado pela minha condição de mãe negra e chefe de família. A chave para retroceder as mazelas que enfrentamos cotidianamente é eleger parlamentares preocupados e comprometidos com essa transformação", defende a jornalista alagoana Brunna Moraes, 25, mãe da pequena Naila, de 2 anos.

Ela conta que, antes da escolha do candidato, tem como prioridade avaliar o programa político, além de priorizar aqueles que defendem os direitos humanos, a democracia e as políticas de inclusão e de combate às desigualdades sociais. A jornalista também ressalta a importância de conhecer os aliados, grupos políticos e movimentos sociais ligados à candidatura. 

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Há 90 anos, em 24 de fevereiro de 1932, o Decreto 21.076, do presidente à época Getúlio Vargas, instituiu o Código Eleitoral. Com ele, as mulheres passaram a ter direito a votar no Brasil, mas as mulheres negras que antecederam Brunna tiveram dificuldades para ter esse direito garantido. Mesmo sem ser explicitado, as exigências para o acesso podem servir como exemplo do racismo institucional. Já que era exigido ter idade superior a 21 anos e ser alfabetizada. 

Hoje elas vão às urnas como maneira de honrar todas as que vieram antes e não puderam votar, por conta do período escravocrata e da demora para a conquista do voto. A doutoranda em Antropologia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Letícia Souza, 30, explica que a luta para garantir esse direito foi imensa. "Na verdade, a gente ainda está nesse processo de luta porque o racismo, o sexismo, o machismo não acabaram". 

Brunna Moraes afirma que essas mulheres reconhecem no discurso político os projetos que priorizam mudanças que possam interferir em sua realidade e na de seus filhos.

"Ser mãe é o que me coloca na responsabilidade de votar em candidatos que possam oferecer uma sociedade de mais oportunidades e perspectivas para minha filha. Somos maioria e, conscientes, podemos transformar o país que vivemos também por meio do nosso voto", diz a jornalista.

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Pouca representatividade no parlamento 

Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as mulheres negras eleitas para deputada federal passaram de 17% em 2018 para 32% em 2022, houve um aumento, mas esse número segue abaixo — Brasil continua ocupando índices menores em relação aos países da América Latina. 

Em relação ao número de deputadas estaduais eleitas nas Eleições 2022, cresceu de 51 para 74 as cadeiras que serão ocupadas em 2023 por mulheres não brancas, o que representa ainda a minoria no legislativo dos Estados. Elas representam 18% do total de deputados estaduais e distritais e um pouco mais da metade do mínimo de 30%, que foi estipulado pela lei de cotas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020. 

A norma da Corte obriga partidos a distribuir de maneira proporcional o montante do fundo eleitoral entre os candidatos brancos e negros, além da divisão do tempo destinado à propaganda de televisão e rádio. 

De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua  (PNAD Contínua) de 2019, as mulheres negras são o maior grupo demográfico do país, representando 28% dos habitantes, mas ocupam apenas 2% das cadeiras do congresso nacional. 

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O balanço dos mandatos das parlamentares negras (2019- 2023), produzido pelo movimento Mulheres Negras Decidem, aponta que existem apenas 58 parlamentares autodeclaradas pretas ou pardas em todo o país. Desse grupo, 43 são deputadas estaduais, 13 deputadas federais, 1 deputada distrital e 1 senadora. Com isso, o percentual de mulheres negras na Câmara dos Deputados é de pouco mais de 2% entre 513 parlamentares. Já em relação ao Senado Federal, esse percentual é de apenas 1%, de 81 senadores. 

Escolha passa pela luta contra a desigualdade 

A doutoranda em Antropologia Letícia Souza defende que o voto desse grupo reflete na luta contra a desigualdade porque é uma escolha alinhada com a história e vivência delas.

"A gente vota em alguém que seja minimamente disposto a lutar pela diminuição das mais variadas desigualdades. Garantindo uma melhor qualidade de vida para os nossos", salienta.

Ela ressalta que, no segundo turno das eleições de 2022 para a presidência da República, o que está em jogo é a democracia, já que estamos vivenciando um aumento significativo do conservadorismo e da extrema-direita, que não tem nenhum constrangimento em se assumir racista, misógina, homofóbica e machista. 

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"Se essas pessoas continuarem governando o Brasil, a gente vai ter um retrocesso inimaginável porque os direitos já conquistados a duras penas estão constantemente ameaçados. A democracia precisa ser defendida e nessa eleição a nossa escolha é pautada nessa defesa pela democracia", acrescenta a especialista.

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