Autoridades alemãs cogitam abandonar o X após apoio de Musk à AfD

12 jan 2025 - 15h11

Enquanto o bilionário usa sua rede social para atacar autoridades e promover teorias da conspiração, governo alemão recebe apelos para se desvencilhar da plataforma. Vários políticos e organizações já o fizeram.O que a estrela da NBA LeBron James, o icônico escritor de terror Stephen King e o jornal britânico The Guardian têm em comum? Todos eles abandonaram o X, a rede social anteriormente conhecida como Twitter, desde a vitória eleitoral de Donald Trump em novembro de 2024. Eles, no entanto, estão longe de serem os únicos. Na semana passada, mais de 60 universidades de língua alemã anunciaram que não usariam mais o X.

Muitos acreditam que Musk trabalha ativamente para transformar o X em um megafone extremista
Muitos acreditam que Musk trabalha ativamente para transformar o X em um megafone extremista
Foto: DW / Deutsche Welle

Comandada pelo cabo eleitoral de Trump mais rico do mundo, Elon Musk, a rede parece estar perdendo a preferência dos usuários fora do campo político conservador e - apesar da promessa do bilionário em 2022 de manter a plataforma "politicamente neutra" - muitos observadores acreditam que ele está trabalhando ativamente para transformar o X em um megafone extremista.

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Especialistas ouvidos pela DW disseram que não há como dizer com segurança se o sistema foi ou não atualizado para impulsionar postagens de direita desde o início da era Musk, já que seus algoritmos estão constantemente sendo ajustados e reagindo a uma base de usuários em mutação.

Está claro, porém, que muitos perfis banidos foram restaurados sob Musk, apesar de violações como discurso de ódio, desinformação e antissemitismo. Especialistas também apontam que o discurso geral continuará mudando para a direita, à medida que usuários mais liberais e de esquerda deixem a plataforma.

"O resultado para os usuários é o mesmo, independentemente da causa: significativamente mais conteúdo de extrema direita na plataforma e nos feeds recomendados pelas pessoas", disse o cientista social e pesquisador de mídia digital Colin Henry à DW.

Musk também alavancou seu status como o perfil mais seguido no X para amplificar vozes e narrativas pró-Trump na preparação para a eleição dos EUA, até mesmo se referindo a si mesmo como o "primeiro-amigo" de Trump, parodiando o termo "primeira-dama".

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"Não alimente o troll"

Atualmente com os olhos voltados para a política da União Europeia (UE), Musk disse a seus mais de 211 milhões de seguidores que o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, é um "tolo" e o presidente Frank-Walter Steinmeier - cujo cargo é essencialmente cerimonial - é um "tirano".

Musk também endossou publicamente a legenda de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD), dizendo que era o único partido que poderia "salvar a Alemanha". Na última quinta-feira, Musk realizou uma live no X com a colíder da AfD e candidata a chanceler nas próximas eleições alemãs, Alice Weidel.

O apoio de Musk a Trump e a intromissão contínua na política da UE geraram indignação na Alemanha. No entanto, as postagens de Musk provocaram pouco mais do que um dedo em riste de Scholz, que disse que sua abordagem era simples: "Não alimente o troll".

"O que conta na Alemanha é a vontade dos cidadãos, não as declarações erráticas de um bilionário nos EUA", disse Scholz à revista alemã Stern.

Vale a pena o esforço?

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O autor de ficção científica e ativista da internet Cory Doctorow disse à DW que Musk já exerce poder suficiente para influenciar o voto em disputas eleitorais acirradas. Para ele, essa influência se deve em parte ao fato de a mídia tê-lo idolatrado por muitos anos como "uma espécie de herói".

Para ele, Musk seria capaz de usar X para convencer para seus mais de 211 milhões de seguidores de que "a AfD é formada por sujeitos bacanas e sua associação com o fascismo e a limpeza étnica é exagerada".

"É necessário apenas que um número muito pequeno de pessoas apareça para que esses equilíbrios delicados que foram calculados pelos consultores do partido sejam interrompidos", disse Doctorow.

Ele avalia que a ascensão de Musk foi um resultado previsível de um esforço de décadas para desmantelar as leis de monopólio na América do Norte e na Europa, o que o tornou "tão rico que é grande demais para ser preso, grande demais para falir e grande demais para se importar com o que alguém pensa dele".

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Embora Scholz tenha tentado evitar se envolver com Musk, Doctorow disse que lutar publicamente contra alguém "que tem uma audiência gigante" pode, de fato, ser uma ótima estratégia política para o chanceler alemão.

"Musk não é muito inteligente", disse Doctorow. "Ele tem muitos seguidores. Muitos deles não sabem muito sobre ele; apenas absorveram a lenda - e você pode desmascarar a lenda em tempo real se for bom nisso."

Mas, "se você for ruim nisso, a última coisa que você quer é ser humilhado na frente de 200 milhões de pessoas... então eu acho que realmente depende do político."

"Ê(X)odo" alemão?

Na quarta-feira, a comissária alemã antidiscriminação Ferda Ataman pediu que o governo deixasse o X, ao chamar a rede de "um instrumento de influência política do homem mais rico do mundo." "O X não é uma plataforma séria", alertou.

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Várias organizações e usuários de perfil destacado na Alemanha já deixaram o X, incluindo o mais alto Tribunal criminal do país, na quinta-feira. Fabian Mehring, secretário da Digitalização do estado mais rico da Alemanha, a Baviera, deixou o X em razão do apoio de Musk a AfD.

A ex-secretária de Estado de Berlim, Sawsan Chebli, saiu da rede junto com os deputados federais Jamila Schäfer e Misbah Khan e dezenas de outras vozes proeminentes no início de dezembro, com o grupo dizendo que o X se tornou um "lugar de censura, racismo, antissemitismo e definição de agenda de direita".

Um centro de documentação de crimes nazistas em Munique e o Museu Judaico da cidade também decidiram parar de usar a plataforma, junto com dezenas de outros órgãos semioficiais e não governamentais, incluindo três times de futebol da Bundesliga.

Governo alemão ainda resiste

Em resposta aos apelos desta semana para abandonar o X, as autoridades alemãs disseram que o governo decidiu não fazê-lo, por enquanto.

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"Temos que estar lá, onde as pessoas vão para obter informações", disse o porta-voz do governo Steffen Hebestreit aos repórteres. "Mas, é claro, você sempre tem que se perguntar se o ambiente para isso ainda é sustentável, e estamos nos perguntando isso. Até agora, pensamos que o dano de nos retirarmos dessa plataforma seriam maiores do que os benefícios."

Henry, o cientista social americano, disse que os políticos que não estavam alinhados com a extrema direita já estavam, de qualquer maneira, desaparecendo rapidamente dentro do X.

"O público ou saiu ou, quando as autoridades precisam comunicar informações em tempo real durante, digamos, um desastre natural, elas são abafadas por teorias da conspiração ou discurso de ódio", disse Steffen.

Confrontado com relatos de que Musk estaria tentando interferir nas eleições alemãs, Hebestreit disse que o fato é que até multimilionários têm o direito de se expressar.

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"Ao mesmo tempo, também é verdade que os multimilionários não são mais inteligentes e mais bem informados do que os outros. Eles também podem falar bobagens", disse o porta-voz. "Se você der uma olhada na plataforma X nos últimos dias, encontrará muitas indicações disso."

A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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